A inesquecível professora de amor
A décima terceira (e penúltima) mulher citada na série
“Catorze personagens femininas inesquecíveis”, organizada pelo site “Homo
Literatus” (WWW.homoliteratrus.com) é uma tal de Fraülein Elza. “Quem é
essa figura?”, perguntará, por certo, atônito, o leitor de primeira viagem,
aquele que tem um número bastante limitado de leitura em seu currículo. Não
critico quem está nessa condição. Aliás, esta é a situação da imensa maioria
das pessoas neste País que, convenhamos, não gosta muito de ler. Não, pelo
menos, como seria de se desejar.
Para estes informo que Fraülein Elza se trata de personagem
central do romance “Amar, verbo intransitivo”, do paulistano Mário de Andrade,
cuja obra mais conhecida, disparado, é “Macunaima”.. Nesse ponto, é provável
que surja outra pergunta, quando não dura crítica, voltada ao próprio título do
livro. Afinal, ele envolve uma contradição ou, mais especificamente, um erro
gramatical. Quem conhece um mínimo de gramática da língua portuguesa sabe que o
verbo amar é transitivo direto e não intransitivo. Claro que Mário de Andrade
sabia disso. E deu esse título de propósito, exatamente para chamar a atenção
dos leitores.
Mas, minha proposta, aqui, não é escrever sobre Mário de
Andrade e suas tantas peculiaridades, diria, idiossincrasias. Trata-se de uma
figura complexa e polêmica. Além de ficcionista, foi poeta, crítico literário,
musicólogo, folclorista e ensaísta. Foi um dos pioneiros da poesia moderna
brasileira com a publicação de seu livro “Pauliceia Desvairada” em 1922.
Andrade exerceu grande influência na literatura moderna do País e, como
ensaísta e estudioso — foi um pioneiro do campo da etnomusicologia — sua importância
transcendeu as fronteiras do Brasil. Para mim, seria fácil escrever sobre ele.
Este escritor é um dos quais mais tenho material, coletado, pacientemente captado
em bibliotecas e arquivos, em uma época em que eu não sabia sequer o que era
computador, quanto mais internet. Pesquisei a fundo sua vida e obra para uma
das tantas palestras que fiz, em escolas de Campinas, no caso a que proferi no
já longínquo ano de 1992, que me parece foi bem sucedida. Poderia, portanto,
sem exagero, escrever a biografia desse expoente do Modernismo no Brasil e em
vários volumes. Não é, porém, insisto,
minha proposta. Como também não é a de tratar do citado romance.
Então, por que toquei no assunto? Para abordar, especificamente,
a inesquecível Fraülein Elza, “educadora sexual” de uma família, numa época em
que só falar de sexo já era inquestionável tabu, algo para lá de inconveniente,
se não proibido. E praticá-lo, às claras, então.... nem pensar! Ela é a
personagem escolhida pelo escritor, poeta e jornalista Márwio Câmara (é Márwio
mesmo, e não Márcio), pós-graduando em Cinema e Linguagem Audiovisual pela
Universidade Estácio de Sá e pesquisador da vida e obra de Mário de Andrade. Como o leitor já sabe, por haver sido
prevenido em “n” textos anteriores, a pesquisa do site reúne catorze
especialistas em Literatura que têm que escolher apenas uma única personagem
feminina que considere inesquecível e justificar a opção.
Alguns leitores reclamam que tenho sido um tanto reticente,
ou parcimonioso, ou econômico ou algo que o valha ao comentar as protagonistas
escolhidas pelos vários convidados do site “Homo Literatus”. Ora, convenhamos,
há tanta coisa a dizer sobre cada uma delas, que para esgotar o assunto seriam
necessários 14 livros, ou mais, e ainda assim ficaria muita coisa por dizer. Se
não fosse assim, elas não seriam “inesquecíveis”, não é mesmo?
Márwio justificou assim a sua escolha: “A alma feminina
desnudada sem pudor e de modo sutilmente elegante pelas mãos do intelectual
Mário de Andrade. Fraülein Elza, é um misto de muitas mulheres em apenas uma
única. A governanta é recém-contratada pelo patriarca da família Souza Costa,
com o propósito não apenas de cuidar da manutenção da casa e das crianças. No
acordo, discretamente pré-estabelecido por Souza Costa, seria a “professora do
amor” de Carlos, seu filho mais velho, um rapazinho a quem Fraülein conduzirá
em seu florescer sexual — fazendo-o um homem”.
E Márwio diz mais: “Elza, no entanto, não é apresentada como
uma prostituta. Ao menos não no sentido pejorativo da palavra. Ela possui modos
refinados, é observadora e inteligente; e sua vocação não a torna uma mulher de
traços ou postura explicitamente erotizados, porém livre e independente. Elza é
a personificação de um projeto feminino desvinculado das utopias de sumo
conservadoras da ‘tradicional família brasileira’ — de uma ousadia com classe.
Embora Fraülein Elza seja de origem alemã, sem dúvida, é uma das personagens
mais emblemáticas, senão uma das mais importantes da literatura brasileira,
depois de Capitu. A protagonista do primeiro grande romance do modernismo
brasileiro — influenciada pela psicologia freudiana — nos ensina que Amar é um
verbo intransitivo”.
Minha abordagem da pesquisa do site “Homo Literatus” tem,
como principal objetivo (posto que não único) o de motivar o leitor que não
tenha lido os 14 livros citados (treze já comentados e o décimo quarto que
comentarei na sequência) a lê-los caso não os tenha lido e a relê-los, se já os
leu. Só assim descobrirá por que as personagens femininas destacadas são “inesquecíveis”.
Nada como a experiência pessoal, não é mesmo? Meu papel, no caso, é o de,
meramente, atuar como, digamos, “agente provocador”. Creio que pelo menos nisso
estou sendo bem-sucedido, a julgar pela quantidade de e-mails recebida
elogiando (ou criticando) estes despretensiosos textos.
Boa leitura.
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Eu gostei bastante de se autodenominar agente provocador. Este seu papel tem sido eficaz. Eu que o diga.
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