As histórias do Amadeu
* Por Ed Santos
Na época em que parou de trabalhar, o Amadeu não ligava muito pra isso de tecnologia. Male-male usava o controle-remoto do videocassete – sensação da época. A Flavinha sua filha, era a responsável por ler, entender e repassar aos pais todas as informações dos manuais, além de pôr as coisas pra funcionar.
Mas depois que foi embora morar com o namorado, deixou pai e mãe órfãos nessa questão. A última coisa que fez foi ensinar o pai a usar o telefone celular. Usar não, ensinou ele a fazer e atender as ligações. Pra pôr no vibracall era o fim do mundo.Freqüentemente, durante as partidas de dominó, o Amadeu conversava com os amigos sobre vários assuntos e a discussão sobre a dificuldade com os eletrônicos sempre vinha à tona.
- Vocês viram o celular novo que eu ganhei de aniversário de casamento? Tem até MP3.
- Que coisa é essa Carlos? MP3? – pergunta o Amadeu curioso.
- É um sistema pra tocar músicas. Você grava no computador as músicas que você quer ouvir, e depois transfere pro celular. Pra ouvir é só pôr esses fonezinhos aqui ó.
- Ah, lembrei! A Flavinha já tinha me mostrado um radinho que ela tem com esse tal MP3. Mas assim no celular eu nunca tinha visto não.
- É coisa de tecnologia né Amadeu! Você nunca ouviu falar? Computador você conhece, né?
- Claro que sim né Carlos! Mas o que tinha lá em casa a Flavinha levou embora quando foi morar com aquele mané. E eu nunca mexi. Nem sei como funciona! Mas vem cá, e esse telefone aí? Faz ligação também ou só toca música?
- Se pôr crédito faz normal, mas ainda não carreguei não.
Amadeu ficou encantado com a novidade. Um celular que toca música no fonezinho, quem diria. Ele achou o máximo! “Mas e se tocar o telefone, como vou saber? E pra atender? Tem que desligar a música?” Melhor deixar pra lá. Outra hora ele pergunta pro Carlos, aliás, não tinha nem computador em casa. E outra, também não podia ficar mostrando pros amigos em plena mesa de dominó, que não sabe o que é MP3. Basta os “micos” que a Marilda fazia ele pagar.
No outro dia, na caminhada, eis que o Carlos aparece com o tal celular e seus fonezinhos.
- E aí Carlos, vai caminhar assim com esse troço ai pendurado?
- Claro! Enquanto caminho, ouço um Paulinho da Viola de primeira! Nem vou lembrar das safenas que carrego aqui no peito.
O Amadeu então resolve que daquele dia em diante ia se inteirar completamente sobre essas coisas modernas. Não podia, mesmo com essa idade, deixar de saber delas. Ainda mais depois daquela manhã em que não conseguiu conversar com o amigo enquanto caminhava. Sentiu-se muito só, ao contrário do amigo que tinha arranjado um novo companheiro – o tal celular com MP3.
A primeira providencia que tomou após o banho, foi ligar – do celular – pra Flavinha.
- Oi filha, tudo bem?
- Diga pai. Que surpresa é essa? Aconteceu alguma coisa?
- Não. É que resolvi comprar um computador e queria uma opinião sua.
- Mas pai, o senhor não sabe ligar nem a TV direito! O que te deu?
- Ah, Flávia, não dá pra ficar desatualizado né? E outra, cansei de ficar jogando dominó o dia inteiro.
- Olha só o pai! É assim que se fala!
- Você me ajuda então filha?
- Pode deixar. Semana que vem vou arrumar um tempinho pra ir aí, e conversamos tá?
- Tá bom filha.
- Tchau, beijo. Dá um beijo na mãe.
- Dou sim. Tchau!
E desligou o celular. Ficou olhando pro aparelho assim com jeito de quem queria desmontá-lo pra saber o que tinha lá dentro. Queria desvendar os segredos da tecnologia. Bendito MP3!
Pronto. O primeiro passo tava dado. Agora vinha a parte mais difícil: convencer a Marilda de incluir mais uma despesa nas contas do mês. O computador tinha que ser financiado né? Afinal, benefício de aposentado é aquela coisa!
* Jornalista – blog http://ocioduroderoer.blogspot.com.
* Por Ed Santos
Na época em que parou de trabalhar, o Amadeu não ligava muito pra isso de tecnologia. Male-male usava o controle-remoto do videocassete – sensação da época. A Flavinha sua filha, era a responsável por ler, entender e repassar aos pais todas as informações dos manuais, além de pôr as coisas pra funcionar.
Mas depois que foi embora morar com o namorado, deixou pai e mãe órfãos nessa questão. A última coisa que fez foi ensinar o pai a usar o telefone celular. Usar não, ensinou ele a fazer e atender as ligações. Pra pôr no vibracall era o fim do mundo.Freqüentemente, durante as partidas de dominó, o Amadeu conversava com os amigos sobre vários assuntos e a discussão sobre a dificuldade com os eletrônicos sempre vinha à tona.
- Vocês viram o celular novo que eu ganhei de aniversário de casamento? Tem até MP3.
- Que coisa é essa Carlos? MP3? – pergunta o Amadeu curioso.
- É um sistema pra tocar músicas. Você grava no computador as músicas que você quer ouvir, e depois transfere pro celular. Pra ouvir é só pôr esses fonezinhos aqui ó.
- Ah, lembrei! A Flavinha já tinha me mostrado um radinho que ela tem com esse tal MP3. Mas assim no celular eu nunca tinha visto não.
- É coisa de tecnologia né Amadeu! Você nunca ouviu falar? Computador você conhece, né?
- Claro que sim né Carlos! Mas o que tinha lá em casa a Flavinha levou embora quando foi morar com aquele mané. E eu nunca mexi. Nem sei como funciona! Mas vem cá, e esse telefone aí? Faz ligação também ou só toca música?
- Se pôr crédito faz normal, mas ainda não carreguei não.
Amadeu ficou encantado com a novidade. Um celular que toca música no fonezinho, quem diria. Ele achou o máximo! “Mas e se tocar o telefone, como vou saber? E pra atender? Tem que desligar a música?” Melhor deixar pra lá. Outra hora ele pergunta pro Carlos, aliás, não tinha nem computador em casa. E outra, também não podia ficar mostrando pros amigos em plena mesa de dominó, que não sabe o que é MP3. Basta os “micos” que a Marilda fazia ele pagar.
No outro dia, na caminhada, eis que o Carlos aparece com o tal celular e seus fonezinhos.
- E aí Carlos, vai caminhar assim com esse troço ai pendurado?
- Claro! Enquanto caminho, ouço um Paulinho da Viola de primeira! Nem vou lembrar das safenas que carrego aqui no peito.
O Amadeu então resolve que daquele dia em diante ia se inteirar completamente sobre essas coisas modernas. Não podia, mesmo com essa idade, deixar de saber delas. Ainda mais depois daquela manhã em que não conseguiu conversar com o amigo enquanto caminhava. Sentiu-se muito só, ao contrário do amigo que tinha arranjado um novo companheiro – o tal celular com MP3.
A primeira providencia que tomou após o banho, foi ligar – do celular – pra Flavinha.
- Oi filha, tudo bem?
- Diga pai. Que surpresa é essa? Aconteceu alguma coisa?
- Não. É que resolvi comprar um computador e queria uma opinião sua.
- Mas pai, o senhor não sabe ligar nem a TV direito! O que te deu?
- Ah, Flávia, não dá pra ficar desatualizado né? E outra, cansei de ficar jogando dominó o dia inteiro.
- Olha só o pai! É assim que se fala!
- Você me ajuda então filha?
- Pode deixar. Semana que vem vou arrumar um tempinho pra ir aí, e conversamos tá?
- Tá bom filha.
- Tchau, beijo. Dá um beijo na mãe.
- Dou sim. Tchau!
E desligou o celular. Ficou olhando pro aparelho assim com jeito de quem queria desmontá-lo pra saber o que tinha lá dentro. Queria desvendar os segredos da tecnologia. Bendito MP3!
Pronto. O primeiro passo tava dado. Agora vinha a parte mais difícil: convencer a Marilda de incluir mais uma despesa nas contas do mês. O computador tinha que ser financiado né? Afinal, benefício de aposentado é aquela coisa!
* Jornalista – blog http://ocioduroderoer.blogspot.com.
É exatamente assim: o medo dissolve a curiosidade. No começo parece que o aparelho vai abrir a boca e engolir aquele que o respeita e tem receio. Caso não o engula, parece que explodirá. No final é possível até aos mais temerosos, fazer funcionar o básico. Aquela de fazer curso de seis meses para ligar o microondas já passou. Agora é encarar a máquina sem medo. E viver a vida safenado, mas feliz. O tema foi uma ótima lembrança por comum e atual.
ResponderExcluirQue bom ver você aqui. Tomara que fique permanente. Mas não deixe de ser o meu colaborador também. Não quero exclusividade, mas não precisa me deixar.rs
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