quarta-feira, 13 de abril de 2011



A cólera divina


* Por Adélia Prado


Quando fui ferida,

por Deus, pelo Diabo, ou por mim mesma,

- ainda não sei -

percebi que não morrera, após três dias,

ao rever pardais

e moitinhas de trevo.

Quando era jovem,

só estes passarinhos,

estas folhinhas bastavam

para eu cantar louvores,

dedicar óperas ao Rei.

Mas um cachorro batido

demora um pouco a latir,

a festejar seu dono

- ele, um bicho que não é gente -

tanto mais eu que posso perguntar

Por que razão me bates?

Por isso, apesar dos pardais e das reviçosas folhinhas

uma tênue sombra ainda cobre meu espírito.

Quem me feriu perdoe-me.

* Adélia Prado é uma das principais poetisas brasileiras da atualidade, autora de vários livros de sucesso.


Nenhum comentário:

Postar um comentário