Praia do Campeche – Anoitecer
* Por Urda Alice Klueger
* Por Urda Alice Klueger
(Para Ilze Zirbel – se não fosse por ela, não teria ido àquela praia naquela noite)
Água daquela consistência e daquela cor eu nunca vira sequer no Caribe, e eu sempre digo que o Caribe é o lugar mais bonito do mundo no seu mar! Não sei se ali é sempre assim, ou se eu dera sorte de pegar um momento mágico em pleno andamento, ou se coisas acontecidas há mais de meio século ainda andam pairando por ali e criando aquele encantamento ... O que sei é que água daquela consistência e cor eu jamais vira, nem mesmo no Caribe, pois nem água era, mas um mar de líquido cristal de cor verde-azulada, manso, molengo e cintilante, a se desdobrar em mansas e pequenas ondas que viravam espuma branca com lentidão, e aquele verde-azulado do mar que era cristal contrastava com a luminescência do sol que já mergulhara por detrás da terra, mas deixara no céu aquela luminosidade de ouro que mais parecia coisa descrita em romance medieval – como, nos dias considerados de progresso, que são os dias de hoje, alguém pode se dar ‘a liberdade de dizer que o céu estava cor de ouro? O fato é que estava, assim naquela região por detrás das dunas, e era difícil decidir para onde olhar mais: para o cristal das ondas que se espraiavam em espuma ou para o dourado do céu do outro lado – e havia mais alternativas: lá adiante do meu caminhar o morro mais alto da Armação do Sul, numa cor também entre o verde e o azul, portava saborosa e fofa nuvem de glacê branco à guisa de chapéu – e havia a areia branca da praia, e os muitos surfistas parados, sem coragem de largar aquela beleza toda, pois onda mesmo não viria naquele dia, de jeito nenhum – e os cachorros enormes, mansos e como que cheios de ternura pelo mundo – e quase que ao alcance da mão, do lado do mar, como se fosse só um morro cheio de árvores, a Ilha que decerto fora muito sagrada para muita gente do passado – era o anoitecer de 29 de março na Praia do Campeche, Brasil, e a beleza era tamanha que a própria atmosfera era puro encanto, e eu própria virara um ser encantado que seguia pela praia com o dourado do céu à minha direita e os olhos pregados de fascínio naquela cor verde-azulada do mar de cristal líquido!
Lentamente, aquela cor da água foi-se transformando de verde-azulada em azul-azulada, e como que o céu, e o morro da Armação, lá adiante, e a atmosfera, tudo foi ficando da mesma cor – e por detrás das dunas a cor de ouro diminuía, ficava apenas sugerida, pois já fazia muito que o sol estava a se afastar do dia, e o andar descalça dentro da água de cristal líquido que molhava a barra do meu vestido era como que flutuar numa irrealidade.
Em algum momento, porém, tive que começar a voltar, pois a chegada da noite era iminente. E então o espanto, ao fazer a volta: bati de cara num céu todo róseo naquele lado, coisa de doido, de não se crer, portando imenso disco de prata no meio. O encantamento era tanto que fiquei meio perdida: seria a Lua? Seria, talvez, um Asteróide? Não seria coisa de duvidar, tendo em vista o tanto que Antoine de Saint-Exupéry freqüentara aquela praia na década de 1930. Titubeei, imersa naquele encantamento todo que me fazia como que flutuar na praia, tentando entender direito o que estava vendo. Se fosse um Asteróide, aquele lá seria um Príncipe? Mas seria aquele o Príncipe do Asteróide? No grande disco de prata, quem me olhava não era um menino de cabelos cor de trigal maduro, e nem era alguém que usava um comprido cachecol. Talvez não fosse um Asteróide, afinal. Seria a Lua, a minha própria Lua, a Lua deste meu Planeta? Só podia ser, mas como se fosse um Asteróide, lá na Lua também havia um Príncipe. Era encantado e muito cheio de prata, também, tanto que se confundia com o grande disco luminoso, mas era um Príncipe tão encantado quanto o do Asteróide. No meio daquele brilho todo que flutuava no róseo do céu, podia eu vislumbrar os seus olhos doces e cálidos, macios como avelãs que se comem em noite de Natal, e tão cheios de ternura pela Humanidade que até parecia impossível! Sim, aquele era o Príncipe da Lua, e tudo estava tão luminoso que custei um pouco a reconhecer os detalhes: o sorriso bom, o gorjeio de Passarinho na alma, a maciez da barba, a camisa de xadrezinho azul aberta no peito macio... Ai, a vida era boa demais! Lá naquele lugar encantado, quando menos esperava, o Príncipe da Lua estava ali tão próximo e tão lindo como estava todo o tempo dentro do meu coração!
Não há outra coisa a se fazer com um Príncipe assim além de amá-lo!
* Escritora de Blumenau/SC, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR
Água daquela consistência e daquela cor eu nunca vira sequer no Caribe, e eu sempre digo que o Caribe é o lugar mais bonito do mundo no seu mar! Não sei se ali é sempre assim, ou se eu dera sorte de pegar um momento mágico em pleno andamento, ou se coisas acontecidas há mais de meio século ainda andam pairando por ali e criando aquele encantamento ... O que sei é que água daquela consistência e cor eu jamais vira, nem mesmo no Caribe, pois nem água era, mas um mar de líquido cristal de cor verde-azulada, manso, molengo e cintilante, a se desdobrar em mansas e pequenas ondas que viravam espuma branca com lentidão, e aquele verde-azulado do mar que era cristal contrastava com a luminescência do sol que já mergulhara por detrás da terra, mas deixara no céu aquela luminosidade de ouro que mais parecia coisa descrita em romance medieval – como, nos dias considerados de progresso, que são os dias de hoje, alguém pode se dar ‘a liberdade de dizer que o céu estava cor de ouro? O fato é que estava, assim naquela região por detrás das dunas, e era difícil decidir para onde olhar mais: para o cristal das ondas que se espraiavam em espuma ou para o dourado do céu do outro lado – e havia mais alternativas: lá adiante do meu caminhar o morro mais alto da Armação do Sul, numa cor também entre o verde e o azul, portava saborosa e fofa nuvem de glacê branco à guisa de chapéu – e havia a areia branca da praia, e os muitos surfistas parados, sem coragem de largar aquela beleza toda, pois onda mesmo não viria naquele dia, de jeito nenhum – e os cachorros enormes, mansos e como que cheios de ternura pelo mundo – e quase que ao alcance da mão, do lado do mar, como se fosse só um morro cheio de árvores, a Ilha que decerto fora muito sagrada para muita gente do passado – era o anoitecer de 29 de março na Praia do Campeche, Brasil, e a beleza era tamanha que a própria atmosfera era puro encanto, e eu própria virara um ser encantado que seguia pela praia com o dourado do céu à minha direita e os olhos pregados de fascínio naquela cor verde-azulada do mar de cristal líquido!
Lentamente, aquela cor da água foi-se transformando de verde-azulada em azul-azulada, e como que o céu, e o morro da Armação, lá adiante, e a atmosfera, tudo foi ficando da mesma cor – e por detrás das dunas a cor de ouro diminuía, ficava apenas sugerida, pois já fazia muito que o sol estava a se afastar do dia, e o andar descalça dentro da água de cristal líquido que molhava a barra do meu vestido era como que flutuar numa irrealidade.
Em algum momento, porém, tive que começar a voltar, pois a chegada da noite era iminente. E então o espanto, ao fazer a volta: bati de cara num céu todo róseo naquele lado, coisa de doido, de não se crer, portando imenso disco de prata no meio. O encantamento era tanto que fiquei meio perdida: seria a Lua? Seria, talvez, um Asteróide? Não seria coisa de duvidar, tendo em vista o tanto que Antoine de Saint-Exupéry freqüentara aquela praia na década de 1930. Titubeei, imersa naquele encantamento todo que me fazia como que flutuar na praia, tentando entender direito o que estava vendo. Se fosse um Asteróide, aquele lá seria um Príncipe? Mas seria aquele o Príncipe do Asteróide? No grande disco de prata, quem me olhava não era um menino de cabelos cor de trigal maduro, e nem era alguém que usava um comprido cachecol. Talvez não fosse um Asteróide, afinal. Seria a Lua, a minha própria Lua, a Lua deste meu Planeta? Só podia ser, mas como se fosse um Asteróide, lá na Lua também havia um Príncipe. Era encantado e muito cheio de prata, também, tanto que se confundia com o grande disco luminoso, mas era um Príncipe tão encantado quanto o do Asteróide. No meio daquele brilho todo que flutuava no róseo do céu, podia eu vislumbrar os seus olhos doces e cálidos, macios como avelãs que se comem em noite de Natal, e tão cheios de ternura pela Humanidade que até parecia impossível! Sim, aquele era o Príncipe da Lua, e tudo estava tão luminoso que custei um pouco a reconhecer os detalhes: o sorriso bom, o gorjeio de Passarinho na alma, a maciez da barba, a camisa de xadrezinho azul aberta no peito macio... Ai, a vida era boa demais! Lá naquele lugar encantado, quando menos esperava, o Príncipe da Lua estava ali tão próximo e tão lindo como estava todo o tempo dentro do meu coração!
Não há outra coisa a se fazer com um Príncipe assim além de amá-lo!
* Escritora de Blumenau/SC, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR
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