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Pedrão solta o verbo
*Por Marcelo Sguassábia
Pobres infelizes, até parece que vão conseguir alguma coisa a mais comigo por conta desse foguetório todo. Não posso falar pelo Antonio e pelo João, menos turrões e mais misericordiosos, mas da parte do Pedrão aqui podem tirar o cavalinho da chuva e esquecer qualquer ajuda extra. Além do mais, ninguém lembra de verdade da gente, servimos mais pra dar nome à efeméride do que pra qualquer outra coisa. Ultimamente, nem isso: é festa junina pra cá, festa julina pra lá e o santo homenageado fica de sonso na história, batizando um rega-bofe que compromete seriamente a sua honrada biografia.
Tem coisas que só dando risada. O que eles chamam de pau-de-sebo, este eucalipto toscamente besuntado e com a minha figura lá em cima, para mim só pode ser efeito desse friozinho de inverno sobre o cérebro, façam-me o favor. Que cheguem a mim pela caridade, pela oração e não por essa escalada anti-higiênica, que aos vencedores rende um prato de pé-de-moleque amanhecido ou prenda ainda mais reles, jamais o reino dos céus.
Deviam aproveitar essa fogueira enorme armada aí embaixo para queimar os hereges dessa pândega sacrílega. E como há gente, com esses inocentes vestidinhos de chita, calças de grife falsamente remendadas e dente pintado de preto, que merecia uma inquisiçãozinha daquelas, ao melhor estilo medieval. Não exagero, não. Eu é que sei como é que a coisa termina, eu é que vejo o ritual nada católico atrás da tulha do rancho e cafezal adentro, sob efeito do quentão e da vitamina E do amendoim torrado. Já vi um casalzinho – o padre e a noiva da quadrilha, por sinal – que findo o arrasta-pé fez o que tinha que ser feito escorado no já citado pau-de-sebo, sendo que o sebo acabou servindo para um expediente que nem estando nos fundos dos infernos eu ousaria narrar. Pelas túnicas de Barnabé!
Vejo pais de família e gente de moral insuspeita furtando paçoca, desviando rojões para soltá-los no próximo jogo do seu time, superfaturando cachê de sanfoneiro. Em tudo quanto é quermesse vejo barracas da pesca com anzóis viciados (sei por experiência própria porque de pesca eu entendo), envelopinhos de correio elegante com cocaína dentro – tudo em nome da devoção a este que vos fala. Fora as calúnias envolvendo minha pessoa que entoam abertamente por toda parte, dizendo que eu fugi com a noiva na hora de ir pro altar. Brincadeira inconsequente com o sacramento do matrimônio! E ainda falam que a dita cuja era filha do João, com quem o Antonio ia se casar. Aí já é demais, me poupem. São Pedro cobiçando a mulher do próximo, sendo que o próximo é outro santo!!!
Pergunto: que tem tudo isso a ver com este velho Pedro que andou com o Mestre sobre as águas, que infortunadamente o negou por três vezes, que tem as chaves do céu? Milho verde, pipoca, canjica, lá na Galileia nunca teve nada disso. E o delírio prossegue com mais uns outros termos sem pé nem cabeça, que um sujeito fica entoando no microfone enquanto os caipiras de fachada saracoteiam aos pares: caminho da roça, balancê, a ponte quebrou, olha a cobra...
Vou é fechar o tempo e mandar uma chuva pra acabar com tudo.
* Redator publicitário há mais de 20 anos, cronista de várias revistas eletrônicas, entre as quais a “Paradoxo”
*Por Marcelo Sguassábia
Pobres infelizes, até parece que vão conseguir alguma coisa a mais comigo por conta desse foguetório todo. Não posso falar pelo Antonio e pelo João, menos turrões e mais misericordiosos, mas da parte do Pedrão aqui podem tirar o cavalinho da chuva e esquecer qualquer ajuda extra. Além do mais, ninguém lembra de verdade da gente, servimos mais pra dar nome à efeméride do que pra qualquer outra coisa. Ultimamente, nem isso: é festa junina pra cá, festa julina pra lá e o santo homenageado fica de sonso na história, batizando um rega-bofe que compromete seriamente a sua honrada biografia.
Tem coisas que só dando risada. O que eles chamam de pau-de-sebo, este eucalipto toscamente besuntado e com a minha figura lá em cima, para mim só pode ser efeito desse friozinho de inverno sobre o cérebro, façam-me o favor. Que cheguem a mim pela caridade, pela oração e não por essa escalada anti-higiênica, que aos vencedores rende um prato de pé-de-moleque amanhecido ou prenda ainda mais reles, jamais o reino dos céus.
Deviam aproveitar essa fogueira enorme armada aí embaixo para queimar os hereges dessa pândega sacrílega. E como há gente, com esses inocentes vestidinhos de chita, calças de grife falsamente remendadas e dente pintado de preto, que merecia uma inquisiçãozinha daquelas, ao melhor estilo medieval. Não exagero, não. Eu é que sei como é que a coisa termina, eu é que vejo o ritual nada católico atrás da tulha do rancho e cafezal adentro, sob efeito do quentão e da vitamina E do amendoim torrado. Já vi um casalzinho – o padre e a noiva da quadrilha, por sinal – que findo o arrasta-pé fez o que tinha que ser feito escorado no já citado pau-de-sebo, sendo que o sebo acabou servindo para um expediente que nem estando nos fundos dos infernos eu ousaria narrar. Pelas túnicas de Barnabé!
Vejo pais de família e gente de moral insuspeita furtando paçoca, desviando rojões para soltá-los no próximo jogo do seu time, superfaturando cachê de sanfoneiro. Em tudo quanto é quermesse vejo barracas da pesca com anzóis viciados (sei por experiência própria porque de pesca eu entendo), envelopinhos de correio elegante com cocaína dentro – tudo em nome da devoção a este que vos fala. Fora as calúnias envolvendo minha pessoa que entoam abertamente por toda parte, dizendo que eu fugi com a noiva na hora de ir pro altar. Brincadeira inconsequente com o sacramento do matrimônio! E ainda falam que a dita cuja era filha do João, com quem o Antonio ia se casar. Aí já é demais, me poupem. São Pedro cobiçando a mulher do próximo, sendo que o próximo é outro santo!!!
Pergunto: que tem tudo isso a ver com este velho Pedro que andou com o Mestre sobre as águas, que infortunadamente o negou por três vezes, que tem as chaves do céu? Milho verde, pipoca, canjica, lá na Galileia nunca teve nada disso. E o delírio prossegue com mais uns outros termos sem pé nem cabeça, que um sujeito fica entoando no microfone enquanto os caipiras de fachada saracoteiam aos pares: caminho da roça, balancê, a ponte quebrou, olha a cobra...
Vou é fechar o tempo e mandar uma chuva pra acabar com tudo.
* Redator publicitário há mais de 20 anos, cronista de várias revistas eletrônicas, entre as quais a “Paradoxo”
São Pedro enfurecido de faz de conta me fez lembrar de um caso. No meio da festa sai Seu João pelo lado direito da festa e Dona Maria pelo lado direito. Tempos depois, olha eles de volta, cada um do seu lado, só que dona Maria amarrotada e com pedaços de capim seco nos cabelos. Seu João também estava com o mesmo carimbo. Muito disfarce e no final todos sabem o que aconteceu, antigamente e sempre. Obrigada Marcelo, pelo prazer da leitura e do breve relax com a sua graça.
ResponderExcluirQue São Pedro mais resmunguento, sô! Mas até que ficou engraçado pq, de religiosa, a festa não tem nada. Isso pode tirar o humor do santo, mas preserva a graça da comemoração - uma graça, caro Marcelo, que vc explorou ao máximo da sua veia cômica: mais uma faceta desse talento que se derrama para todos os lados. Vale uma boa prenda. Parabéns.
ResponderExcluirErrata: Dona Maria sai pelo lado esquerdo...
ResponderExcluirFaz assim não , São Pedro ! Adoro festa junina que agora também já virou julina....hummmm bom demais !
ResponderExcluirLendo seu texto me deu vontade de comer Canjica. Texto apetitoso, Marcelo !