A agenda está lotada para você, só para você
* Por Mara Narciso
Ninguém aguenta mais essa conversa de alimentação saudável, mexa-se, e qualidade de vida. As palavras se esvaziaram de tanta repetição. A desculpa de falta de tempo, como resposta obrigatória também se esgotou. Melhor inventar algo novo.
Nem sempre é possível fugir das obviedades e frases previsíveis. Como não escrever um lugar-comum se não há nada diferente na cabeça? Ser inventivo e minimamente criativo é uma necessidade, mas onde estão as boas ideias? Pode-se querer mudar de vida, criar uma nova existência, mudar-se para uma nova rotina ou para a falta dela. Alguns podem imaginar-se noutra cidade ou país convivendo com outras pessoas, outros hábitos, maneiras e vivências. Acontecem extremos de gente que se auto-exila, foge de casa, vai comprar fósforos e jamais volta.
Os jovens dizem aos pais, e mais frequentemente às mães, que vão fugir de casa, e as mães, nos momentos de desespero também falam em sumir. Muitos já falaram ou ouviram isso. Há os que realmente cometem a loucura do desaparecimento de si e das suas famílias. Estão cansados da vida de opressão que levam. Algumas das quais criadas por eles mesmos, e então, a saída é o sumiço, ou o sumiço é a saída.
Mudar de vida pode ser acrescentar outra pessoa nela, passar a fazer parte de um grupo, revitalizar uma amizade antiga, frequentar novos rumos e lugares. Aos ruminadores de que a vida é péssima, a construção de outra vida, ainda nesse mundo, pode ser uma boa alternativa, ocasião em que passa a ter um existir diferente.
Num sonolento fim de tarde de domingo, naquele momento em que a folga está terminando, as obrigações maiores se avizinham, e a monotonia e falta de perspectiva somam-se ao tédio, pode-se querer conhecer gente nova, incrementar a existência com novas convivências e hábitos. É possível que a pessoa queira resgatar um relacionamento de amizade antes superficial e aprofundá-lo, construir vínculos mais profundos e duradouros, fazer uma visita à casa do amigo, largando a “amizade de boteco”, tão frágil e algumas vezes falsa, para substituí-la por outra. Nem sempre se consegue fazer isso.
O indivíduo que procura amigos telefona, quer marcar alguma coisa e recebe uma desculpa, tenta noutro dia e a pessoa nem atende ao telefone. Deixa recado e não tem retorno. Então, a futura grande amizade torna-se impossível e precisa ser engavetada. Passa ao número dois da lista e pode acontecer nova frustração.
Quase ninguém tem tempo para o outro, estando ocupado com seus importantes feitos, e olhando para si e mais nada. Nem gente da própria família tem vontade ou interesse em ouvir. Pode ser considerado um afortunado alguém que, tendo um problema, encontra uma pessoa para ouvi-lo, para aconselhá-lo, apoiá-lo ou condená-lo num ato ou fato feitos ou acontecidos.
Há pessoas que, de tanto não serem levadas a sério, espantam-se quando um amigo resolve prestar atenção, considera o que diz, ouve, concorda e discorda com algumas considerações, já que desprezar é tão normal.
As amizades desfeitas ou os casos amorosos, quando a pessoa sente não caber mais na vida do amado, sair sem faniquitos, sem choros, com dores e bandeiras recolhidas pode ser a única alternativa. Receber o veredicto de agenda lotada é saber-se desdenhado, sem contar quanto é humilhante ficar à espera de uma visita, telefonema, e-mail, scrap, ou torpedo que não vem.
Dormir embrulhado na própria desimportância é instrutivo, dói, sangra. E algumas vezes para sempre.
* Por Mara Narciso
Ninguém aguenta mais essa conversa de alimentação saudável, mexa-se, e qualidade de vida. As palavras se esvaziaram de tanta repetição. A desculpa de falta de tempo, como resposta obrigatória também se esgotou. Melhor inventar algo novo.
Nem sempre é possível fugir das obviedades e frases previsíveis. Como não escrever um lugar-comum se não há nada diferente na cabeça? Ser inventivo e minimamente criativo é uma necessidade, mas onde estão as boas ideias? Pode-se querer mudar de vida, criar uma nova existência, mudar-se para uma nova rotina ou para a falta dela. Alguns podem imaginar-se noutra cidade ou país convivendo com outras pessoas, outros hábitos, maneiras e vivências. Acontecem extremos de gente que se auto-exila, foge de casa, vai comprar fósforos e jamais volta.
Os jovens dizem aos pais, e mais frequentemente às mães, que vão fugir de casa, e as mães, nos momentos de desespero também falam em sumir. Muitos já falaram ou ouviram isso. Há os que realmente cometem a loucura do desaparecimento de si e das suas famílias. Estão cansados da vida de opressão que levam. Algumas das quais criadas por eles mesmos, e então, a saída é o sumiço, ou o sumiço é a saída.
Mudar de vida pode ser acrescentar outra pessoa nela, passar a fazer parte de um grupo, revitalizar uma amizade antiga, frequentar novos rumos e lugares. Aos ruminadores de que a vida é péssima, a construção de outra vida, ainda nesse mundo, pode ser uma boa alternativa, ocasião em que passa a ter um existir diferente.
Num sonolento fim de tarde de domingo, naquele momento em que a folga está terminando, as obrigações maiores se avizinham, e a monotonia e falta de perspectiva somam-se ao tédio, pode-se querer conhecer gente nova, incrementar a existência com novas convivências e hábitos. É possível que a pessoa queira resgatar um relacionamento de amizade antes superficial e aprofundá-lo, construir vínculos mais profundos e duradouros, fazer uma visita à casa do amigo, largando a “amizade de boteco”, tão frágil e algumas vezes falsa, para substituí-la por outra. Nem sempre se consegue fazer isso.
O indivíduo que procura amigos telefona, quer marcar alguma coisa e recebe uma desculpa, tenta noutro dia e a pessoa nem atende ao telefone. Deixa recado e não tem retorno. Então, a futura grande amizade torna-se impossível e precisa ser engavetada. Passa ao número dois da lista e pode acontecer nova frustração.
Quase ninguém tem tempo para o outro, estando ocupado com seus importantes feitos, e olhando para si e mais nada. Nem gente da própria família tem vontade ou interesse em ouvir. Pode ser considerado um afortunado alguém que, tendo um problema, encontra uma pessoa para ouvi-lo, para aconselhá-lo, apoiá-lo ou condená-lo num ato ou fato feitos ou acontecidos.
Há pessoas que, de tanto não serem levadas a sério, espantam-se quando um amigo resolve prestar atenção, considera o que diz, ouve, concorda e discorda com algumas considerações, já que desprezar é tão normal.
As amizades desfeitas ou os casos amorosos, quando a pessoa sente não caber mais na vida do amado, sair sem faniquitos, sem choros, com dores e bandeiras recolhidas pode ser a única alternativa. Receber o veredicto de agenda lotada é saber-se desdenhado, sem contar quanto é humilhante ficar à espera de uma visita, telefonema, e-mail, scrap, ou torpedo que não vem.
Dormir embrulhado na própria desimportância é instrutivo, dói, sangra. E algumas vezes para sempre.
* Médica, jornalista e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”.
O argumento do seu texto me lembra aquela música do Paulinho da Viola. Não me recordo agora o título, mas você deve conhecer. Sábias e oportunas palavras, Mara. Que a ninguém falte tempo para lê-las. Um abraço.
ResponderExcluirExcelente texto, Mara! O tempo é escasso e as obrigações são muitas, mas quem quer de verdade arranja espaço para acolher alguém. E quem não suporta mais viver de determinada maneira busca soluções para mudar, a não ser que esteja completamente desnorteado. Abraço!
ResponderExcluirAs mudanças podem acontecer, mesmo que esteja ao lado
ResponderExcluirda mesma pessoa durante vinte e quatro anos...
Nas minhas revoluções meus "Quixotes" estão sempre
ao meu lado.
Abraços
Mara,
ResponderExcluirSabe que ADOREI seu texto....
Concordo com a Sayonara.
Quem quer, arruma tempo para o outro.
Sempre existe um lugar na agenda para
as pessoas especiais....
Beijos
Marcelo, Sayonara, Núbia e Celamar, todos nós sabemos como é duro ser descartado, ainda mais por gente que finge não ter tempo para nada, mas que não tem tempo só para a gente. Obrigada pelos comentários.
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