domingo, 4 de setembro de 2011







Pessoas jurídicas não fazem sexo

* Por Rosana Hermann

Tirando o Roberto Jefferson, todos nós temos a autopreservação como instinto mais primitivo. Estamos vivos e assim queremos permanecer. Vivos, inteiros, o máximo de tempo possível. Esta é a programação default de cada ser humano.

O instinto básico de preservar a própria integridade está diretamente ligado ao segundo instinto humano, o de preservar a espécie, a programação reprodutiva, comercialmente conhecida de forma genérica por sexo. Fazemos sexo por muitas razões, mas sempre conscientes de que a concepção faz parte do jogo. E assim, entre os prazeres solitários e coletivos, vamos tocando nossas vidas de pessoas físicas.

Ao longo da vida, porém, além dos parentes, amigos, conhecidos e colegas, acabamos por conhecer outro tipo de pessoas, as jurídicas. Pessoas jurídicas não são criaturas, por assim dizer, são entidades que possuem CGC no lugar do CPF, políticas internas ao invés de princípios, departamentos ao invés de órgãos internos e ao invés de filhos, filiais.

Há pessoas jurídicas que são mais ou menos éticas, justas, ambiciosas ou corretas. A variedade é grande já que existem incontáveis ramos de atividade no mundo das empresas. Mas uma coisa é certa: pessoas jurídicas não se apaixonam, não amam e, sobretudo, não fazem sexo. Até as empresas que trabalham com artigos ligados ao sexo não se reproduzem através do contato físico. Empresas podem se fundir, fazer uma joint-venture, absorverem-se mutuamente, mas não copulam. E digo mais: as grandes corporações, aquelas pessoas jurídicas de porte internacional, não só não fazem como muitas vezes não toleram o assunto sexo.

Uma vez, trabalhei em uma empresa multinacional, daquelas que a gente demora meses para começar a compreender. Mas uma regra aprendi logo no primeiro dia: sexo era assunto proibido. A lição chegou em forma de uma ordem a ser cumprida imediatamente, a supressão de uma pequena imagem inocente desenho em que uma mulherzinha de um cartoon aparecia com os peitinhos de fora, algo como uma versão em gibi de uma miss piggy fazendo um topless. Confesso que fiquei surpresa pois jamais achei que aquilo pudesse ser ofensivo ou aviltante para alguém. Mas a regra logo se mostrou clara. Sexo, não.

Junto com o sexo vem toda uma gama de corolários proibidos como linguagem chula, palavrões, em suma, todas as coisas que o João Gordo é pago para fazer na MTV. Sim, a MTV é uma empresa cujo marketing permite muito mais liberdade sexual para seus astros e estrelas. Mas mesmo a MTV não se reproduz de forma sexuada. Para abrir uma nova filial é preciso muito mais burocracia do que hormônios. Em resumo, como nos ensina a vida profissional, onde se ganha o pão, não se come a carne. E, em alguns casos, só os vegetarianos sobrevivem.

*Rosana Hermann é Mestre em Física Nuclear pela USP de formação, escriba de profissão, humorista por vocação, blogueira por opção e, mediante pagamento, apresentadora de televisão.

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