quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Será que a esperança está com o pé na cova?

* Por Mouzar Benedito


Nestes tempos em que não sei se dá para ser mais esperançoso do que temeroso, tenho me lembrado da peça Brasileiro, profissão esperança, de Paulo Pontes, escrita em 1966. É um musical cruzando as vidas, as músicas e as crônicas de Dolores Duran e Antônio Maria. Mas extrapola. Paulo Pontes escreveu um texto de apresentação da peça em que começa dizendo que “é urgente e gigantesca a tarefa de conhecer o homem brasileiro hoje”.

O musical teve várias montagens, com algumas mudanças relacionadas às transformações políticas e sociais ocorridas no Brasil ao longo dos anos. Sinal que o “homem brasileiro hoje”, quer dizer, da época de cada montagem, foi mudando também, acompanhando as mudanças políticas e sociais.

Em 1970, fez sucesso com direção de Bibi Ferreira e interpretação de Maria Bethânia e Ítalo Rossi. Outra montagem que ficou famosa teve Paulo Gracindo e Clara Nunes, também dirigidos por Bibi Ferreira. Minha lembrança dele é por causa do título. Esperança!

E também por causa da esperança me lembro igualmente do grande poeta Torquato Neto, um dos principais letristas de músicas do tropicalismo. Por exemplo: “Geleia geral”, “Mamãe coragem”, “Zabelê”… E “Louvação”, feita em parceria com Gilberto Gil, um verdadeiro hino à esperança. Basta lembrar o trecho dela que diz: “Louvo a esperança da gente / na vida, pra ser melhor / Quem espera sempre alcança / três vezes salve a esperança”.

Pois ele mesmo perdeu a esperança, desesperadamente. Em novembro de 1972, um dia depois de completar 28 anos de idade, escreveu um bilhete – “Para mim, chega!” – fechou as portas, ligou o gás e tirou a própria vida naquela fase terrível da ditadura, tempos de Garrastazu Médici. Vejo muita gente boa quase chegando a esse ponto. É terrível.

Não sei se podemos dizer que continua valendo o título “Brasileiro, profissão esperança”, mas acho permanece a afirmação de Paulo Pontes que é “urgente e gigantesca a tarefa de conhecer o homem brasileiro”. O brasileiro de hoje é outro, claro. Foi-se o tempo não só de Dolores Duran e Antônio Maria, e também os das épocas das grandes montagens.

Bom, a esperança é controversa, seja nos ditados populares ou nas falas de gente famosa. Se uns dizem o ditado que virou chavão “a esperança é a última que morre” ou repetem o “enquanto há vida, há esperança”, de Terêncio, outros preferem Chico Buarque na música “Bom Conselho”:

“Ouça um bom conselho
que eu lhe dou de graça:
inútil dormir que a dor não passa.

Espere sentado
ou você se cansa.
Está provado:
quem espera nunca alcança”.

Sem dúvida, a vida sem esperança é totalmente sem graça e, quando ela se torna totalmente ausente, até o suicídio passa a ser uma opção. Mas ter esperança não basta: é preciso ir à luta. De qualquer forma, selecionei um monte de pensamentos de gente famosa (principalmente do passado) e de ditados populares, e apresento a vocês, com esperança de ter alguns leitores (pelo menos para parte desses pensamentos e ditados, que são muitos). Aí vão eles.

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Thomas Mann: “Uma das situações da vida mais cheia de esperanças é aquela em estamos tão mal que já não poderíamos estar pior”.

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Simone de Beauvoir: “É horrível assistir à agonia de uma esperança”.

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Simone de Beauvoir, de novo: “Em todas as lágrimas há uma esperança”.

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Machado de Assis: “Aquele bom rapaz tinha a salutar crendice da esperança, em que muita vez se resumem todas as bênçãos da vida”.

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Machado de Assis, de novo: “A esperança é própria das espécies fracas, como o homem e o gafanhoto; o burro distingue-se pela fortaleza”.

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Mia Couto: “A esperança é a última a morrer. Diz-se. Mas não é verdade. A esperança não morre por si mesma. A esperança é morta. Não é um assassinato espetacular, não sai nos jornais. É um processo lento e silencioso que faz esmorecer os corações, envelhecer os olhos dos meninos, e nos ensina a perder a crença no futuro”.

* * *

Clarice Lispector: “Esperar menos não significa desistir. Antes se surpreender do que se decepcionar”.

* * *

Clarice Lispector de novo: “Corro perigo / como pessoa que vive. / E a única coisa que espera / é exatamente o inesperado”.


* Jornalista

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