Espelho do narcisismo
A vaidade é uma característica inerente
ao ser humano. Não há quem não a tenha, consciente ou inconsciente, posto que
em intensidades variáveis. Alguns, levam-na a extremos (com ou sem razão).
Outros, aparentam não serem nem um pouco vaidosos, contudo, ficariam surpresos
se vasculhassem seu íntimo e trouxessem à tona o que não ousam revelar a
ninguém. Na devida proporção, já escrevi certa feita, a vaidade sequer chega a
se constituir em defeito. O
problema (como em tudo na vida) está no exagero. E este é muito mais comum do
que se pensa.
No duro, no duro, somos mais do que
meramente vaidosos em relação à nossa aparência, nossas virtudes, nossas obras
e nossas conquistas. Somos, em certa medida, narcisistas. Não nos cansamos de admirar
nossa figura no espelho da mente e nos apaixonamos por ela. Alguns levam a
paixão a extremos. Outros aparentam não serem nem um pouco narcisistas, mas
ficariam surpresos se vasculhassem o seu íntimo e trouxessem à tona o que não
revelam a ninguém. Esta oração é semelhante a outra, mais acima, mas foi
repetida não por engano, mas de propósito. Afinal, da vaidade saudável para o
narcisismo insano basta um simples passo.
Todos, sem exceção, bem no fundo do
subconsciente, nos julgamos os mais belos (mesmo que sejamos mais feios do que
a mãe da peste e rivalizemos, em feiúra, com Frankenstein ou com Quasimodo),
mais sábios (embora sejamos mais tapados que as toupeiras) e mais virtuosos (a
despeito de termos mais vícios que Nero e Messalina juntos) do mundo.
Muitos, a esta altura, estarão reagindo
à minha afirmação de modos bastante diferentes. Alguns se limitarão a dizer, a
si mesmos: “não sou assim”. No íntimo, porém, terão plena convicção de que de
fato são. Outros torcerão o nariz e afirmarão, com empáfia e arrogância: “este
sujeito é uma besta! Só escreve bobagens” (referindo-se a mim, claro). São
aqueles aos quais a carapuça serve direitinho, sem necessitar do mínimo ajuste.
Raros admitirão que tenho razão.
Há narcisismo e narcisismo. Ou seja, essa
paixão incontrolável por si mesmo varia de intensidade e de formas de
manifestação. Até os que parecem mais despojados e com baixa (ou aparentemente
nula) auto-estima, são, no fundo, no fundo, narcisistas. Aliás, estes o são, na
maioria dos casos, em grau superlativo. Levam seu narcisismo ao paroxismo.
Apenas manifestam-no, todavia, de forma negativa, como disfarce.
Algumas pessoas de real valor, que
tiveram acesso às melhores universidades e receberam todos os tipos de
oportunidades na vida (que a maioria jamais pôde, sequer, sonhar), se omitem da
responsabilidade de darem sua retribuição e contribuírem, assim, para construir
um mundo melhor, sob pretextos esdrúxulos e covardes.
A maioria lesa, com isso, a sociedade,
que lhes proporcionou meios para que estudassem, já que se forma, salvo raras
exceções, em escolas superiores públicas, ou seja, sustentadas por impostos
cobrados, indiferentemente, de pobres (que, proporcionalmente, pagam mais) e
ricos.
Há quem prefira, após a diplomação,
vender cachorro-quente nas ruas de Nova York, do que ser médico, advogado,
engenheiro, professor etc. no país que lhe proporcionou esses meios de
ascensão. O interessante é que, quem age assim, se utiliza de razões públicas
para tentar justificar emoções privadas. São, contudo, omissos, com todas as
letras, meros parasitas que vivem às custas alheias, irremissíveis narcisistas.
Afirmam que é impossível melhorar o
mundo e que os que acreditam no poder da vontade humana para o sucesso dessa
tarefa, são alienados, malucos, meros idealistas, tentando dar sentido
pejorativo a essa nobre palavra.
Apregoam, aos quatro ventos, como se
sua afirmação fosse um dogma e que contrariá-lo, portanto, se constitui em
suprema heresia, que por mais que se esforce, o homem não passa mesmo de
animal, subjugado a irresistíveis instintos como o sexo, a agressividade, a
cobiça e vai por aí afora.
Argumentam que quem manda de fato no
mundo é o “mercado”, alçado quase à categoria de uma divindade, onipotente e
onipresente (no que não deixam de ter razão). Que a violência jamais poderá ser
sequer contida, quanto mais eliminada. Que as drogas vieram para ficar, dada a
fragilidade psicológica de quem recorre a esse meio de fuga da realidade. Que a
vida, por ser única, é para ser gozada e “quem pode mais chora menos”.
São, na verdade, narcisistas, que se
utilizam do sentimento de impotência como pretexto para a omissão e,
principalmente, para justificar seu imenso egoísmo. Sem que se apercebam, fazem,
apenas, da pretensa impotência, o mais perfeito espelho que reflete por inteiro
e sem omitir o mínimo detalhe seu monumental narcisismo. A Literatura tratou, e
segue tratando, extensamente da vaidade, em seus variados aspectos. É
extensíssima a bibliografia sobre o tema. Proponho-me a abordar esse aspecto
oportunamente, dada sua extensão e complexidade. Por hoje... paro por aqui.
Boa leitura!
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Essa introdução já deu uma ideia do que virá.
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