Uma arte em
extinção
O homem contemporâneo vive, hoje, entre
tantas contradições, uma que chama, em especial, a atenção. Este início de
milênio, caracterizado pela comunicação de massas, é igualmente o período em
que as pessoas mais se sentem solitárias. Nunca o mundo teve tanta gente como
agora. Afinal, são mais de 7,2 bilhões de seres humanos disputando o espaço de
um planeta de pequeno porte.
Em época alguma houve tantas cidades
gigantescas. São cerca de cem com mais de um milhão de habitantes. No entanto,
o homem está cada vez mais só. A saudável arte da conversação, embora encontre
ainda um ou outro grupo heróico que a pratique, está em extinção.
O filósofo Ivan Illich constatou:
"Cinqüenta anos atrás, a maior parte das palavras que um homem ouvia eram
ditas pessoalmente a ele por alguém com quem conversava". E hoje? Atualmente
este quadro é muito diferente, Ouve-se, é verdade, conversa o dia todo.
Todavia, o que é ouvido é dito à distância.
São aparelhos de rádio, receptores de
televisão, gravadores, celulares e vai por aí afora que nos enchem os ouvidos e
a cabeça. Pessoalmente, em diálogo de qualquer espécie, as palavras ditas são
minoria. Os meios de comunicação eletrônicos ditam um enervante monólogo.
Otto Lara Rezende constatou, numa de
suas crônicas: "Até um cidadão que não dispunha de um televisor, ou de um
rádio transistor, acaba sendo alvo do bombardeio de notícias que está no ar o
dia todo, todo dia. Ninguém escapa, com raras exceções, à onipresença da
notícia".
É verdade que estar bem informado é
fundamental para qualquer cidadão. Todavia, nem todo o tipo de informação veiculado
é do interesse de todos. A seleção, contudo, torna-se virtualmente impossível.
O homem contemporâneo consome, voluntária ou involuntariamente, uma overdose de
notícias, em geral desgastantes --- sobre corrupção, crise econômica,
assassinatos, seqüestros e outras aberrações sociais --- que lhe despertam
medo, ira, revolta e ressaltam, sobretudo, sua absoluta impotência.
Mesmo os que ainda reservam tempo para
um papo com amigos, entre um chopinho e outro, no fim do expediente diário ou
das aulas no colégio, não conseguem mais escapar dos temas dirigidos. E estes
são, invariavelmente, os mesmos: inflação, futebol, maledicências sobre a vida
alheia, bravatas sobre conquistas amorosas quase nunca verdadeiramente
concretizadas e outras banalidades do gênero. Tempo para tratar de assuntos
relevantes, para aprender e ensinar algo, nunca sobra.
No entanto, jamais as pessoas sentiram
tanta falta de diálogos construtivos. Ou de, pelo menos, ouvir alguém falar
sobre coisas importantes para suas vidas. Palestras, conferências, simpósios e
seminários multiplicam-se, para tratar de temas que há apenas meio século ou
menos as pessoas levantavam em conversas nas varandas de suas casas, de forma
amena e descontraída.
John Dewey constatou que "os
homens vivem em comunidade em virtude das coisas que têm em comum; e a
comunicação é o meio por que chegam a possuir coisas em comum". Só que, se
comunicar, é uma via de duas mãos. Ou seja, é um contínuo dar e receber. E é
isto que está faltando nos dias de hoje, tornando as pessoas tão solitárias e
arredias, a despeito das redes sociais. Ou... por causa delas, quem sabe.
Boa leitura.
O Editor.
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O bombardeio de más noticias nos torna dispersivos e desatentos. São em tal número, que em um minuto já nos esquecemos da maioria.
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