segunda-feira, 24 de março de 2014

Convivência das gerações (II)


* Por Roberto Corrêa


A vida pode se assemelhar a um torvelinho. E à medida que o tempo passa e o progresso avança, a velocidade dos meios de comunicação se acelera de maneira que, na atualidade, tudo é ainda muito mais rápido, fugazes os momentos para a paz e reflexão.

Noto que, sem perceber, tornei-me pessoa formal ou estatisticamente da geração antiga e que, como tudo respira novidade, o culto do momento é predominante, ou seja, o presente constitui a adorável vida. Tudo que é novo, jovem tem valor; coisas conhecidas, antigas, já sabidas, tornam-se desinteressantes, e podem ser trancafiadas.
                       
Da geração antiga procuro companheiros, talvez – quem sabe? – encontrá-los, revê-los para simples conversação, até telefônica, mas observo ausência quase total: boa parte já falecidos, outros distantes, enfermos do corpo ou da mente (não dispostos ao diálogo) e assim a única solução é mesmo entrar na dança, como os mais novos.

O primeiro passo é tratar de rejuvenescer: tentar participar de academias de ginásticas, cuidar das rugas, cabelos brancos e calvície. Ir ao menos a alguns shows, competições esportivas (mas assistir jogos da Copa não dá mesmo), bailes (ao menos comemorativos) e não se esquecer das viagens turísticas (inclusive internacionais), os badalados “cruzeiros transatlânticos” etc.etc.

A esta altura é que mais aparecem as dificuldades para a convivência das gerações. Enquanto a mais nova se encontra exuberante, a todo vapor, a mais antiga prefere se acomodar. Com isso, vão surgindo as discriminações pela idade (os mais jovens evitam os mais velhos e estes também não se sentem bem com a presença daqueles que dominam pela natural potencialidade física).

A convivência dessas duas gerações, a mais nova e a mais antiga, assim, vai se tornando fastidiosa, sobretudo pela ausência de diálogos mais profundos, como educação espiritual, religiosa, indispensáveis, para aperfeiçoamento do homem e da mulher. Se tal acontecesse, disso decorreria melhora de toda a vida social em seus fundamentais aspectos, o que evidentemente seria ótimo.

As religiões cristãs, ao que parece, têm conseguido ao máximo cristalizar o respeito pelos mais velhos, dado o quarto mandamento do Decálogo, mas a idiossincrasia quanto à idade ainda deve perdurar por muitos anos e talvez nem chegue a
desaparecer.

Na constatação que a geração mais nova não se sujeita a ser interagida pela mais antiga, poder-se-ia até se declarar a inutilidade da história e das ciências correlatas embasadas no testemunho humano. Então, compreender porque a civilização moderna está eivada de tantos erros, calamidades e sofrimentos desnecessários ou insuportáveis fica bem mais fácil.


Roberto Corrêa é sócio do Instituto dos Advogados de São Paulo, da Academia Campineira de Letras e Artes, do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico, de Campinas, e de clubes cívicos e culturais, também de Campinas. Formou-se pela Faculdade Paulista de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Fez pós-graduação em Direito Civil pela USP e se aposentou como Procurador do Estado. É autor de alguns livros, entre eles "Caminhos da Paz", "Direito Poético", "Vencendo Obstáculos", "Subjugar a Violência”, Breve Catálogo de Cultura e Curiosidades, O Homem Só.

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