Transitoriedade
* Por
Núbia Araujo Nonato do Amaral
Desço
da marinete com a garganta seca, as costas cheias de nós causados
pelo desconforto. Nem me dou conta que a
tardinha caiu feito manta de vó. Ajeito os pés dentro dos
tênis novos,
uma poeira vermelha tinge o branco da lona.
Sem opção, caminho na direção da praça onde mangueiras com suas folhas vermelhas cantam sons misturados e passarinhos se recolhem em algazarra.
O sino que já não existe, substituído por um disco que o imita, convoca os fiéis pra missa das seis. As flores, amontoadas num canteiro sem jeito, se entregam aos caprichos de raparigas mimadas, algumas jazem sem vida esquecidas num banco.
O cheiro da pipoca refresca minha memória, mas o vendedor é outro. O empório deu vez a uma casa de fama duvidosa, não há mais balas coloridas e nem o Sheik se espreguiçando em cima da sacaria.
Percebo que a cada passo que dou meus olhos embaçam e a garganta dói. O que mudou? Fui eu ou a cidade? Fui eu? Ou essa bendita transitoriedade?
De repente ouço meu nome numa voz que reconheço. Corro para o seu ninho de braços pequenos, me encolho menino e mato a saudade sem dó.
*
Poetisa, contista, cronista e colunista do Literário
Coisas da infância boa e forte.
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