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O lado de baixo da lua crescente
* Por Urda Alice Klueger
Faz frio; o forte vento sul hoje jogava nos olhos da gente a areia mexida na escavação arqueológica. Apesar do vento, fiquei muito tempo observando diversas coisas, principalmente o cuidado com que Alexandre, um jovem arqueólogo, trazia à luz o esqueleto de uma criancinha que um dia viveu por aqui, faz cerca de1.800 anos. Ainda é prematuro dizer-se com que idade morreu, mas é provável que tenha sido com alguns meses de idade, tão frageizinhos são seus ossos que Alexandre trata com maior delicadeza do que se fossem de açúcar. Observava o cuidado dele, e imaginava aquela criancinha ainda viva, mamando gulosamente no peito da sua mãe, quiçá de olhos luminosos, sorriso aberto. O que terá acontecido que abreviou assim sua vida? Talvez os cientistas consigam descobrir, não sei. O que posso dizer a respeito dela é que está descansando faz uns 18 séculos no lugar chamado Sítio Arqueológico Sambaquiano Jabuticabeira II – fica fácil descobrir aonde é para quem gosta de Arqueologia.
Queria falar na criancinha e queria falar do frio e do vento sul e da Lua – na verdade, foi por causa da Lua que comecei este texto.
Há pouco, nosso grupo saiu todo para a noite fria para ir jantar. Bastaram poucos passos fora da pousada para que quase todos nós estivéssemos de olho no céu de inverno, límpido e negro, com grandes estrelas penduradas naquele veludo, e a foice luminosa de uma lua crescente! Sou pessoa de reparar na lua, mas nunca me dera conta de um detalhe que uma doce arqueóloga botou em destaque. Ela se chama Paula, e está sempre tão calma que penso que a sua placidez tem a ver com seus oblíquos olhos quase orientais, que de alguma forma lhe transmitiram uma calma que atribuímos aos povos do Oriente.
- Quando a lua crescente tem na parte de baixo esse reflexo luminoso, é porque ela está refletindo a terra, a luminosidade dos pólos!
Pela primeira vez na vida prestei atenção a essa luminosidade da qual nunca me dera conta e ela era verdadeira, estava lá, na parte de baixo da Lua.
Pasma, fiquei quieta, fui pela noite espiando de uma forma um pouco enviesada aquela fatia de lua iluminada por cima e por baixo – como nunca me dera conta de tal coisa? Cheguei ao restaurante, entrei, comi, sempre pensando em como nunca reparara naquilo. Já terminava de jantar quando quem se iluminou foi a minha alma: claro que não se podia ver sempre tal luminosidade, porque nem sempre lá por perto dos pólos havia algo tão irradiante! Há longos períodos de escuridão naquelas regiões – mas, com certeza, neste momento um dos pólos está explodindo de luminosidade! Não está lá perto o meu amor, aquele Príncipe que tem um Passarinho por dentro, aquele Ser Humano que possui dentro de si toda a luminosidade das estrelas? Claro está que a presença do meu amor nas proximidades de um pólo deve deixá-lo assim tão cheio de luz que a irradiação vai até à Lua!
E eu, aqui, nem ia prestar atenção! Se não tivesse ido jantar com os arqueólogos... Ah! Meu Passarinho luminoso, estou agora aqui a espiar pela janela e a mandar recadinhos para você através da luz que há do lado de baixo da Lua. Será que você os está recebendo?
• Escritora, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR.
* Por Urda Alice Klueger
Faz frio; o forte vento sul hoje jogava nos olhos da gente a areia mexida na escavação arqueológica. Apesar do vento, fiquei muito tempo observando diversas coisas, principalmente o cuidado com que Alexandre, um jovem arqueólogo, trazia à luz o esqueleto de uma criancinha que um dia viveu por aqui, faz cerca de1.800 anos. Ainda é prematuro dizer-se com que idade morreu, mas é provável que tenha sido com alguns meses de idade, tão frageizinhos são seus ossos que Alexandre trata com maior delicadeza do que se fossem de açúcar. Observava o cuidado dele, e imaginava aquela criancinha ainda viva, mamando gulosamente no peito da sua mãe, quiçá de olhos luminosos, sorriso aberto. O que terá acontecido que abreviou assim sua vida? Talvez os cientistas consigam descobrir, não sei. O que posso dizer a respeito dela é que está descansando faz uns 18 séculos no lugar chamado Sítio Arqueológico Sambaquiano Jabuticabeira II – fica fácil descobrir aonde é para quem gosta de Arqueologia.
Queria falar na criancinha e queria falar do frio e do vento sul e da Lua – na verdade, foi por causa da Lua que comecei este texto.
Há pouco, nosso grupo saiu todo para a noite fria para ir jantar. Bastaram poucos passos fora da pousada para que quase todos nós estivéssemos de olho no céu de inverno, límpido e negro, com grandes estrelas penduradas naquele veludo, e a foice luminosa de uma lua crescente! Sou pessoa de reparar na lua, mas nunca me dera conta de um detalhe que uma doce arqueóloga botou em destaque. Ela se chama Paula, e está sempre tão calma que penso que a sua placidez tem a ver com seus oblíquos olhos quase orientais, que de alguma forma lhe transmitiram uma calma que atribuímos aos povos do Oriente.
- Quando a lua crescente tem na parte de baixo esse reflexo luminoso, é porque ela está refletindo a terra, a luminosidade dos pólos!
Pela primeira vez na vida prestei atenção a essa luminosidade da qual nunca me dera conta e ela era verdadeira, estava lá, na parte de baixo da Lua.
Pasma, fiquei quieta, fui pela noite espiando de uma forma um pouco enviesada aquela fatia de lua iluminada por cima e por baixo – como nunca me dera conta de tal coisa? Cheguei ao restaurante, entrei, comi, sempre pensando em como nunca reparara naquilo. Já terminava de jantar quando quem se iluminou foi a minha alma: claro que não se podia ver sempre tal luminosidade, porque nem sempre lá por perto dos pólos havia algo tão irradiante! Há longos períodos de escuridão naquelas regiões – mas, com certeza, neste momento um dos pólos está explodindo de luminosidade! Não está lá perto o meu amor, aquele Príncipe que tem um Passarinho por dentro, aquele Ser Humano que possui dentro de si toda a luminosidade das estrelas? Claro está que a presença do meu amor nas proximidades de um pólo deve deixá-lo assim tão cheio de luz que a irradiação vai até à Lua!
E eu, aqui, nem ia prestar atenção! Se não tivesse ido jantar com os arqueólogos... Ah! Meu Passarinho luminoso, estou agora aqui a espiar pela janela e a mandar recadinhos para você através da luz que há do lado de baixo da Lua. Será que você os está recebendo?
• Escritora, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR.
Eu também nunca vi tal detalhe. Vou passar a repará-lo.
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