“Hi”
* Por Adelcir Oliveira
Eu retornava. Era a minha segunda vez ali. A rádio estava sintonizada em uma estação erudita. Tocava música clássica. Sentei-me na única cadeira de plástico que havia, até que fui orientado a subir a escada em frente e me acomodar na sala de espera. Havia revistas e livros. Publicações em português e japonês. Sentei no sofá que era muito confortável. Um descendente de orientais estava no mesmo ambiente que eu, mas não nos cumprimentamos. Calculei que teria que esperar a minha vez e que ela demoraria a chegar, o que me aborreceu um pouco. Mas mal cheguei a folhear uma revista e o barbeiro apareceu e chamou um de nós dois. Nem fiz menção em me levantar, posto que o rapaz oriental chegara primeiro que eu. O barbeiro, que mal falava o português, apontou para mim, balbuciando qualquer coisa, indicando que iria me atender prontamente. Achei fantástico. A minha ansiedade fora saciada com a devida brevidade. Desci a escada e sentei-me na poltrona de frente ao espelho.
Eu ainda não sabia o nome do salão e não seria naquele dia que esse detalhe seria resolvido, embora eu pouco me importe com isto. A preparação para o corte de cabelo seguiu o mesmo ritual de sempre. Toalhas úmidas e quentes. Toalha seca. Um avental azul. E antes disto o convite gentil para me sentar.
De repente, o barbeiro ficou vacilante. O corte já havia se iniciado. As pontas dos cabelos na parte de cima já tinham sido subtraídas. Na dança da tesoura de lâminas afiadas, a vez agora seria do cabelo na parte de trás e dos lados da cabeça. Quando foi cortar atrás, o barbeiro titubeou. Resmungou. Ensaiou cortar. Mostrou-se indeciso, até indignado. E aí tomou a iniciativa. Meu cabelo estava com creme e precisava ser lavado, o que fez com o ritual inicial de toalhas e avental fosse em vão. Era voltar para o início de tudo. Ele parece-me frustrado com seu “erro”. Era experiência acumulada, pensei comigo. Mais uma lição em mais um corte.
Dirigi-me ao lavatório. Esta é a parte mais simples do salão, que de luxo não tem nada. Na verdade, ele é sóbrio e muito limpo, além de bem iluminado. É um lugar muito agradável e guarda consigo alguma beleza. E se destaca na qualidade do atendimento. Este é seu maior detalhe. Sentei-me de frente para a pia e curvei-me adiante para que meu cabelo fosse lavado. Não era muito confortável, mas nada que me desagradasse. Pelo contrário, gostava da novidade.
Agora, sim. Cabelos lavados para que a tesoura voltasse a dançar. A toalha seca foi novamente colocada no pescoço. A música clássica seguia soberana. Ao meu lado, outro cliente. Um senhor japonês, cuidadosamente atendido pela mulher oriental que me abriu a porta do salão naquela tarde de sábado. Dia em que bati melancolicamente o cartão de ponto para nada fazer.
Ao final do corte, o barbeiro, que aparenta uns cinqüenta anos, perguntou-me se eu queria que ele passasse creme em meus cabelos. Recusei a oferta para talvez enfatizar minha satisfação com o serviço prestado, dizendo que estava bom daquele modo. Levantei-me e antes de pagar confirmei o valor de vinte e cinco reais. Recebi o troco e fui gentilmente direcionado à porta de saída, que é por onde se entra também. A última palavra que ouvi foi “hi”.
• Jornalista
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