terça-feira, 20 de julho de 2010




A chave

* Por Evelyne Furtado


É preciso fechar aquele ciclo com a devida ternura para abrandar o pesar, mas a impaciência com a dor causa-lhe, além do desconforto, uma ansiedade que lhe tira o foco impedindo-a de fechar o que tem que ser fechado.

Na bolsa repleta ela busca a chave. A procura é angustiante. As mãos tocam e soltam itens dispersos refletindo a desorganização interior.

Uma mão na realidade e outra na ilusão, A percepção confusa dificulta o reconhecimento dos objetos.

Misturados estão seus pertences; misturados estão seus sentimentos. Confunde telefone celular com alegria, batons com tristezas, óculos com esperança, papeis de balas com desilusões.

Um bloco de anotações contém citações, letras, impressões de momentos e paginazinhas com enormes vazios.

Alguns desses vazios caem na sua saia. Com uma das mãos limpa o tecido e espalha um sentimento estranho no ar. Respira fundo para reconhecer o que sente.

De repente a lembrança de uma voz guia sua mão e ela encontra a paz. Eis a chave. Fecha a porta e com um longo suspiro sai.


• Poetisa e cronista de Natal/RN

3 comentários:

  1. Evelyne,
    Sensacional este texto. Dos melhores, dentre os sempre ótimos que você nos oferece neste espaço. O paralelo entre o desarranjo interior e a bagunça da bolsa é singular. A imagem dos vazios caindo na saia é um achado. Parabéns, amiga.

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  2. Gostaria muito de fechar ciclos com tamanha galhardia. Eu não consigo. É inútil, mas fico a lamentar quando atinjo uma meta. Agradeço a lição. Com treinamento, quem sabe eu chego lá?

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  3. Que bom que você gostou, Marcelo!
    Mara, assim como você, estou aprendendo.
    Beijos e obrigada, amigos!

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