segunda-feira, 5 de dezembro de 2011



De volta ao futuro

* Por Mário Prata

Meu pai é médico e tinha um laboratório de análises clínicas, lá em Lins. Na hora que ele ia almoçar eu tomava conta. Além de receber xixi e cocô da população, eu catava milho numa velha Remington que, aliás, tinha uma característica única: batia-se o acento depois da letra.
Foi ali que tudo começou. Eu tinha uns doze anos e escrevia crônicas horrorosas, preocupado com a existência de Deus ou não. Coisas daquela época. Mas, devo confessar que até hoje cato milho e, de vez em quando, penso em Deus.
Fiz 18 anos e o meu pai me deu uma Olivetti Lettera 22, apesar de olhar um pouco desconfiado para o filho que queria ser escritor. "Coisa de viado", ele devia pensar. Mas me deu a maquininha que, naquela época, era o máximo. Era quase uma "noteboox" sem memória.
Com a Lettera fui até os trinta anos. Imaginem que escrevi a novela Estúpido Cupido, inteirinha com ela, em três vias. Só a aposentei porque numa viagem de volta da Alemanha, deixaram que ela caisse no chão e ela se entortou irremediavelmente.
Foi a vez em comprar uma Corona branca, semi elétrica. Aquilo demais para mim. Dava até para corrigir até três letras erradas. Era o máximo do máximo.
Mas a minha vida mudou mesmo quando comprei uma IBM elétrica do José Márcio Penido que veio com bolinhas, cada bolinha com um tipo de letra. E uma teclinha onde eu apagava meus (muitos) erros.
Com a velha (hoje) IBM, escrevi várias novelas, roteiros de cinema e livros. Ninguém me segurava. Eu era moderno e rápido.
Mas um dia o escritor Reinaldo Moraes me convenceu a entrar no mundo dos computadores. Confesso que relutei muito. Achava que nunca iria entender aquela modernidade. Já tinha passado dos quarenta, não estava mais para tantas novidades. Mas com um lap-top, um Toshibinha 1.000, entrei na era da eletrônica. Em poucos meses fazia o diabo com aquilo. Claro que, no começo, perdi muitos arquivos, peguei alguns virus. Mas ainda tenho o Toshibinha até hoje. Cobri a Copa do Mundo e a Copa América, bravamente com ele.
Mas estava chegando a hora de ter um computador de mesa, um 486, me diziam. Parti para a aventura. Uma impressora que não tem que tirar aquelas bordinhas do lado, picotadas. Pronto, o futuro não iria me reservar mais nenhuma surpresa.
Pois agora que a coisa começou a ficar cada vez mais rápida. Já tive que passar o que era 4mb para 8mb. Depois me convenceram que tinha que passsar de 129 MB (você está me entendendo?) para 500. E o modem de 2.400 para 14.400. Tudo isso para entrar na Internet.
A essa altura eu já estava passando as minhas crônicas direto do meu computador (sem as imprimir) para o computador do Estadão. O que mais queria eu? Não precisava mais de boy e nem ter que ir até a marginal levar o meu material.
Aí chegou a Internet. Segundo a DGLNET que é a minha provedora, agora eu virei um cibernauta. Pode?, eu, um cibernauta! Para vocês terem idéia da rapidez da coisa, a palavra ainda não está no Aurélio (eletrônico, também) que eu tenho aqui, acoplado.
Tenho viajado muito nesta minha condição de cibernauta (não sou nem mais escritor, nem digitador) pelo mundo. Entro no Louvre, finjo que faço reserva num hotel de Hong-Kong, leio jornais e revistas do mundo todo, converso com desconhecidos pra lá de Bagdá, voto no Oscar, leio o outro jornal aqui na minha tela.
Depois disso tudo, o que virá? Já falam em computador onde você vai falar e ele escrever. Acho demais. Não sei se terei idade para entender o funcionamento.
Mas toda esta minha trajetória, da velha Remington cheirando a cocô anômino, até a Internet com meus amigos anônimos, foi para chegar aqui no final (estou chegando nos 4.000 bytes) e dizer o meu endereço. Pois até agora, não recebi nenhuma mensagem. Abro a caixa postal e logo vem: "sorry". É duro. Sinto-me como naquela piada: ninguém me escreve, passa um telegrama, passa em fax... Então, vamos lá. O meu email (chique, não?) é macprata@sp.dglnet.com.br. Por favor, cartas para a minha caixa. Antes que eu volte para a velha Remignton, onde não havia essas frescuras todas. A mesma máquina onde meu pai escrevia os resultados de exame de gravidez positivos. De jovens que, hoje, como eu, estão, com certeza, viajando pela Internet.

• Escritor e jornalista

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