domingo, 30 de janeiro de 2011




Belo Monte da morte

* Por Fausto Brignol


Haverá guerra.

Ariranha, Boto Cor de Rosa, Jacaré Açu, Poraquê, Peixe-Boi, Tartaruga, Anta, Capivara, Preguiça de Três Dedos, Coatá, Onça Pintada, Guariba de Mão Vermelha, Veado Mateiro, Tucandeira, Sagüi, Macaco de Cheiro, Anacã, Ararajuba, Gavião Real, Garça Branca Grande, Canindé, Guará, Pavãozinho do Pará, Tucano do Peito Branco.

Esses são só alguns. Duas mil espécies de peixes, cerca de 950 tipos de pássaros e 300 espécies de mamíferos.

E a belíssima flora. Na Floresta de Terra Firme tem Angelim-Pedra, Cedro, Pau D’Arco, Acapu, Mogno, Maçaranduba, Copaíba, Castanha do Pará. Na Floresta de Várzea: Andiroba, Samaúma, Seringueira, Açaí. Na Floresta de Igapó, Tachi Preto, Vitória Régia, Orquídea, Mamorana, Buriti. Nas Restingas: Ajiru, Muruci, Cajueiro. Nos Manguezais: Mangueiro, Siriubeira, Tinteiro. Nos campos e Campinas: Gramíneas e Ciperácias.

E todos serão afetados, direta ou indiretamente, pela construção da hidrelétrica de Belo Monte.

E os Amanayé, Anambé, Apiaká, Arara, Araweté, Assurini, Atikum, Guajá, Guarani, Himarimã, Hixkaryána, Juruna, Karafawyána, Karajá, Katwena, Kaxuyana, Kayabi, Kaiapó, Kreen-Akarôre, Kuruáya, Mawayâna, Munduruku, Parakanã, Suruí, Tembé, Timbira, Tiriyó, Turiwara, Wai-Wai, Waiãpi, Wayana-Apalai, Xeréu, Xipaya e Zo'e. Trinta e quatro etnias indígenas, vivendo da natureza e protegendo a natureza, que serão expulsas de suas terras.

Os Kaiapós declararam guerra ao governo, devido à construção de Belo Monte. E as demais etnias indígenas seguirão os Kaiapós, caso o imenso predador seja realmente construído. Por enquanto, os combates acontecem nos sites, nos blogs, nos jornais, nos protestos dos povos do Xingu – devidamente escondidos pela “grande imprensa”. Somente é notícia aquilo que os empresários do jornalismo dizem que é notícia. Existem mais de 250 países no mundo e os jornais escolhem as notícias diárias sobre meia dúzia, como se nada acontecesse nos demais.

O Xingu também não existe para o jornalismo comprado pelo governo. Passará a existir quando da inauguração de Belo monte. Por enquanto é uma informação guardada, escondida, escamoteada.

E alguns dirão: mas o que é isto, perto do que acontecerá em 2012, ou com a aproximação do planeta X, ou com o movimento das placas tectônicas, com a mudança do eixo da Terra ou, ainda, com o aquecimento global?

Considerarão que “isto” é nada. Mas foi pensando assim que no século XX cientistas loucos – literalmente loucos – construíram a bomba atômica. Por prazer ou por dinheiro. Mas construíram para ver no que é que dava; se os seus cálculos realmente estavam certos e poderiam destruir milhares de uma só vez. Depois, eles foram considerados gênios pela imprensa política aliada ao sistema: Openheimer, Niels Bohr, Einstein... E a humanidade enlouqueceu com eles.: Como era bom ter a bomba atômica! Os gênios não previram as conseqüências, ou, se previram, não se importaram.

Fizeram tantas experiências subterrâneas com as suas bombas cada vez mais poderosas – e ainda continuam fazendo – que realmente mexeram com as placas tectônicas que sustentam os continentes, e provocaram terremotos e maremotos porque o magma central, o fogo interior da Terra se aqueceu além do que deveria normalmente.

Alguns desses terremotos - como o último acontecido no Chile, ano passado - gradualmente provocam uma mudança no eixo da Terra, alterando as estações e dando origem a bruscas mudanças climáticas.

E o aquecimento global. “O que está em cima é igual ao que está embaixo”, como diz a “Tábua de Esmeralda” de Hermes Trimegistus. A loucura do crescimento a qualquer custo. Da necessidade de produzir e vender, produzir e vender e ganhar muito à custa da escravização dos outros. Fábricas aos milhares, motores aos milhões ou bilhões e fumaça podre para o céu liquidando com a camada protetora da Terra, a camada de ozônio, como se estivéssemos, aos poucos, arrancando a epiderme da Terra.

Plantações de transgênicos, sementes híbridas que acabam com a vida da terra. Monocultura, desmatamento. Loucura total, porque não pode ser apenas maldade total ou ignorância total.

E a suprema maldade: a destruição súbita da natureza.

O nome de Belo Monte, dado por Dilma e seus asseclas é sarcástico. Será um belo monte da morte. Quando a ditadura militar decidiu construir a usina de Itaipu, ambientalistas do mundo inteiro vieram para o local para tentar salvar as espécies ameaçadas com a monstruosidade. Nunca se pensou em energias alternativas, porque uma hidrelétrica rende mais, a ponto de se poder exportar energia para outros países. Enquanto que fontes de energia alternativa, como a energia dos ventos (eólica) ou a energia do Sol (solar) captam energia para o local onde estão instaladas. Não se pensou em cobrir o Brasil com uma rede de fontes de energias alternativas: isso não dá dinheiro.

Mas, naquela época de Itaipu, a desculpa foi de que era uma decisão da ditadura militar que, só pelo nome de ditadura, já parecia algo maléfico. E ficou tudo explicado: uma ditadura mata, tortura, constrói reatores nucleares e destrói a natureza. A perversidade é típica das ditaduras. E adeus Sete Quedas.

Mas agora há democracia no Brasil. Democracia para poucos, para quem tem dinheiro, mas você pode andar na rua sem ser preso. Ou não pode? Pode falar do que quiser, principalmente se for de futebol, não é? E pode ir para os estádios, gritar bastante; andar pelado durante o carnaval, coisas assim...

Pode até ter o seu blog ou site, desde que seja comedido, caso contrário estará sempre apreensivo porque o Grande Irmão do Norte poderá mandar uma mensagem de desagrado para o Pequeno Vassalo do Sul e você poderá ter o seu veículo de comunicação bloqueado. Motivos não faltarão: você poderá ser acusado de terrorismo virtual, por exemplo. Democracia é isso. Você até pode votar naquelas máquinas suspeitas.

Mas nesta democracia você não pode evitar que o governo democrático destrua a Natureza. Poderá gritar, escrever, amarrar-se em uma das árvores do Xingu, xingar a Dilma – que é apenas um instrumento – mas nada disso adiantará. Depois que o governo democrático decidiu, decidido está.

Agora mesmo, mais de 60 organizações ambientais do Pará estão denunciando a liberação da licença ambiental para a destruição da natureza – também apelidada de usina hidrelétrica de Belo Monte - como sendo o primeiro grande crime da atual democracia, versão Dilma Roussef. E o Ministério Público Federal quer cassar essa espúria “licença ambiental”, que só aconteceu depois que o presidente do IBAMA foi demitido.

Notícia no jornal Norte do Pará:

“O MPF entrou com uma ação civil pública ambiental, com pedido de liminar, contra o Ibama, a empresa Norte Energia e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para que seja suspensa imediatamente a Licença de Instalação e a autorização de ‘supressão de vegetação’ emitidas pelo Ibama para obras do complexo hidrelétrico de Belo Monte.

“Os procuradores federais também pretendem que seja imposta à empresa Norte Energia a obrigação de cumprir todas as condicionantes previstas na Licença Prévia 342/2010 antes de requerer novamente a Licença de Instalação, sob pena de multa diária. Ao Ibama, que seja determinado que se abstenha de emitir uma nova Licença de Instalação, enquanto as condicionantes previstas não forem integralmente cumpridas e que o BNDES não repasse qualquer tipo de recurso enquanto as Ações Civis Públicas contra o empreendimento estejam tramitando.”

Você duvida que essa liminar não seja cassada?

A construção de Belo Monte é um crime ambiental. O maior que será perpetrado no Brasil. Dilma, o PT, o governo, os aliados do governo, as empreiteiras interessadas, as multinacionais interessadas, todos eles sabem disso. Mas farão de tudo para construir Belo Monte. Mesmo que contra a lei, acima da lei ou fora da lei. Para governos democráticos como o nosso, lei ambiental, ecologia, ecossistema, meio-ambiente são expressões somente usadas em época de eleição.

Eles não estão interessados com as conseqüências do que estão planejando; o que importa é o lucro.

Eles pouco estão ligando para a Ariranha, a Onça, o Jacaré, o Boto Cor de Rosa, o Guará e tantas outras espécies da fauna paraense.

Eles não estão preocupados com a Orquídea, a Mamorana, a Andiroba, a Copaíba, o Ajiru, o Muruci, o Cajueiro... Para eles, flora é sinônimo de lucro.

Eles não estão nem aí para todas aquelas etnias indígenas que serão desalojadas da sua terra ancestral e legítima.

Nesta democracia é assim: o governo não toma conhecimento do povo, da flora ou da fauna do seu país. Para os que governam o Brasil, país significa um território e território um produto a ser vendido, trocado leiloado pelo maior preço. O que estiver dentro do território não interessa. Ou somente interessará se também representar um bom negócio.

Haverá guerra.


• Poeta, jornalista e escritor

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