segunda-feira, 29 de junho de 2015

Dervixe


* Por Daniel Santos



Nos primeiros combates, a bravura, o entusiasmo, a certeza de superioridade. Depois, a barbárie. Soldados e prisioneiros erravam pelas estradas como mendigos de olhar ausente. Mas houve quem se salvasse.

Viviam a véspera da insânia, mas a intuição encaminhou-os ao melhor endereço: um galpão de zinco no meio da mata, onde trocava-se a angústia pelo êxtase, porque podiam ali dançar à exaustão, sem censuras.

Dançar, sim, dançar. Dançar muito, rodopiar até expulsar de si a loucura, graças à força excêntrica. Desabavam, então, esgotados e podiam chorar o alívio de tamanha purificação. E, aí, voltavam a suas casas.

Nem desertavam. Ao perceberem neles o embaciamento do olhar, sintoma da perdição,  expediam-nos. Além de inúteis para as iniqüidades da guerra, podiam contagiar os outros. Então, sobreviria a paz!

Nesse sentido, perigosos. Por isso, tomavam a estrada até darem naquele galpão que, na certa, um primeiro louco inaugurou. Alguns riram de tanta insensatez, mas salvou-se quem entrou na roda e dançou.

* Jornalista carioca. Trabalhou como repórter e redator nas sucursais de "O Estado de São Paulo" e da "Folha de São Paulo", no Rio de Janeiro, além de "O Globo". Publicou "A filha imperfeita" (poesia, 1995, Editora Arte de Ler) e "Pássaros da mesma gaiola" (contos, 2002, Editora Bruxedo). Com o romance "Ma negresse", ganhou da Biblioteca Nacional uma bolsa para obras em fase de conclusão, em 2001.

Um comentário: