sexta-feira, 15 de abril de 2011


Fontes da vida


“O amor, o trabalho e o conhecimento são as fontes de nossa vida”. Quem fez essa declaração, que à primeira vista parece tão óbvia, foi, ninguém mais, ninguém menos que o renomado psiquiatra e psicanalista Wilhelm Reich. Isso (e o acréscimo é meu), em condições ideais.

Nem sempre e nem com todo o mundo as coisas são assim. Relaciona-se, por exemplo, o amor à origem da vida. Seria, no entanto, condição “sine qua non”? Convenhamos, que para a função reprodutiva, nem sempre esse ingrediente está presente. Para esse efeito não é indispensável. Basta macho e fêmea copularem e pronto. Ambos podem não sentir nada um pelo outro, a não ser intenso desejo sexual, que pode até ser momentâneo e fugaz, podem até mesmo se odiar, mas ainda assim, satisfeitas determinadas condições biológicas, a mulher engravide.

Quantas e quantas e quantas pessoas não são geradas nestas circunstâncias? Muitas! Muitíssimas! A reprodução, porém, é associada via de regra ao amor, nem sempre existente para mero efeito reprodutivo. Claro que o ideal seria que o ato sexual, que não é encarado com o devido respeito e responsabilidade, só ocorresse com casais que, de fato, se amassem. Em boa parte dos casos (na maioria?), não é o que ocorre. Do ideal para o real, portanto, vai uma distância como a da Terra aos confins do Universo, que o homem, de fato, não sabe com certeza onde está.

Quanto ao trabalho, ele é importantíssimo. Desde que (e sempre há uma condição no caminho), seja voluntário, espontâneo e criativo e não se trate de mera obrigação enfadonha, quando não insalubre, arriscada e perigos e não seja meio para se obter os recursos financeiros indispensáveis para assegurar a sobrevivência própria e da família e que muitas vezes mais parece escravidão disfarçada. Nessas circunstâncias, óbvio, perde sua nobreza. Presta-se, sobretudo, à vileza da exploração do homem pelo homem, que sempre existiu e, desgraçadamente, continua a haver.

A terceira vertente, a do conhecimento, é capaz de resgatar as outras duas. Apenas as pessoas cultas e, sobretudo, sábias (já que cultura e sabedoria não são, necessariamente, sinônimas) têm consciência do que é o amor de fato e qual é o tipo de trabalho que engrandece e enobrece o homem. Reich complementa sua observação dizendo que as “fontes da vida”, ou seja, amor, trabalho e conhecimento, “deveriam também governá-la”.

Antes governassem. Mas os autênticos e não (utilizando um termo popularizado na internet), seus “fakes”, ou seja seus simulacros, suas imitações baratas e mal-acabadas, suas falsificações. Pode parecer heresia, mas ouso afirmar que o amor, o genuíno, o irrestrito, o absoluto, que envolve coração, corpo e alma e é forte o suficiente para resistir aos tornados, furacões, terremotos e tsunamis da vida, é “produto” em falta. E isso ocorre não é de hoje, mas desde o princípio dos tempos.

Notem que não afirmei que não exista. Existe, sim, e felizmente. Caso não houvesse... ai, ai, ai, seria o caos! As relações humanas, já de per si deterioradas, seriam ainda piores, mais violentas, mais horrorosas, mais sangrentas, mais selvagens e perversas do que já são ( e não em pequena medida).

Boa parte das pessoas ama, de fato, o “conceito” de amor, mas não o sente. Ama o próprio umbigo. “Acha” que ama a quem lhe sirva e atenda aos caprichos e necessidades, enquanto esse serviço e atendimento existirem. Quando, por alguma razão, não mais existem... O que se classificava de amor, em três tempos se transforma em desprezo, em indiferença e não raro, em ódio.

E por que trago esse tema à baila? Por que amor e desamor, ideal e real, trabalho voluntário e criativo ou escravidão disfarçada por uma carteira profissional e outras tantas questões correlatas, são, de uma forma ou de outra, a matéria-prima por excelência do nosso “metier”: a literatura. Raramente, no entanto, paramos para pensar madura e seriamente nelas, mesmo abundando exemplos ao nosso redor, quando não conosco, em nossa vida da sua ausência e de suas distorções...

Uma sociedade ideal, aquela primorosíssima utopia do mais sonhador dos idealistas, seria (e é) impossível sem estes três ingredientes, amor, trabalho e conhecimento. Mas os autênticos, reitero, e não seus “fakes” ou simulacros. O mundo apenas se tornará o Paraíso idealizado por tantos, há tanto tempo, quando esses três elementos governarem a vida de todos. Convenhamos, não há sequer o mais leve esboço, o mais deformado arremedo dessa situação ideal.

Os poetas (ah, os poetas!), comparam o amor, principalmente o frustrado e o não correspondido, a uma “doença”. Consideram-no, todavia, caso ou tão logo ocorra a sonhada correspondência, a “cura”, não só desse mal, mas de todos os males do mundo. Exemplo? Este belíssimo poema do poeta maranhense Luís Augusto Cassas, intitulado “Doença & cura”, com o qual encerro estas descompromissadas reflexões:

“Amor –

minha avenca

minha crença

minha dança

minha doença

e minha luxúria

tu que és

minha tulipa

minha derrota

e minha loucura

sê também

a minha cura”


Boa leitura.


O Editor.


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Um comentário:

  1. Conheci, conheço e espero que ainda conhecerei mais amor deste tamanho. Quero o amor escravizante dos poetas. Este sim, vale a pena sentir. Qualquer outra coisa é pouco demais!

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