Jeca Tatoo
* Por
Marcelo Sguassábia
- É aqui que fai
tatuage?
- Ô se é. Vamo
entrando, sô. Nói fai e fai prumódi deixa o criente satisfeito que só vendo.
Dondé que vai querê as picada, seu moço?
- Tô achando que no
ombro fica mió.
- Por mim pode sê até
nas parte baixa, é a gosto do fregueis. Mai gerarmente os barbado prefere no
braço e as muié no tornozelo ou na nuca. Deixa eu pegá o mostruário com os
desenho procê oiá.
- Tá bão.
- Ói só que beleza.
Tem figura pra mai de metro. Saci Pererê, Cuca, Lobisómi, Boitatá, Curupira,
Mula sem Cabeça, tem um sortimento variado. Aqui é a seção das drupa caipira.
Nói tem Tonico e Tinoco, Tião Carreiro e Pardinho, Pena Branca e Xavantinho,
Cascatinha e Nhana...
- Não tem drupa mai
moderna? Esses aí é tudo véio, tem uns que já bateu com as bota fai tempo.
- O pobrema é que eu
num trabaio com drupa moderna prumódi que daqui a poco ninguém mai lembra quem
é, daí a tatuage tá feita e a pessoa vai querê tirá. Aí já viu, tatoo é pra
vida intera. Essas dupra de hoje, vou falá uma coisa, só se for decarque de
chicrete, que sai no banho.
- Mai é certeza que a
tatuage que ocê fai não sai nunca mai?
- Pode fazê o que fô -
entrá no riberão, esfregá com bucha, passá arco que não sai nem que a vaca
tussa.
- Memo com a lida na
roça, adispois de carpi e ficá suado?
- Eu agaranto. Óia só
esse Chico Bento, vai ficá bunitão aí no seu braço. Já imaginô ocê na
quermesse, disfilano pra cima e pra baxo com essa tatoo lindona? Vai abafá,
rapai.
- Bão tamém...
- Tem os que gosta dos
desenho mais radicar. A fia do Nhô Nerso mandô tatuá essa cavera aqui, tá vendo.
- Hum, sei. Parece
aqueis aviso de veneno que tem nos saco de adubo.
- Entonce, é memo. O
pessoar comenta que adispois que a minina tatuou a cavera o padre Neco não
deixou mai ela entrá na igreja.
- Vixe, jura?
- É, mai aí a curpa
não é minha. A moça é di maior, quis fazê e eu fiz, uai. Cada um é cada um, tá
certo?
Esses aqui tamem, cê
pode escoiê à vontade. Enxada, trator, porco no chiquero, boizinho no currar,
pato na lagoa, pangaré, cobra no mei do mato...
- E se eu quisé trazê
o retrato de arguém, ocê fai iguar a fotografia?
- Nói fai sim, mai aí
vareia o preço. Anteonte apareceu um hómi aqui com um retrato dum conjunto
chamado Os Bito, não sei se cê conhece.
- Já ouvi falá.
- Pois entonce, aí no
caso era quatro figura pra tatuá, tivemo que tratá um preço especiar purquê deu
cansera pra fazê. Trei dia e trei noite. Ah, esqueci de falá procê que agora
nói tá diversificano as tatoo, com uns motivo cológico e vegetariano. Nói tatua
pé di mio, bacatero, cafezar, laranjera, abeia fazeno mér, vô mostrá procê vê.
- Óia, nem pricisa.
Não carece se preocupá. Gostei dimai da conta dessa violinha. Quanto é que é
pra fazê essa aqui?
- Essa aí eu cobro
dois saco de feijão. Mas procê virá fregueis eu faço por cinco pé de arface.
- Falô e dizeu. Mai só
que eu tô sem arface no borso, posso trazê dispois?
- Craro. Não tem
pressa, uma hora que ocê vié de charrete pra cidade ocê acerta.
- E as agúia, é limpa?
- Ô rapai, quê isso.
Tudo agúia descartáve.
- Então vamo lá, Jeca.
Pó fazê o serviço.
- Baixa as carça.
- Mai eu falei que era
no ombro!
- Ô rapai, tinha
isquicido...
* Marcelo Sguassábia é redator
publicitário. Blogs: WWW.consoantesreticentes.blogspot.com
(Crônicas e Contos) e WWW.letraeme.blogspot.com
(portfólio).
Pela fama de analfabetos, o caso deve estar acontecendo em Minas. Tatuador safado.
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