Lugar
incomum mais que comum
* Por Mara Narciso
Não
significa nada dizer sua coisa tem cada tempo e sim falar cada coisa tem o seu
tempo. Tempo de escolher se recolher. Ou não. Cada um fora do redondo, enquanto
todos os macacos descem do mesmo galho. É que “eu vim para confundir, não para
explicar.” (Chacrinha).
É
obrigatório ter opinião e externá-la. Tantas são as provocações que muitos não
resistem a uma má briga. Porque não existe uma boa batalha. Mesmo quando
inicialmente há uma mesma ideia, é proibido o consenso. Alguns geniosos, mas
não geniais, deixam um ambiente de guerra ou até de terra arrasada nas redes
sociais. O ridículo pode surgir em cada página. Fala-se de amor e a resposta é
de ódio, porque é preciso odiar as pessoas hoje e odiá-las ainda mais amanhã.
Sigo
em frente é o oposto de volto para trás, o que também é reles redundância.
Podem-se ganhar espaços impensados e argumentos irrespondíveis no mundo
virtual. Diz-se e desdiz-se, aprofundando-se o não dito para polemizar. O
importante é a não frutificação da discussão. Os conselhos virtuais fazem rir.
Algumas convicções são piadas, e custa-se a acreditar que alguém possa crer naquilo.
O
sapo grila, o grilo coacha, porém tudo parece normal, porque ninguém vê de onde
vem o som da noite. O apagão é um conselheiro ainda melhor do que o black-out,
porque fala Português e desliga o computador e a TV. Rimando e ensinando, a
escuridão é a cara da solidão, cuja companheira é a introspecção. Mas poucos se
atrevem a pensar. Alguém disse que pensar não dói. Melhor não arriscar.
Analgésico anda caro.
O
tempo adoece, dilui, traz esquecimento. “Quem parte leva saudades de alguém que
fica chorando de dor” (cancioneiro popular). Quem não tem memória não chora de
saudades, então, que morra a memória! A contraposição mistura tudo, pode causar
uma luta inútil ou um novo caminho. Ando depressa porque andava devagar, e na
mansidão a comida está cozida. Não fazer sentido faz sentido, porque vazia é a
existência.
Para
que voltar, se é preciso ir? Tomar banho hoje quando já tomei banho ontem, ou
precisar comer de novo, quando comi há poucas horas. Então surgem poemas
originais, alguns miraculosos, que emocionam, e outros que não têm significado,
nem mesmo para quem os criou. Possuem apenas palavras (e o que mais poderiam
ter?), soltas, agrupadas, bonitas, feias, ritmadas, rimadas ou cada uma por si
sem nada dizer uma para a outra.
“Na
televisão nada se cria, tudo se copia” (Chacrinha) e ninguém liga se a cópia
foi mal feita. Mas deveria. Os dizeres vazios não perderam o sentimento, apenas
o sentido. Morreu alguém amado? O tempo cura todas as feridas. Seu amor te
abandonou? Ele não sabe o que perdeu. A falta de dinheiro é um problema? Deus
proverá. Está doente? Logo estará bem. Faz anos? Feliz aniversário! Quem se
atreveria a dizer outra coisa?
Quanta
inutilidade! Melhor amarrar o cadarço e partir. Assim não caminha a humanidade.
E não diga que não foi avisado. Amém!
* Médica endocrinologista, jornalista
profissional, membro da Academia Feminina de Letras e do Instituto Histórico e
Geográfico, ambos de Montes Claros e autora do livro “Segurando a
Hiperatividade”
Nenhum comentário:
Postar um comentário