Que vexame!
* Por Lêda Selma
A tarde, mais raquítica que formosa, desbotava-se nas encostas de pra lá de bem depois, no ritual diário de anfitriar a noite, quando o grupo de amigos chegou ao barzinho para o tradicional encontro de fim de tarde. Cada um solicitou logo a companheira preferida: para uns, a cerveja; para outros, o uísque. O bate-papo? Sempre animado; debochado, às vezes; polêmico, não raro. Ah! Se o assunto for política ou futebol, aí, sim, o porco desenrola o rabo, num átimo, enquanto o azucrim coça o olho!
Apesar disso, censura não se senta à mesa. Os assuntos fluem com naturalidade, a despeito de opiniões adversárias. Porém, se o assunto for o Lula, então, só mesmo o santo protetor dos barbudos sibilantes para socorrer o presidente.
– O Lula decretou a oficialização da ociosidade ao proibir que menores de 18 anos desempenhem serviços domésticos.
– Que despautério! Implicância pouca é luxo! O presidente quer proteger os menores dos riscos a que ficam expostos: abuso psicológico, sexual, isolamento, esforço físico, exploração... Ele quer os menores na escola e não no batente, ora essa! Já se esqueceram da torturadora-empresária?
– Já vem você defender esse barbudo, pai dos necessitados e inimigo dos abastados. Agora, quase 250 mil adolescentes (entre 16 e 17 anos) estarão desempregados e à disposição da vadiagem. Isso é proteção?
– Que os adultos das famílias trabalhem no lugar dos adolescentes. Quantos pais jogam seus filhos nesses empregos e ficam de papo, isto é, de vagabundagem pro ar, só à espera do dinheirinho deles? O presidente fez bem.
– E quantos pais não lançam os filhos à mendicância?
– Não entendo: com 16 anos, o menor pode escolher o presidente da República, mas não pode trabalhar. Para dar rumos ao Brasil ele é maduro, está apto. Para trabalhar não.
– Nem para responder por seus crimes. Não pode ser preso. Só internado, após apreendido. Criminoso? Não! Menor infrator! Por isso, esbalda-se no ofício dos delitos ou dos crimes bárbaros.
– Baita incoerência! Aliás, o Brasil é o país das incoerências. A começar pela língua do presidente: embora presa, é solta até demais.
– Deixe-me entender isso: quer dizer que, antes de mais nada, os patrões do lar são tidos como degenerados! É, se nos empregos domésticos os menores correm riscos, e nas ruas?!
– Pois então. Lá, sim, ficam à mercê de potenciais perigos. Por certo, correm mais riscos, pois tornam-se vulneráveis às drogas, à prostituição, a degradantes explorações e perdem certas referências e o senso de cidadania.
– É, o Lula, pelo visto, desconhece que o ócio é cúmplice das malfeitanças e parceiro do diabo. Na adolescência, então...
– Também não entendi o trabalho doméstico ser equiparado, em riscos, à extração da madeira, à produção do carvão, à fabricação de fogos de artifícios, à construção civil... Tremendo exagero!
– Gente, trabalho digno não faz mal, ao contrário, ajuda a moldar a formação do adolescente e a despertar-lhe a consciência social. Indigno é traficar, piratear, prostituir-se, roubar, matar...
Alguém achou a conversa já repetitiva, apesar de sua relevância. Também, pudera: duas loiraças pirateadas, de abundâncias espevitadas e atiçadoras, toparam com seus olhos cobiçosos. E ele, sem piscanejar:
–Vejam: aquelas duas vadias apetitosas, ali, conheci semana passada num putei..., ou melhor, numa casa de viração sofisticada que só. Vou apresentá-las a voc...
Não houve tempo. As duas, dirigindo-se a um dos homens do grupo, tascaram-lhe um beijo. Constrangimento geral e irrestrito. Mas o pior ainda viria...
– Oi, pai! O senhor por aqui?
• Poetisa e cronista, licenciada em Letras Vernáculas, imortal da Academia Goiana de Letras, baiana de Urandi, autora de “Das sendas travessia”, “Erro Médico”, “A dor da gente”, “Pois é filho”, “Fuligens do sonho”, “Migrações das Horas”, “Nem te conto”, “À deriva” e “Hum sei não!”, entre outros.
* Por Lêda Selma
A tarde, mais raquítica que formosa, desbotava-se nas encostas de pra lá de bem depois, no ritual diário de anfitriar a noite, quando o grupo de amigos chegou ao barzinho para o tradicional encontro de fim de tarde. Cada um solicitou logo a companheira preferida: para uns, a cerveja; para outros, o uísque. O bate-papo? Sempre animado; debochado, às vezes; polêmico, não raro. Ah! Se o assunto for política ou futebol, aí, sim, o porco desenrola o rabo, num átimo, enquanto o azucrim coça o olho!
Apesar disso, censura não se senta à mesa. Os assuntos fluem com naturalidade, a despeito de opiniões adversárias. Porém, se o assunto for o Lula, então, só mesmo o santo protetor dos barbudos sibilantes para socorrer o presidente.
– O Lula decretou a oficialização da ociosidade ao proibir que menores de 18 anos desempenhem serviços domésticos.
– Que despautério! Implicância pouca é luxo! O presidente quer proteger os menores dos riscos a que ficam expostos: abuso psicológico, sexual, isolamento, esforço físico, exploração... Ele quer os menores na escola e não no batente, ora essa! Já se esqueceram da torturadora-empresária?
– Já vem você defender esse barbudo, pai dos necessitados e inimigo dos abastados. Agora, quase 250 mil adolescentes (entre 16 e 17 anos) estarão desempregados e à disposição da vadiagem. Isso é proteção?
– Que os adultos das famílias trabalhem no lugar dos adolescentes. Quantos pais jogam seus filhos nesses empregos e ficam de papo, isto é, de vagabundagem pro ar, só à espera do dinheirinho deles? O presidente fez bem.
– E quantos pais não lançam os filhos à mendicância?
– Não entendo: com 16 anos, o menor pode escolher o presidente da República, mas não pode trabalhar. Para dar rumos ao Brasil ele é maduro, está apto. Para trabalhar não.
– Nem para responder por seus crimes. Não pode ser preso. Só internado, após apreendido. Criminoso? Não! Menor infrator! Por isso, esbalda-se no ofício dos delitos ou dos crimes bárbaros.
– Baita incoerência! Aliás, o Brasil é o país das incoerências. A começar pela língua do presidente: embora presa, é solta até demais.
– Deixe-me entender isso: quer dizer que, antes de mais nada, os patrões do lar são tidos como degenerados! É, se nos empregos domésticos os menores correm riscos, e nas ruas?!
– Pois então. Lá, sim, ficam à mercê de potenciais perigos. Por certo, correm mais riscos, pois tornam-se vulneráveis às drogas, à prostituição, a degradantes explorações e perdem certas referências e o senso de cidadania.
– É, o Lula, pelo visto, desconhece que o ócio é cúmplice das malfeitanças e parceiro do diabo. Na adolescência, então...
– Também não entendi o trabalho doméstico ser equiparado, em riscos, à extração da madeira, à produção do carvão, à fabricação de fogos de artifícios, à construção civil... Tremendo exagero!
– Gente, trabalho digno não faz mal, ao contrário, ajuda a moldar a formação do adolescente e a despertar-lhe a consciência social. Indigno é traficar, piratear, prostituir-se, roubar, matar...
Alguém achou a conversa já repetitiva, apesar de sua relevância. Também, pudera: duas loiraças pirateadas, de abundâncias espevitadas e atiçadoras, toparam com seus olhos cobiçosos. E ele, sem piscanejar:
–Vejam: aquelas duas vadias apetitosas, ali, conheci semana passada num putei..., ou melhor, numa casa de viração sofisticada que só. Vou apresentá-las a voc...
Não houve tempo. As duas, dirigindo-se a um dos homens do grupo, tascaram-lhe um beijo. Constrangimento geral e irrestrito. Mas o pior ainda viria...
– Oi, pai! O senhor por aqui?
• Poetisa e cronista, licenciada em Letras Vernáculas, imortal da Academia Goiana de Letras, baiana de Urandi, autora de “Das sendas travessia”, “Erro Médico”, “A dor da gente”, “Pois é filho”, “Fuligens do sonho”, “Migrações das Horas”, “Nem te conto”, “À deriva” e “Hum sei não!”, entre outros.
Falou demais sem saber quem era quem. Agora é tarde.
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