Incursões gastronômicas
* Por Mara Narciso
Melhor do que viajar, melhor do que ir a festas, ou ainda mais interessante do que comer é contar como tudo aconteceu. Milena, minha mãe, gostava de explicar em detalhes como era uma comida diferente que tinha experimentado. Nunca deixava de comer o que quer que fosse. A curiosidade gastronômica da minha mãe não chegava a ser perigosa, ou fosse algo a servir de tema para um programa no canal Discovery, ou no programa “No Limite”. As esquisitices das iguarias que comeu não chegavam perto do olho de cabra, ou de vermes vivos, longos e crus comidos numa chupada como se fossem uma sopa de macarrão, daquelas que são degustadas com avidez no refúgio do lar, mas foram estranhos algumas vezes. Já a vi comendo ostra crua, polvo, jibóia, gia, tatu peba, rodízio e buchada de bode e até “totó” de goiaba - a larva de mosca.
Para quem acha que comer jiló é uma excentricidade, deve experimentar a comida oriental. Circulou pela internet nos tempos das Olimpíadas de Pequim um mostruário do que se podia apreciar na, para nós sempre extravagante, culinária chinesa. Para alimentar o 1,3 bilhão de chineses não há preconceito em se comer carne de cachorro ou de cavalo ou de se colocar tudo que se move ou se moveu um dia num espeto ou numa gordura quente. Cozinhar ou não tudo e qualquer coisa é rotina para os cozinheiros chineses.
Os ocidentais misturam sem temor as comidas orientais e não raro restaurantes unem num mesmo cardápio comidas da China e do Japão. No Brasil os pratos chineses mais populares são o arroz chop suey, carne de vaca com broto de feijão ou de bambu, frango xadrez, rolinho primavera, e banana caramelada. Entre a comida japonesa os pratos mais conhecidos são o sushi que é o arroz cozido prensado a mão ou a máquina, e o sashimi que é qualquer alimento de origem animal sem cozimento. O chinês e japonês comem com hashi, e não com “pauzinhos”.
Na época em que comer comida japonesa em Minas era uma raridade, estive em uns poucos restaurantes japoneses em Belo Horizonte, mas não me arrisquei. Em Montes Claros, de forma tímida, vemos chegar com os forasteiros opções da comida oriental. Recentemente foi inaugurado o Miako, rede de restaurante de comida japonesa, na Avenida Mestra Fininha. E na sexta-feira, depois da faculdade, fomos para lá Marina, Felicidade, eu e Elpídio, acadêmicos e professor de Jornalismo. Meu filho, Fernando, logo se juntou a nós.
Lembrando da minha mãe, que jamais rejeitou qualquer alimento estranho, e experimentou tudo que bem preparado fosse, não me furtei a provar o salmão cru. A bandeja era uma festa de delicadeza, de arte suave e convidativa. Para bem o saborear é preciso um ritual, mas eu cometi o sacrilégio de dispensar o hashi e pedi um talher. Temerosa de como o meu estômago se comportaria, cortei com cautela um pedacinho do sashimi e o provei, levando à boca na pontinha do garfo. A aparência é agradável, a cor lembra uma flor e a textura macia é tenra ao toque dos dentes. Atentei para o sabor leve de uma fruta que comemos há tempos e não lembramos bem como é o paladar. A raiz forte, e o molho shoyu, são os complementos necessários para bem saborear o salmão, que tem a leveza de uma pétala de alguma flor exótica. O sushi é uma festa de formas e recheios, com um leve aroma de frutos do mar, e as suas cores delicadas entre pedacinhos de frutas, legumes, mariscos ou peixes, já dizem muito da propalada paciência japonesa. Mais tarde, meu filho arriscou-se no sakê, servido em dose generosa no massu, o copo quadrado.
À meia-noite fui pega de surpresa, pois meus amigos, sabedores que o dia do meu aniversário principiava, me cantaram o “parabéns pra você”. Nessa noite agradável, em boa companhia e fazendo leves experimentações gastronômicas, indago: se comemos vegetais crus, qual o problema de comermos animais crus, desde que fatiados em finas películas? Então, sem preconceito, convido aos ainda relutantes montes-clarenses a que experimentem sem medo novas fronteiras gastronômicas. Não me senti desbravando um deserto, e nem indo aonde ninguém foi, mas por que nos privar de uma experiência gustativa, principalmente na companhia de pessoas tão delicadas quanto o sashimi? O arrependimento será não arriscar.
* Médica, acadêmica do sétimo período de jornalismo e autora do livro Segurando a Hiperatividade
* Por Mara Narciso
Melhor do que viajar, melhor do que ir a festas, ou ainda mais interessante do que comer é contar como tudo aconteceu. Milena, minha mãe, gostava de explicar em detalhes como era uma comida diferente que tinha experimentado. Nunca deixava de comer o que quer que fosse. A curiosidade gastronômica da minha mãe não chegava a ser perigosa, ou fosse algo a servir de tema para um programa no canal Discovery, ou no programa “No Limite”. As esquisitices das iguarias que comeu não chegavam perto do olho de cabra, ou de vermes vivos, longos e crus comidos numa chupada como se fossem uma sopa de macarrão, daquelas que são degustadas com avidez no refúgio do lar, mas foram estranhos algumas vezes. Já a vi comendo ostra crua, polvo, jibóia, gia, tatu peba, rodízio e buchada de bode e até “totó” de goiaba - a larva de mosca.
Para quem acha que comer jiló é uma excentricidade, deve experimentar a comida oriental. Circulou pela internet nos tempos das Olimpíadas de Pequim um mostruário do que se podia apreciar na, para nós sempre extravagante, culinária chinesa. Para alimentar o 1,3 bilhão de chineses não há preconceito em se comer carne de cachorro ou de cavalo ou de se colocar tudo que se move ou se moveu um dia num espeto ou numa gordura quente. Cozinhar ou não tudo e qualquer coisa é rotina para os cozinheiros chineses.
Os ocidentais misturam sem temor as comidas orientais e não raro restaurantes unem num mesmo cardápio comidas da China e do Japão. No Brasil os pratos chineses mais populares são o arroz chop suey, carne de vaca com broto de feijão ou de bambu, frango xadrez, rolinho primavera, e banana caramelada. Entre a comida japonesa os pratos mais conhecidos são o sushi que é o arroz cozido prensado a mão ou a máquina, e o sashimi que é qualquer alimento de origem animal sem cozimento. O chinês e japonês comem com hashi, e não com “pauzinhos”.
Na época em que comer comida japonesa em Minas era uma raridade, estive em uns poucos restaurantes japoneses em Belo Horizonte, mas não me arrisquei. Em Montes Claros, de forma tímida, vemos chegar com os forasteiros opções da comida oriental. Recentemente foi inaugurado o Miako, rede de restaurante de comida japonesa, na Avenida Mestra Fininha. E na sexta-feira, depois da faculdade, fomos para lá Marina, Felicidade, eu e Elpídio, acadêmicos e professor de Jornalismo. Meu filho, Fernando, logo se juntou a nós.
Lembrando da minha mãe, que jamais rejeitou qualquer alimento estranho, e experimentou tudo que bem preparado fosse, não me furtei a provar o salmão cru. A bandeja era uma festa de delicadeza, de arte suave e convidativa. Para bem o saborear é preciso um ritual, mas eu cometi o sacrilégio de dispensar o hashi e pedi um talher. Temerosa de como o meu estômago se comportaria, cortei com cautela um pedacinho do sashimi e o provei, levando à boca na pontinha do garfo. A aparência é agradável, a cor lembra uma flor e a textura macia é tenra ao toque dos dentes. Atentei para o sabor leve de uma fruta que comemos há tempos e não lembramos bem como é o paladar. A raiz forte, e o molho shoyu, são os complementos necessários para bem saborear o salmão, que tem a leveza de uma pétala de alguma flor exótica. O sushi é uma festa de formas e recheios, com um leve aroma de frutos do mar, e as suas cores delicadas entre pedacinhos de frutas, legumes, mariscos ou peixes, já dizem muito da propalada paciência japonesa. Mais tarde, meu filho arriscou-se no sakê, servido em dose generosa no massu, o copo quadrado.
À meia-noite fui pega de surpresa, pois meus amigos, sabedores que o dia do meu aniversário principiava, me cantaram o “parabéns pra você”. Nessa noite agradável, em boa companhia e fazendo leves experimentações gastronômicas, indago: se comemos vegetais crus, qual o problema de comermos animais crus, desde que fatiados em finas películas? Então, sem preconceito, convido aos ainda relutantes montes-clarenses a que experimentem sem medo novas fronteiras gastronômicas. Não me senti desbravando um deserto, e nem indo aonde ninguém foi, mas por que nos privar de uma experiência gustativa, principalmente na companhia de pessoas tão delicadas quanto o sashimi? O arrependimento será não arriscar.
* Médica, acadêmica do sétimo período de jornalismo e autora do livro Segurando a Hiperatividade
Ah, sim, concordo: arriscar, arriscar sempre! Ótimo para o espírito e para a pele, melhor que botox. Em vez daquela cara de múmia tolinha que acabou de acordar, a expressão de contagiante curiosidade pela vida. Quem resiste? Depois, é só correr pro almoço, digo, pro abraço.
ResponderExcluirNão é por acaso que a comida é um dos engenhos da vida. Nutre também a alma, porque une e faz promover encontros pra lá de bacanas.
ResponderExcluirMara
ResponderExcluirDaniel está certo: inovar sempre!Adoro comida japonesa, e agora que fiz um curso de alimantação viva, como feijão azuki germinado, pão essênio ( c/ trigo germinado), arroz integral e suco verde, entre muitas outras coisas. Açúcar está fora do cardapio, embora, confesso, não seja fácil abdicar do açúcar.
Beijo
Risomar
Arigatô por mais este ótimo texto, Mara.
ResponderExcluirUm beijo.
Obrigada Marcelo.
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