domingo, 30 de outubro de 2011







Poema

* Por Tomás Antonio Gonzaga

De amar, minha Marília, a formosura
não se podem livrar humanos peitos.
Adoram os Heróis, e os mesmos brutos
aos grilhões de Cupido estão sujeitos.
Quem, Marília, despreza uma beleza
a luz da razão precisa;
e se tem discurso, pisa
a lei, que lhe ditou a Natureza.

Cupido entrou no céu. O grande Jove
uma vez se mudou em chuva de ouro;
outras vezes tomou as várias formas
de General de Tebas, velha e touro.
O próprio deus da guerra, desumano,
não viveu de amor ileso;
quis a Vênus, e foi preso
na rede, que lhe armou o deus Vulcano.

Mas sendo Amor igual para viventes,
tem mais desculpa ou menos esta chama:
amar formosos rostos acredita,
amar os feios de algum modo infama.
Quem lê que Jove amou, não lê nem topa
que amou vulgar donzela:
lê que amou a Dánae bela,
encontra que roubou a linda Europa.

Se amar uma beleza se desculpa
em quem o próprio céu e terra move,
qual é a minha glória, pois igualo
ou excedo no amor ao mesmo Jove?
Amou o pai dos deuses soberano
um semblante peregrino;
eu adoto o teu divino,
o teu divino rosto, e sou humano.


(Do livro "Marília de Dirceu").


• Poeta barroco mineiro, um dos participantes da Inconfidência Mineira

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