As palavras revitalizam
* Por
Talis Andrade
Com Paisagem com Dromedário (Companhia das Letras, 168 páginas, R$ 38), Carola Saavedra reforça sua crença no poder de revitalização da palavra. Dessa vez, a comunicação acontece a partir de 22 gravações com que a artista plástica Érika pretende recuperar o amor de Alex, afastado depois da morte de uma amiga, Karen, com quem formavam um triângulo amoroso.
Da carta para o som gravado, Carola apresenta um salto da literatura para o cinema e até radioteatro. Continua, no entanto, disposta a tratar de questões como a da identidade. Sobre o assunto, ela respondeu às seguintes questões por e-mail
A grande reflexão sobre a própria vida parece ser a redenção de seus personagens. Concorda?
Sim, são personagens que se encontram em um momento de crise, que perderam algo importante, seja pela morte, separação, ou o fracasso de um projeto de vida, e que tentam se recuperar dessa perda por intermédio da palavra. É pela palavra que eles tentam construir, ou melhor, reconstruir sua identidade. A palavra os traz de volta ao humano, seja em Toda Terça, erguendo mesmo que apenas momentaneamente a redoma de vidro que os separa do mundo, seja em Flores Azuis, resgatando a personagem da loucura e do desespero, ou em Paisagem com Dromedário, em que a palavra tangencia o luto e a transformação da personagem. Ou seja, é essa reflexão pela palavra o que os torna humanos novamente.
TRECHO
Faz uma ou duas semanas que estou aqui. Talvez sejam apenas alguns dias, não sei. Alex, os dias passam de modo incomum neste lugar. Não sei se era uma fotografia ou se fui eu que guardei aquele momento como algo estático na memória. Antes que as coisas com Karen tomassem o rumo que tomaram. Nós três. A imagem era assim: Karen abrindo uma garrafa de vinho, você a abraçava pelas costas, dizia alguma coisa em seu ouvido. Karen ria, envergonhada. Sempre ria assim, como se o riso fosse algo obsceno.
* Escritor, jornalista, colaborador do
Observatório da Imprensa, membro da redação de La Insignia, na Espanha.
Publicou o romance “Os Corações Futuristas”, cuja paisagem é a ditadura Médici,
“Soledad no Recife” e “O filho renegado de Deus”. Tem inédito “O Caso Dom Vital”, uma sátira ao
ensino em colégios brasileiros.
Nenhum comentário:
Postar um comentário