sábado, 12 de março de 2011


A “velha louca”

A memória é uma velha louca que joga comida fora e guardar trapos coloridos”. Esta é a definição (pitoresca), nada científica, dada pelo professor irlandês (da Irlanda do Sul), Austin O’Malley, dessa capacidade humana (não posso garantir que não seja, também, a de todos os animais) de adquirir, armazenar e evocar informações, ou seja, lembranças.
Os tais politicamente corretos devem estar torcendo o nariz. Por que? Porque O’Malley usou a expressão “velha louca”, que eles entendem ser preconceituosa em relação aos idosos. “Bushit”, diria o norte-americano. Besteira, enorme besteira!, exclamo, da minha parte.
Aliás, os tais que se propõem a fiscalizar o que é politicamente correto são, com sua atitude antipática e enjoada, exatamente o oposto do que acham que são. Quem, afinal, lhes conferiu a prerrogativa, ou mais, o direito de serem árbitros do comportamento alheio? Certamente ninguém! Esse seu constante (e chato) patrulhamento, portanto, é o suprassumo da incorreção.
O’Malley fez, apenas, uma metáfora que, convenhamos, é bastante original. Exótica? Que seja! Ele também sempre se mostrou um tanto exótico. Seu nome, na Irlanda do Sul (cujo nome oficial é Eire), está ligado a uma controvérsia contratual com seu clube, já que além de professor, foi jogador profissional de futebol. Mas isso não vem ao caso. Você pode ler, internet afora, várias de suas citações, todas, digamos, meio que fora do esquadro. Vocês precisariam ler, por exemplo, o que disse sobre política e políticos. Mas... deixa pra lá. Ele não é o tema dessas considerações e muito menos suas curiosas metáforas (a não ser a da abertura destas reflexões).
Diria que O’Malley lembra, em suas declarações, um conterrâneo ilustre (muito mais famoso do que ele por sinal), o escritor e dramaturgo George Bernard Shaw, ganhador de um Prêmio Nobel de Literatura. Essa comparação, convenhamos, chega, até, a ser covardia. Talvez fosse mais equilibrada se o comparássemos a outro irlandês ilustre, James Joyce, autor do criptográfico romance “Ulysses”, que poucos leram, menos pessoas ainda entenderam, mas que o tornou célebre ao redor do mundo.
A definição, diria científica, de memória é a que colhi na enciclopédia eletrônica Wikipédia: “a capacidade de adquirir (aquisição), armazenar (consolidação) e recuperar (evocar) informações disponíveis, seja no cérebro (memória biológica) seja externamente em dispositivos artificiais (memória artificial”. Gostaram? Prefiro a de O’Malley.
A Wikipédia acrescenta, a título de complemento: “A memória focaliza coisas específicas, requer grande quantidade de energia mental e deteriora-se com a idade. É um processo que conecta pedaços de memória e conhecimentos a fim de gerar novas idéias, ajudando a tomar decisões diárias”. A ciência que estuda esse complexo processo é a Neurociência, que engloba três tipos de profissionais: psiquiatras, psicólogos e neurologistas. Tudo isso para entender essa “velha louca, que joga comida fora e guarda trapos coloridos”.
Observo (posto que sem base em nenhuma teoria científica, mas da mera observação), que nem sempre a memória se degrada com a idade. Ouso dizer que, em alguns casos (em pessoas especiais), torna-se até mais aguda, precisa, afiada e rápida. Conheço indivíduos (muitos dos quais do meu círculo de amizades), com mais de oitenta anos, que fariam inveja ao CPU de qualquer supercomputador. Lembram coisas do “arco da velha” que, confrontadas com arquivos, se revelam de precisão milimétrica.
Claro que, na maioria das pessoas, a idade, de fato, degrada a memória. E nem me refiro às portadoras de determinadas doenças e muito menos aos extremos, entre os quais destaco a senilidade. Voltando à definição da Wikipédia, acho interessante acrescentar esta informação: “Psicólogos distinguem dois tipos de memória declarativa (a que pode ser declarada e que retém fatos, nomes, acontecimentos etc.): a memória episódica e a memória semântica. São instâncias da memória episódica as lembranças de acontecimentos específicos. São instâncias da memória semântica as lembranças de aspectos gerais”.
Há vários motivos de ordem médica que podem “avariar” esse nosso importante sistema de lembranças e levar uma pessoa à sua perda total. Esses problemas podem ser sanados (em alguns casos), com o devido tratamento como podem, também, ser irreversíveis. Aí a coisa se torna trágica, sem dúvida. Imagine-se totalmente desmemoriado. Não dá sequer para imaginar, na o é mesmo?
Alguns problemas que tendem a afetar parcial ou totalmente a memória são: reação adversa a determinados medicamentos, depressão, desidratação (quem diria!), não ingestão de alimentos saudáveis suficientes ou ter poucas vitaminas e sais minerais no organismo; pequenas lesões na cabeça, problemas de tiróide e vai por aí afora. Bom, vou parar por aqui. Até porque, sou escritor e, embora apaixonado por medicina, não sou, propriamente, alguém versado na matéria. Por estas e outras é que fico, no final das contas, com a definição de Austin O’Malley com que iniciei esta insólita reflexão (para desgosto dos adeptos do politicamente correto): “A memória é uma velha louca que joga comida fora e guardar trapos coloridos”. E não é?!

Boa leitura.

O Editor.

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Um comentário:

  1. Envelhecer é triste, perder a memória é trágico, e ainda pior é ser desconsiderado por ser velho e desmemoriado, mesmo quando ainda se esteja lúcido.

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