quarta-feira, 21 de outubro de 2009




Ilegalidade em ações “legais”

* Por Seu Pedro

Através de informações, agentes de área da Policia Militar, em Guanambi, Bahia, prenderam um jovem paulista, enquadrado no artigo 184 do Código Penal Brasileiro, “por se tratar de falsificador de óculos de sol”, justificaram. A operação policial de busca e apreensão, que causou o “flagrante”, estava resguardada por um mandado, expedido pela Justiça de São Paulo. Mas, por um detalhe; a boa intenção da justiça paulista e a empenhada ação da polícia baiana ao executar uma prisão, alardeando-a via imprensa, podem gerar um processo indenizatório contra o Estado ou os Estados. Um bom advogado que o diga! A marca “falsificada” não existe no mercado. Portanto, o máximo que o fabricante de óculos clandestino deve à Justiça é a falta de registro de firma e a conseqüente sonegação fiscal. Neste caso, o assunto é de competência da Secretaria de Fazenda do Estado da Bahia.

Uma falsificação só pode ser configurada a partir da cópia de um modelo original. Se não há de onde ser copiada a marca, não justifica a aplicação do parágrafo primeiro, do artigo 184, do Código Penal Brasileiro, que trata de violação de propriedade intelectual e que serviu de base à prisão.

A marca “Tribus”, timbrada nos cerca de quinhentos óculos apreendidos e levados para a delegacia, juntamente com dinheiro, cheques e outros bens, não consta do registro de patentes de bens industriais. “É uma marca criada por mim”, alegou o jovem no momento de sua prisão.

Quando são apreendidos CDs piratas isto não ocorre pela simples mídia, mas pelos direitos autorais do compositor e da voz do cantor ali gravada. A polícia também incorre no erro de classificar como “piratas” os CDs sem selo de gravadora ou registro, mas de fabricação direta do artista.

Estas mancadas jurídicas fazem-me lembrar de um episódio do final dos anos sessenta, envolvendo um beato, Frei Onofre Venerando de Jesus, que terminou defendido em excelente e apropriado texto de David Nasser, hoje falecido, em sua pagina na revista “O Cruzeiro”, também hoje desaparecida.

No corpo da crônica, o jornalista indagava: “por que nosso frei Onofre foi preso?” A prisão ocorreu em um trem suburbano, no Rio de Janeiro, quando Onofre, vestido de batina cinza, vendia terços e estampas de santos percorrendo os vagões. Havia um acordo firmado na justiça entre a Igreja Católica Apostólica Romana e a Igreja Católica Apostólica Brasileira, que poucos sabem de sua existência. A ICAB teve sua fundação legalmente constituída no ano de 1945, pelo ex-bispo católico romano Dom Carlos Duarte Costa, que havia sido afastado da Diocese de Botucatu, São Paulo, e colocado em resignação pelo Vaticano com título de “Bispo de Maura”.

Não existem reservas de uso de vestes. Cada um pode se vestir como bem entender, desde que não haja atentado ao pudor ou alguma inconveniência identificada, como andar fardado de soldado nazista. Havia um acordo de uso de cores, para identificação da origem do clero. Portanto Frei Onofre não incorria em nenhuma fraude ao usar batina, e principalmente cinza.

Houve falta de informação e conhecimento da policia, que infelizmente é mal preparada em conhecimentos gerais, e não recebe informação adequada da progressão e do vigor das leis, que são mutantes. David Nasser, de origem judaica, sabia perfeitamente o que é perseguição, e viu naquele episódio um rastro de perseguição no delator. Revela isto em sua escrita. Talvez por zelo em seus princípios religiosos, alguém viu a venda dos santinhos e logo chamou a polícia.

As autoridades não podem estar dando ouvidos e “tomando providências” em todos os tipos de denúncias, sem que antes se aprofundem nas leis, e nem os veículos de comunicação devem ter pressa em julgar, noticiando incorretamente os fatos, sem que os repórteres tenham um mínimo de conhecimento das leis que tratam de um assunto.

Todos são passivos de serem acionados por danos morais, o que, a princípio, não lava a honra de ninguém, pois os boatos, como sempre exemplificam, se assemelham às penas de um travesseiro: depois de lançadas ao vento não haverá que as recolha todas! E assim o mundo vai vivendo cheio de injustiças. Afinal, nem na polícia inglesa há perfeição. O mundo foi testemunha do caso do eletricista brasileiro Jean Charles de Menezes, que em uma estação do metrô de Londres foi assassinado por policiais ingleses.

* Seu Pedro é o jornalista Pedro Diedrichs, editor do jornal Vanguarda, de Guanambi, Bahia.

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