sexta-feira, 21 de julho de 2017

O estopim que faltava


* Por Gilberto Abrão


O que estava sendo feito às escondidas, agora é feito às escancaras. A Arábia Saudita não mais esconde o seu relacionamento amistoso com Israel. Encontros entre as altas cúpulas dos dois regimes estão sendo fotografados e publicados pela imprensa mundial. Um dos príncipes sauditas, muito conhecido no jet set internacional, declarou sem nenhum pejo, que se houver um novo ataque de Israel aos palestinos de Gaza, o regime saudita não hesitará em se posicionar a favor de Israel.

Numa análise mais aprofundada, se a Arábia Saudita está envolvida até o pescoço na Guerra da Síria, financiando e arregimentando os terroristas que para lá vão, ela está a prestar um grande benefício aos sionistas enfraquecendo o exército sírio e destruindo toda a infraestrutura do país. A Síria vai precisar de mais trinta anos, com a ajuda de países amigos, para se recuperar e voltar a ser o que era antes dessa guerra multinacional contra ela.

Por outro lado, a guerra no Iêmen liderada pela Arábia Saudita, já destruiu grande parte do país e matou centenas de milhares de civis. O motivo dessa guerra não é outro senão impedir que o Iêmen faça uma aliança com o Irã e fuja do controle saudita. Os sauditas consideram o Iêmen o seu quintal. Levando-se em conta que o Irã faz parte do eixo de resistência a Israel, juntamente com a Síria, o grupo guerrilheiro libanês Hezbollah e a resistência palestina, Israel está feliz da vida com essa guerra. Aliás, há até pilotos israelenses bombardeando Sanaa, a capital iemenita. Mas por quê? Uma coisa que os sionistas certamente não desejariam seria o domínio iraniano do Bab al Mandeb, a porta de entrada ao Mar Vermelho para os navios que saem ou entram em Israel. Portanto, Israel bate palmas para as agressões e massacres sauditas no Iêmen.

Tão feliz está Israel com o desempenho da Arábia Saudita, que, para criar ainda mais cisão no mundo muçulmano, autodenominou-se o “defensor dos sunitas” (sic). Foi uma jogada de mestre, sem dúvida. Israel explorou muito bem o ódio que os sauditas têm à República Islâmica do Irã que é xiita. O regime saudita é dominado pela seita wahabitas (o ramo radical do sunismo) que é a fonte ideológica do grupo terrorista Estado Islâmico e afins, e que considera os muçulmanos xiitas como apóstatas.

Na reunião da Liga Árabe ocorrida no dia 11 de março, a Arábia Saudita induziu os membros da liga a considerarem o Hezbollah uma organização terrorista. Com exceção da Síria (não representada), Líbano, Iraque e Argélia, os demais – inclusive a representação da Autoridade Palestina – seguiram o regime saudita. Compreende-se a razão. Todos eles estão a precisar de uma graninha e, portanto, não viram nada demais em vender suas consciências por um punhado de petrodólares. Os povos desses países, entretanto, são, na sua esmagadora maioria, contra essa resolução da Liga Árabe. Os governos, portanto, não representam a vontade dos povos.

Para gáudio de Israel, agora o regime saudita está pensando seriamente em atacar o Hezbollah no sul do Líbano, fomentando milícias sunitas dentro do país. Vai fazer o serviço sujo para Israel que não conseguiu tirar a resistência muçulmana (Hezbollah) do sul do Líbano em 2006. Entretanto, muito menos se espera dos sauditas. Eles não têm a expertise de guerra que Israel tem e muito menos o equipamento bélico de última geração que o Estado Sionista possui.  Mas pelo menos, segundo os cálculos dos israelenses, os sauditas vão manter o Hezbollah ocupado e vão desgastá-lo. Os israelenses (ou seja, “os defensores dos sunitas”, como eles se autoproclamam) estão dançando de alegria.

Mas será que o Irã e o novo aliado do Hezbollah, a Rússia, ficariam de braços cruzados? Não seria esse o estopim que faltava?



* Jornalista.

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