Vigor das línguas
O povo é quem faz a língua, seja qual for o idioma a que venhamos a nos referir, para desespero e inveja dos letrados, dos eruditos, dos doutos e sisudos guardiões do conhecimento e do saber. É ele que nomeia, de maneira clara, viva e simples, o concreto e o abstrato e cria verbos de originalidade sem par, nascidos espontaneamente, das suas necessidades de comunicação no cotidiano.
Tanto isso é verdade que, por exemplo, o português que falamos (e que tanto admiro e amo por seus recursos e sua expressividade) originou-se do latim vulgar, o falado pela soldadesca, pelos escravos e pela plebe de Roma e não do utilizado por seus poetas, filósofos e oradores. E não somente nosso idioma teve essa origem plebéia, no modo de se expressar do povo simples e rude, como seus “irmãos”, o francês, o espanhol, o italiano e o romeno, também tiveram.
Aos eruditos restaram os campos da filosofia, da psicologia, da psiquiatria, da sociologia, da antropologia e tantos outros, eivados de jargões, compreensíveis apenas aos iniciados, que criaram, criam e continuarão criando em profusão. Ler textos dessas especialidades, sem um dicionário à mão, é o mesmo que tentar decifrar o sânscrito sem nenhuma noção a respeito ou procurar entender, sem o ínfimo conhecimento do idioma, páginas escritas em japonês, árabe ou chinês. São impenetráveis, herméticos, criptografados, como se escritos de propósito para serem entendidos por pouquíssimas pessoas. É provável que o sejam, sabe-se lá.
Sempre que o povo cria uma nova gíria, alguma maneira diferente e pitoresca de identificar determinado objeto, conceito ou ação, a reação inicial dos gramáticos é a de horror. É a de torcer o nariz e determinar o veto imediato, a liminar proibição, a peremptória interdição daquela palavra ou expressão.
Os professores apressam-se em segui-los e corrigem seus alunos que as utilizem. Consideram errado seu emprego, por exemplo, em provas, o que influencia nas notas que atribuem aos pupilos e, muitas vezes, os reprovam por isso, fazendo com que percam um ano inteiro de esforços.
Mas a força do povo é maior, muito maior do que ele próprio possa sequer suspeitar (os poderosos de plantão sabem seu alcance e, por isso, esmeram-se em táticas de manipulação, para impedir que as multidões amorfas se unam em torno de alguma liderança carismática). A constância do uso popular consagra o que foi antes vetado pelos gramáticos e, quase sempre a contragosto, estes têm que se dar por vencidos e acrescentar, o que repudiaram com tamanho ímpeto e vigor, aos dicionários e à semântica.
Note-se que não é o povo que cria expressões ridículas e desnecessárias que, estas sim, conspurcam e avacalham o idioma. Nunca vi, por exemplo, nenhum gari, ou pedreiro, ou faxineiro etc. utilizar o horrendo “a nível de”, que até recentemente circulava na boca de ministros, secretários de Estado e pesquisadores com vasta coleção de diplomas, sempre que tentavam explicar o que quer que fosse.
Verbos como “alavancar”, “otimizar” e tantas outras excrescências vocabulares são comuns nos setores de comunicação das empresas e corporações, mas nunca na boca dos seus operários. Claro que essas “expressões da moda” não pegam, e jamais serão incorporadas a nenhum dicionário, pois não emergem das camadas populares, as verdadeiras artífices dos idiomas. Não tardam a cair em desuso, substituídas que são por outras tantas asneiras de igual teor.
O Prêmio Nobel de Literatura de 1921,. Anatole France, escreveu a respeito: “O povo faz bem às línguas. Fá-las imaginosas e claras, vivas e expressivas. Se fossem os sábios a fazê-las, elas seriam baças e pesadas”. Vocês já pensaram se, em nosso cotidiano, no bate-papo informal com os amigos no fim de tarde, por exemplo, ou no namoro, na boate, no campo de futebol, no pátio das escolas nos horários de recreio etc. usássemos a linguagem pesada e baça dos eruditos?!
As conversas seriam, certamente, de uma chatice abissal. Consagraríamos bobagens, risíveis e dispensáveis, como o “a nível de” (que não suporto sequer mencionar, mesmo que para a ridicularizar), e os tais “alavancar”, “otimizar” e quejandos, como o suprassumo da perfeição em termos de comunicação. Não, não e não! Nem pensar! Prefiro a ação do povão, revigorando, oxigenando, clareando, vivificando e destacando a selvagem beleza desta “última flor do Lácio, inculta e bela...”
O povo é quem faz a língua, seja qual for o idioma a que venhamos a nos referir, para desespero e inveja dos letrados, dos eruditos, dos doutos e sisudos guardiões do conhecimento e do saber. É ele que nomeia, de maneira clara, viva e simples, o concreto e o abstrato e cria verbos de originalidade sem par, nascidos espontaneamente, das suas necessidades de comunicação no cotidiano.
Tanto isso é verdade que, por exemplo, o português que falamos (e que tanto admiro e amo por seus recursos e sua expressividade) originou-se do latim vulgar, o falado pela soldadesca, pelos escravos e pela plebe de Roma e não do utilizado por seus poetas, filósofos e oradores. E não somente nosso idioma teve essa origem plebéia, no modo de se expressar do povo simples e rude, como seus “irmãos”, o francês, o espanhol, o italiano e o romeno, também tiveram.
Aos eruditos restaram os campos da filosofia, da psicologia, da psiquiatria, da sociologia, da antropologia e tantos outros, eivados de jargões, compreensíveis apenas aos iniciados, que criaram, criam e continuarão criando em profusão. Ler textos dessas especialidades, sem um dicionário à mão, é o mesmo que tentar decifrar o sânscrito sem nenhuma noção a respeito ou procurar entender, sem o ínfimo conhecimento do idioma, páginas escritas em japonês, árabe ou chinês. São impenetráveis, herméticos, criptografados, como se escritos de propósito para serem entendidos por pouquíssimas pessoas. É provável que o sejam, sabe-se lá.
Sempre que o povo cria uma nova gíria, alguma maneira diferente e pitoresca de identificar determinado objeto, conceito ou ação, a reação inicial dos gramáticos é a de horror. É a de torcer o nariz e determinar o veto imediato, a liminar proibição, a peremptória interdição daquela palavra ou expressão.
Os professores apressam-se em segui-los e corrigem seus alunos que as utilizem. Consideram errado seu emprego, por exemplo, em provas, o que influencia nas notas que atribuem aos pupilos e, muitas vezes, os reprovam por isso, fazendo com que percam um ano inteiro de esforços.
Mas a força do povo é maior, muito maior do que ele próprio possa sequer suspeitar (os poderosos de plantão sabem seu alcance e, por isso, esmeram-se em táticas de manipulação, para impedir que as multidões amorfas se unam em torno de alguma liderança carismática). A constância do uso popular consagra o que foi antes vetado pelos gramáticos e, quase sempre a contragosto, estes têm que se dar por vencidos e acrescentar, o que repudiaram com tamanho ímpeto e vigor, aos dicionários e à semântica.
Note-se que não é o povo que cria expressões ridículas e desnecessárias que, estas sim, conspurcam e avacalham o idioma. Nunca vi, por exemplo, nenhum gari, ou pedreiro, ou faxineiro etc. utilizar o horrendo “a nível de”, que até recentemente circulava na boca de ministros, secretários de Estado e pesquisadores com vasta coleção de diplomas, sempre que tentavam explicar o que quer que fosse.
Verbos como “alavancar”, “otimizar” e tantas outras excrescências vocabulares são comuns nos setores de comunicação das empresas e corporações, mas nunca na boca dos seus operários. Claro que essas “expressões da moda” não pegam, e jamais serão incorporadas a nenhum dicionário, pois não emergem das camadas populares, as verdadeiras artífices dos idiomas. Não tardam a cair em desuso, substituídas que são por outras tantas asneiras de igual teor.
O Prêmio Nobel de Literatura de 1921,. Anatole France, escreveu a respeito: “O povo faz bem às línguas. Fá-las imaginosas e claras, vivas e expressivas. Se fossem os sábios a fazê-las, elas seriam baças e pesadas”. Vocês já pensaram se, em nosso cotidiano, no bate-papo informal com os amigos no fim de tarde, por exemplo, ou no namoro, na boate, no campo de futebol, no pátio das escolas nos horários de recreio etc. usássemos a linguagem pesada e baça dos eruditos?!
As conversas seriam, certamente, de uma chatice abissal. Consagraríamos bobagens, risíveis e dispensáveis, como o “a nível de” (que não suporto sequer mencionar, mesmo que para a ridicularizar), e os tais “alavancar”, “otimizar” e quejandos, como o suprassumo da perfeição em termos de comunicação. Não, não e não! Nem pensar! Prefiro a ação do povão, revigorando, oxigenando, clareando, vivificando e destacando a selvagem beleza desta “última flor do Lácio, inculta e bela...”
Boa leitura.
O Editor.
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Quando essas palavras, tão bem classificadas como excrescências surgiram, foram muito criticadas. Também as ignoro, mas para efeito de lista lembro aqui: elencar, acordar(fazer acordo), disponibilizar, e outras, todas do mundo corporativo. Nas gírias o "tipo assim" é ainda pior do que os citados. O povo nem sempre é sábio.
ResponderExcluir159.989. Em breve estaremos com 160.000 visitas em um ano e nove meses de novo endereço.
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