domingo, 3 de abril de 2011



Insatisfação sem fim


* Por Pedro J. Bondaczuk


O sucesso – já escrevi inúmeras vezes, mas faço questão de reiterar o quanto julgar oportuno – ou seja, o reconhecimento público do nosso valor pessoal ou de alguma obra que eventualmente tenhamos produzido, é, quase sempre, sumamente caprichoso. Em determinadas circunstâncias, tarda a chegar e é possível (ou provável?) que pareça que não chegará nunca. Não raro, ocorre quando não mais podemos gozar a inenarrável sensação de triunfo, ou seja, postumamente, o que é uma ironia da vida.

Mas, se o que fizermos tiver, de fato, qualidade (ou, principalmente, utilidade), se nossa realização vier a se destacar de obras semelhantes, porém inferiores em um (ou em vários) determinado detalhe, produzidas por outros, ou se for originalíssima, jamais conseguida por ninguém, o sucesso raramente deixa de acontecer. É até questão matemática, de probabilidade. É como somar um mais um: o resultado correto será sempre dois.

Destaco que a obra em questão sequer precisa ser material, ou seja, uma edificação, uma teoria, uma descoberta, um livro, uma pintura, uma sinfonia etc.etc.etc. Pode ser uma vida exemplar e sem máculas (o que é, até, muito mais raro do que um feito científico, artístico ou de qualquer outra natureza).

Para sermos bem-sucedidos, não devemos ter pressa em definir (ou em concluir) um projeto de vida que se transforme no nosso legado à posteridade. Além disso, temos que ser sumamente rigorosos com nossos atos, pensamentos e sentimentos, implacáveis até, mais críticos em relação a eles do que poderia ser nosso mais acérrimo adversário. A autocomplacência, quase sempre, tende a nos ser danosa e conduzir a equívocos irreparáveis, sem conserto ou emendas. Por causa da vaidade, portanto, podemos arruinar toda uma obra (ou uma vida) que tinha tudo para ser perfeita. Não raro o fazemos.

Não podemos perder de vista a realidade de que, duremos o quanto durarmos, não somos mais do que casuais passageiros, meros turistas neste mundo ora maravilhoso e cheio de mistérios, ora hostil e assustador. Temos que nos lembrar, sempre e sempre, se preciso todos os dias, que a qualquer momento, num piscar de olhos, podemos deixar de existir. E que, se não justificarmos, de alguma forma, nossa passagem por aqui, corremos o risco de, passados alguns anos (ou meros meses, não raro) não restar o mínimo vestígio de nós em lugar algum.

É uma possibilidade que nos dói, mas é real. Podemos (ao menos em teoria) modificar isso de alguma maneira. Claro que é irreal, por ser impossível, aspirar à imortalidade física. Mas temos condições de imortalizar a memória. Como? Mediante obras e, sobretudo, uma vida exemplar.

Queiramos ou não, começamos a morrer já a partir do nascimento. A distância do berço à tumba é curtíssima, mesmo que leve um século para ser percorrida. Quando nascemos, começa uma contagem regressiva ininterrupta, que não sabemos o quanto irá durar. Pode ter a duração de cem anos, ou pouco mais, como pode acabar na semana seguinte, no próximo dia, na próxima hora ou, quem sabe, no próximo minuto. Mesmo quando o processo é lento, reitero, é impossível de ser detido. É inexorável.

Tardamos a compreender (e alguns não compreendem nunca) que não estamos no mundo para “juntar” bugigangas, que entendemos que sejam (e denominamos de) riquezas. Nunca, em lugar algum e em circunstância nenhuma, alguém levou (e nós também não levaremos) qualquer objeto material, por mais valor que lhe emprestemos, para além-túmulo. E mesmo que levássemos... eles de nada nos serviriam.

Viemos ao mundo, pelo contrário, para “espalhar”, repartir, semear, partilhar, deixar: obras, conceitos, idéias, pensamentos e, sobretudo, exemplos. Quanto mais fizermos isso, mais perto do sucesso, como o entendo, estaremos. Nossas possibilidades de perpetuação da memória crescerão exponencialmente, embora jamais haja a mínima certeza de que isso venha, de fato, a acontecer.

O verdadeiro sucesso não é aquele comparável a um raio, em noite de tempestade. Não brilha, rapidamente, como um piscar de olhos, no céu, para depois desaparecer. A este tipo de êxito, eventual e fugaz, costumo denominar de “brilhareco”. O sucesso que importa é como os raios do sol. É como o brilho das estrelas. Supera o tempo, as eras, as gerações e o esquecimento. Não se ofusca jamais, não, pelo menos, enquanto existir o universo. É este o sucesso que aspiro, mesmo que minhas chances sejam remotíssimas, ínfimas, quase nulas, não mais do que mera possibilidade estatística. Daí cultivar essa minha insatisfação sem fim...


* Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk

Um comentário:

  1. Reparo no seu desabafo, mais desencanto que esperança. Você não se cansa de desejar, mas ainda assim parece cansado de esperar. Dizem que quem pensa grande será grande. Sonhar alto eleva o espírito, mas ao mesmo tempo tem o alto preço de uma frustração maior. Pelos padrões medianos você já fez muito mais do que muitos desejam, mesmo para a sua ideia de sucesso. Palavra alguma terá o poder de reconfortá-lo. Então, não desista.

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