domingo, 23 de outubro de 2011







Quem pode com Laurinha?

* Por Fábio de Lima


Na minha rua tem uma garota rebelde. Laurinha não quer mais ser criança, ela agora quer ser Laura. A menina de 11 anos cansou de brincar com bonecas, de ir acompanhada com a mãe para a escola, de ir à casa de parentes nos finais de semana. Anda dizendo por aí que tem um namorado e irá se casar em breve. A jovem só fala agora de ir ao cinema ou à danceterias. Roupas justas modelando o corpo fazem seu estilo de uns tempos para cá. Sai com amigos e com o próprio namorado, não tendo hora de voltar para casa. Aqui na rua só se fala nisso nas últimas semanas.

Até um ano atrás, eu via Laurinha junto com outras crianças da varanda da minha casa. Nunca reparei direito na garota, é bem verdade, pois são várias as crianças que ficam à rua, e jogam bola de gude, vôlei, futebol e basquete – além de brincarem de pega-pega, esconde-esconde e tantas outras coisas que só de falar já me canso. Estou sempre ocupado, mas algumas vezes, por alguns minutos, olho a rua. É sempre a mesma coisa, então volto para frente do computador. Nunca fiz de minha rua assunto para minhas histórias, mas hoje chegou o dia.

Laurinha é filha única e de pais separados, isso dá mais cabimento para as futricas dos vizinhos. Sua mãe já fez de tudo para que a garota se colocasse no devido lugar de criança, desde conversas em casa ou visitas ao psicólogo, boas surras de cinto ou participar mais da rotina da filha, porém, nada deu resultado. Laurinha teima em ser Laura. As outras mães da rua mostram-se indignadas e dizem que se fossem mãe da garota, isso não ficaria assim. Aqui em casa já escutei, por várias vezes, teorias sobre o que estaria acontecendo com Laurinha.

Todo escritor precisa de ambiente calmo, aconchegante, para poder trabalhar. Tenho 2 cachorros, 1 gato, 1 papagaio, 1 coelho e 2 periquitos, o que já me coloca como exceção na classe de escritores, mas, confesso que nunca nada me atrapalhou tanto como essa tal de Laurinha. Já pensei em eu mesmo ir à casa da menina e falar umas boas para ela, a mãe e quem mais estiver por perto. Pensei também em mudar de casa ou pagar um aluguel para Laurinha e família em outra rua, o mais longe possível daqui. Ou ainda, presenteá-la com uma passagem só de ida para o Egito. Meu problema é que ando sem dinheiro. Sabe como é vida de jornalista, né?! Devido a essa ‘múmia’, chamada Laurinha, pensei até em abandonar a carreira ou dar um tempo, sei lá. Virar psicólogo!

Mas, ontem de madrugada, precisamente às 3 horas, quando eu não conseguia dormir com gritos vindos da rua – onde uma mãe ensandecida corria com uma vassoura atrás da filha e os vizinhos incitavam a descabida correria, encontrei a solução para minha vida com Laurinha. Nada de abandonar a profissão. Reverterei o problema a meu favor. A partir de hoje começo a escrever uma série intitulada QUEM PODE COM LAURINHA?. Para dizer a verdade será um festival, um livro, uma peça teatral, um curta-metragem, um longa-metragem, músicas, hinos, um documentário e finalmente uma novela. Se minha carreira de escritor terá êxito não sei, tudo depende da Laurinha!

*Jornalista e escritor ou “contador de histórias”, como prefere ser chamado. Atua como repórter freelancer para o jornal Diário do Comércio (SP) e é diretor de programação da Cinetvnet (TV pela WEB). Está escrevendo seu primeiro romance, DOCE DESESPERO.

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