Fila de banco
* Por
Gustavo do Carmo
Um
banco lotado. Fila enorme. Hércules está nela. Aliás, a fila é daquela sentada,
com senha. E as cadeiras ainda são desconfortáveis. Há cinco guichês, mas
apenas dois funcionários estavam atendendo. Um deles somente para os idosos.
Hércules
está com a senha de número 140. Já está há mais de 40 minutos na fila. O painel
eletrônico marca 80 há quase dez minutos. Do nada, o funcionário que atendia os
idosos sai para almoçar, sem dar nenhuma satisfação, como se estivesse saindo
da frente da TV. O atendente que ficou sozinho passa a revezar entre o público normal e os idosos.
Um senhor de cabelos grisalhos chega ao caixa com uma resma de contas para
pagar.
Hércules
começa a passar mal. Se remexe na cadeira dura e desconfortável. Leva a mão
direita ao peito esquerdo e depois massageia o braço do mesmo lado para aliviar
a dormência. Uma senhora se preocupa e lhe oferece água. O gerente permite que
ele passe na frente, para protesto das centenas de outros clientes atrás.
Hércules
diz que estava enfrentando a sua quinta fila quilométrica no dia, mas a
primeira sentado. Foram as suas últimas palavras, ditas já sem fôlego, antes de
cair fulminado. Tinha apenas 32 anos, metade da idade necessária para poder
entrar na fila dos idosos, que também estava grande.
* Jornalista e
publicitário de formação e escritor de coração. Publicou o romance “Notícias
que Marcam” pela Giz Editorial (de São Paulo-SP) e a coletânea “Indecisos -
Entre outros contos” pela Editora Multifoco/Selo Redondezas - RJ. Seu blog, “Tudo cultural” - www.tudocultural.blogspot.com é bastante freqüentado por
leitores
Ouço dizer que a fila é a forma mais democrática de organizar, que existe, pois todos ficam iguais. Em tese seria uma maneira civilizada de não prejudicar ninguém. E veja, aí Gustavo! Uma tragédia na fila. Somos uns animais, sim. Só que, agora em eterna fila. Uma fulminante crítica social. Parabéns!
ResponderExcluir