sábado, 3 de setembro de 2011







Chegando a Salta - Argentina


* Por Urda Alice Klueger

(Excerto do livro "Viagem ao Umbigo do Mundo", publicado em 2006)

Há que registrar, também, que diante da temperatura quente, naquele dia viajávamos de camisetas, e em homenagem ao povo argentino, já que ele nascera naquele país, eu usava uma camiseta com a fotografia de Che Guevara. Pela manhã, meus amigos tinham ficado um tanto quanto desconcertados ao me verem com aquela camiseta – há que se lembrar que eram amigos criados pela cartilha do Capital. Respeitaram-me, no entanto, embora tivesse havido um ou outro comentário assim de “quem seria o argentino que prestaria atenção aquilo?” Eu lhes disse que aquilo tinha importância, sim, e de tarde, quando já começávamos a sair do Chaco e paramos num posto de gasolina, de repente vi-me rodeada por um pequeno grupo de jovens que estava por ali, e que vieram até mim atraídos pela minha camiseta. Disse-lhes que estava a homenagear o povo argentino, e eles entenderam perfeitamente, e me deram seus mais bonitos sorrisos, e apertaram a minha mão daquela forma que a ternura faz apertar. Quase 37 anos depois da sua morte, Che me unia a um grupo de jovens argentinos como irmãos que éramos. Há coisas e energias que não tem preço, no mundo. Um dia muito mais gente vai entender.



XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

A tarde já ia indo para o final quando, afinal, foi possível notar-se que começávamos a emergir da grande planície do Chaco. Pequenas elevações apareciam aqui e lá, e aos poucos a estrada começou a subir, e entramos em estradas mais largas, mais bem feitas, como se estivéssemos a sair de uma província pobre para uma província rica. A vegetação continuava teimando em ser a mesma, e mesmo quando já deveríamos ter subido uns 1.000 metros (pois a cidade para onde iríamos estava a 1.200 metros), ainda havia, bem gordona, à beira da estrada, uma árvore barriguda, daquelas que armazenam água na sua barriga.
Foi um instante aquele subir: nossas poderosas motos encararam os aclives como se eles nem existissem, e creio que não demorou quase nada, talvez meia hora, para chegarmos aos 1.200 metros e olharmos, como que de uma borda, lá embaixo, a maravilhosa e encantadora cidade de Salta. Um pouco antes de chegarmos a Salta passáramos por placas que indicavam sítios arqueológicos próximos, e eu quase morri do coração por estar passando assim sem ir vê-los – havia que pensar que a minha aventura, na ocasião, era outra, que eu estava viajando como uma APHD e que as rotas harleyras é que contavam, então. Nem podia imaginar o que veria em Salta, no dia seguinte!

E (...) chegamos em Salta, onde paramos no primeiro posto de gasolina que apareceu, para podermos nos organizar, e onde nos recebeu simpático argentino que era um verdadeiro índio vestido com roupas européias, e que acabou me dando um chaveirinho de plástico.
Acabamos indo parar todos num belíssimo hotel no centro de Salta, assim estilo art-noveau (acho – não sou brilhante em matéria de Arquitetura), onde havia dois funcionários brasileiros que ajudaram a guardar as motos e nossas demais parafernálias. Conversei com um deles, que era de Minas Gerais. Como fora parar lá naquelas lonjuras, numa cidade tão maravilhosa, e da qual eu sequer ouvira falar, até aquele dia? O motivo era o de quase sempre, quando alguém se afasta demais da sua terra: o amor! O conterrâneo mineiro fora um dia passear lá e apaixonara-se por uma salteña. Só voltara ao Brasil, desde então, para passear.
Entre simpáticos sorrisos do brasileiro, que acho que também estava contente por nos receber, acabei tomando posse do meu quarto, grande, bonito, luxuoso, mas onde fiquei só o tempo necessário para tomar um banho. Era necessário sair-se à cata da Internet.

* Escritora de Blumenau/SC, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR

Um comentário: