O homem de Ciudad Bolívar
* Por
Urda Alice Klueger
Dia 06.03.2017 fez 04
anos que ele partiu. Minha modesta imagem, abaixo, àquele que representava,
para mim, a Esperança.
(Para o homem da
rodoviária de Ciudad Bolívar e para Hugo Chávez Frías)
Mais ou menos dez da
noite, e eu chegara à Ciudad Bolívar, interior da Venezuela, cansada, com fome
e muitíssimo curiosa para saber o que pensavam as gentes de uma cidade de
100.000 habitantes, depois de uma semana ouvindo as gentes de Caracas, cidade
grande.
Sentei-me à mesa de
plástico de um vendedor de sanduíches e pedi algo para comer. Os venezuelanos
são muito simpáticos, e logo eu estava em animada conversa com aquele vendedor
de sanduíches.
- Primeiro, eu nunca
tinha votado – explicou-me ele. Há que se lembrar que na Venezuela o voto não é
obrigatório. Meu novo amigo apontou-me uma praça próxima:
- Agora, não perco uma
eleição. Agora todos votam. Está vendo aquela praça ali? Há tanta gente que
vota que aquela praça fica tomada por uma fila que vai de lá até aqui, ó! –
continuou, mostrando o tamanho considerável da fila que revia na sua
imaginação, e que enfrentava a cada vez que havia eleições e referendos.
Era verdadeiramente
impressionante o tamanho da fila que meu novo amigo me contava, como era
impressionante no seu olhar, no seu rosto e na sua postura, o orgulho de se
saber e se sentir cidadão, após a miserabilidade de uma vida que eu diria de
escravidão, já que nos mais de sessenta anos anteriores só eram cidadãos e
quase que só votavam os milionários donos do petróleo – pelo menos eram eles
quem davam todas as cartas e aplicavam todo o dinheiro gerado pelo subsolo
venezuelano nas suas fortunas de Miami e tinham abandonado seu povo à própria
sorte, como eu já pudera ver sobejamente na Caracas rodeada de cerros onde até
pouco campeava a mais absoluta miséria e abandono.
- E o Comandante? –
fiz uma pergunta que poderia ser tudo ou nada.
O rosto do homem se
abriu num largo sorriso de prazer, como também se abriam os rostos das gentes
de Caracas.
- Ah! Nós amamos o
Comandante! Não havia nenhuma esperança nas nossas vidas antes do Comandante.
Agora passamos a ser gente livre, agora podemos decidir nosso futuro! – e o meu
amigo passou a contar das diferenças na sua vida, de como voltara a estudar, de
como agora ele e sua família tinham acesso a médico a qualquer momento, de como
os remédios eram gratuitos, de como a comida era subsidiada pelo dinheiro do
petróleo que agora não vazava mais todo para Miami, de como até pudera abrir
seu pequeno negócio de sanduíches.
- Antes a gente não
podia nada, além de ser pobre e sofrer. Se não fosse o Comandante, o que seria
de nós?
Isto foi em janeiro de
2006, e como hoje é 06 de março de 2013, lá já se foram sete anos. Eu sei que
aquele homem de Ciudad Bolívar deve estar chorando, e queria estar lá para dar
um abraço nele, porque também estou chorando aqui. Chávez se foi ontem, mas
nunca mais deixará de estar conosco. Luminosa estrela no meu céu, eu lhe digo:
- Até a vitória
sempre, Comandante! – e de novo choro, pois o mundo já não é igual desde ontem,
quando te foste tão prematuramente. O que me consola são todas as sementes que
plantaste, tantas que a gente ainda nem sabe avaliar como germinarão por todos
os lados. Há que chorar, no entanto,
porque o coração dói.
*
Escritora de Blumenau/SC, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR,
autora de vinte e seis livros (o 26º lançado em 5 de maio de 2016), entre os
quais os romances “Verde Vale” (dez edições) e “No tempo das tangerinas” (12
edições).
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