segunda-feira, 26 de outubro de 2009




As mulheres são otárias

* Por Mara Narciso

Além de obter leitores tentando atraí-los com esse título apelativo, quero também chamar a atenção para o problema de uma mulher morando numa cidade média ou grande, quando se trata de consertar qualquer utensílio em sua casa, ou ainda o seu carro, e quem sabe receber algo que comprou e pagou, mas a firma teima em não entregar, ou ainda, entregaram, mas não vêm montar de jeito nenhum. Se hoje é ruim, muito pior era antes.

O meu carro estava com dois pontos para reparo de pintura. Um deles foi devido a uma ré no escuro, quando toquei num monte de compensado, dando um leve arranhão por baixo do pára-choque traseiro. O outro, foi quando o carro apresentou um problema e passou a noite num posto de gasolina e bateram nele com o ferro do reboque, desta vez no pára-choque dianteiro. Mas o que me levou a oficina de lanternagem foi o arranhão de um carrinho de supermercado que meu filho deixou encostar pela força da gravidade. O meu carro sendo escuro, os dois riscos curtos e o leve afundamento estavam me chateando. Então levei numa oficina que teve fama no passado, no tempo do irmão falecido, de ser o rei do martelinho de ouro. Marquei por telefone e fui fazer o orçamento no dia seguinte. Mostrei os três problemas que foram devidamente anotados e me foi dado o preço. Achei caro, e comparei com um outro serviço que tinha sido feito anteriormente. Como pagaria a vista e parte em dinheiro, com um cheque para dar entrada no dia do recebimento do serviço, recebi um desconto de 25%.

No dia combinado, levei o carro, apresentei meu tio que iria receber o serviço e viajei para um congresso. Era para estar tudo certo e pronto no dia combinado, com folga, mas quando voltei encontrei a má noticia: nada feito. Não foi entregue e para minha surpresa, quando reclamei, fui tratada com grosseria e descaso. O cheque pago – olhei no site do banco –, tinha sido descontado na boca do caixa uma semana antes do combinado-, e nada de serviço. Depois de muita chateação e de seis dias sem o carro, vou lá recebê-lo. Disseram ao telefone que poderia ir buscá-lo, mas ao chegar vi que ainda estava desmontado. Dois dos problemas combinados estavam prontos, mas o terceiro e principal não tinha sido feito. O dono da oficina me disse que não o fez por que não estava escrito na ordem de serviço. E de fato não deveria estar, pois ele agiu de má fé e não escreveu tudo o que foi definido. Ou seja, partiu do princípio que mulher é tola, e para eu ter o serviço precisava pagar a diferença. Ainda insistiu que eu deveria saber que pelo preço acertado, o serviço não seria completo. Meu tio, que estava comigo nessa hora, exasperou-se e falou que nem de graça o serviço nos serviria. Achei melhor ir embora, com o carro arranhado, mas com a intenção de colocar a boca no mundo. Não é de se admirar que a loja estivesse quase vazia. As mulheres são mais da metade da população em todos os lugares, mas alguns homens são loucos a ponto de desprezarem esse amplo público.

Ah, também ouvi dizer que fui enganada pelo fato de ter pagado antes de ver o serviço. Mas é claro! A condição para ter o desconto era pagar antes.

A cadeira-de-rodas do meu pai, de vez em quando precisa de reparos, assim vou às serralherias e mando soldar algum lugar da roda que tenha se soltado. No Bairro Major Prates há várias delas e na primeira que fui, há dois anos, o ponto de solda me custou cinco reais. Da outra, vez, já com meu filho no carro, o rapaz de outra oficina me cobrou dez reais, mas eram dois pontos de solda. Pensei ser razoável, pois era um serviço maior. Mas, poucos meses depois, estando muito aflita, atrasada e pronta para ir ao trabalho, porém, ainda precisando almoçar, fui ao mesmo local fazer serviço semelhante. Mas no caminho achei outra oficina mais perto de minha casa. Entrei e o rapaz veio buscar a cadeira. Viu o meu carro, como também a minha roupa branca. Perguntei quanto era, e ele disse ser vinte reais. Achei caro, por ser apenas um ponto de solda. Percebendo-me roubada, concordei devido à extrema pressa, e mandei fazer o serviço assim mesmo. Não demorou mais do que dois minutos, paguei e fui embora.

Poucos dias depois o meu filho queria consertar uma outra cadeira e lhe ensinei o lugar que era mais perto. Parte do encosto estava com um cano levemente aberto embaixo, próximo ao assento, e também o material que segurava esse encosto estava frágil, precisando de reforço. O serralheiro soldou a parte solta e também soldou em pelo menos cinco pontos uma haste de ferro de cada lado para reforçar a parte que, ao peso do corpo envergava para trás. O preço: R$ 10,00, na mesma oficina que estive anteriormente. O motivo? Meu filho estava de bermudas, chinelão e levava a cadeira nas costas.

O preço cobrado não depende da dificuldade do trabalho executado, mas da cara e do sexo do freguês. A norma é essa: as mulheres são bobas, e se chegaram ao lugar social que estão deve ter sido por mero acaso, pois são otárias, podendo e devendo ser enganadas.

* Médica endocrinologista, acadêmica do sétimo período de Jornalismo, e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”

4 comentários:

  1. Verdade, trapaceiam demais com as mulheres, é preciso estar sempre atenta.

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  2. Já comentei por email, mas aí vai de novo: ótimo. Que venham outros do mesmo quilate. Parabéns, Mara.

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  3. O mundo é dos homens, ainda, sim.
    O chefe quando é homem e quer impor suas ideias no trabalho, é conhecido como o bom, entende de tudo...etc e tal, mulher está de TPM, histérica, tem falta de homem e coisas do gênero.
    Uma vez trabalhei com um cara que me chamava de " menininha", na época eu estava com 24 anos,e juro, ficava chateada. O tom era " pejorativo". Engraçado que ele não chamava um homem, colega de trabalho de " menininho."
    Infelizmente o seu texto é realidade. Mulher para se colocar no mundo derruba céus e terra.
    E mesmo assim, ainda é desrespeitada. Não precisamos perder a " ternura" mas que é desgastante ter que se impor, lá isso é.
    Mulher para conseguir o que " deseja" , até diminuir o preço do serviço, tem que jogar " charme". Existe coisa mais " machista " ?????
    Muito bom e verdadeiro o texto, Mara.
    Valeu o desabafo.
    Ah sim....e o título chamou a atenção. E como !!
    Beijos

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