domingo, 2 de janeiro de 2011




A fé não costuma faia

* Por Euclides Farias


Na Amazônia, o mês de outubro deste ano de 2006 da graça de Nosso Senhor Jesus Cristo traz o Círio de Nossa Senhora de Nazaré, como todo santo ano, e eleição, como manda a tenra e já duramente testada democracia brasileira. É tempo, então, de andar com fé, como recomenda a sacrossanta inspiração de Gilberto Gil. Será que resolve?

No Círio, com o reverencial “c” maiúsculo, que é assim que paraense grafa nos jornais o nome da romaria, os votos são todos de mãos postas que rogam providência divina para amparo geralmente negado pela previdência humana. Na eleição, essa eterna fonte de fé no amanhã, os votos são para delegar poder, na esperança de que a pobreza deixe de ser cinicamente difundida como desígnio celestial, imposição divina. Não é, não: é coisa dos homens.

Os votos do Círio e da eleição renovam esperanças num mundo melhor. É bom que seja assim, embora os votos eleitorais estejam impregnados de necessária dose de ceticismo, justificável pelos pecados capitais destes inigualáveis tempos de supremacia da esperteza sobre a sabedoria e a honestidade.

Mas a fé mesmo, aquela que vem das inabaláveis crenças democrática e religiosa, continua e continuará sempre em moda. Afinal, os democratas, mesmo remando contra a maré, manterão vigilância sobre políticos que administram bens materiais, embora a batalha dê sinais de ser travada contra moinhos impulsionados por frustrante letargia social. Do conforto espiritual de seu rebanho, até o fim dos tempos, cuidará o próprio Deus.

Evidentemente, nenhuma das duas coisas garante transformação social radical, que, fora dos cenários de ruptura, se constrói em processo, passo a passo, porque a História, implacável, não dá saltos. De quebra, reserva julgamento a quem nela se aventura a ingressar na condição de protagonistas. Prudência, portanto, diante de promessas miraculosas, é arma eleitoral indispensável.

Na Amazônia, em Santa Maria de Belém do Grão-Pará, em outubro terá Círio e eleição. Razão de sobra para a renovação da esperança, que dela todos precisamos. Outubro, repare e compare, é tempo de andar com fé sim, mas com os pés bem no chão.

• Jornalista, 50 anos de idade e 30 de profissão, exercida em O Liberal, A Província do Pará, Agência Nacional dos Diários Associados e Rádio Cultura. Atuou, como freelancer, na Folha de S. Paulo e Jornal da Tarde.

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