domingo, 5 de junho de 2011







O Proeiro e o Pombo

* Por Sílvio Lancellotti

Seguramente por causa do sangue siciliano e da infância-adolescência que passei nas praias de São Vicente, aprendi a admirar e a respeitar o mar. Nadei bastante, me fascinei pelo Iatismo enquanto os meus amigos de turma optaram pela potência das lanchas. Daí, quando mantive uma casa na região da Siriúba, em Ilhabela, a paixão se exacerbou. Em 1998, inclusive me ofereci como voluntário no Hospitality Center que a organização da regata de volta ao mundo montou em São Sebastião. Eu passava o dia inteiro no belo lugar.

Lá, numa jornada de muitas cervejas, conheci um holandês de 22 anos, simpaticíssimo, Hans Horrevoets, tripulante do “Brunel Sunergy”. Não podia imaginar que, em 2006, Horrevoets morreria, a bordo do “ABN Amro Two”, na sétima etapa da regata – que era Withbread e se transformou em Volvo.

Entre Nova York, nos EUA, e Portsmouth, na Inglaterra, durante uma tempestade, uma onda gigantesca o arremessou ao oceano. Por ser o proeiro do barco, o encarregado de baixar a vela-balão numa situação de tanto risco, Horrevoets não teve tempo de descer à cabina e pegar os seus equipamentos de proteção – o colete salva-vivas e os arreios que o prenderiam ao barco.

Os companheiros fizeram meia-volta e conseguiram resgatá-lo, mais de uma hora depois. Inutilmente. Verdadeiros heróis, retomaram o seu rumo, o corpo de Harrevoets a bordo, ainda abrigaram os adversários do “Movistar”, que ameaçava afundar, e seguiram até Portsmouth. Poderiam ter abandonado a competição. Mas, em homenagem ao amigo querido, decidiram continuar.

Na segunda-feira, dia 28 de Maio, quando se aprestavam a largar numa prova curta, em Portsmouth, um pombo sobrevoou o “ABN Amro Two” e pousou no exato ponto que Horrevoets costumava ocupar – e lá ficou, de plantão, como um proeiro de verdade, até que a contenda se encerrasse. Daí, imediatamente, o pombo subiu aos céus, e desapareceu entre as nuvens.

Acredite se quiser. Há gravações que registram o episódio, tocante.

• (Texto publicado, esta semana, na revista “Flash”).

* Diplomou-se em Arquitetura. Trabalhou na revista “Veja” de 1967 até 1976, onde se tornou editor de “Artes & Espetáculos”. Passou por “Vogue”, agências de publicidade, foi redator-chefe de “Istoé”, colunista da “Folha” e do “Estadão”, fez programas de gastronomia em várias emissoras de TV, virou comentarista de esportes da Band, Manchete e Record, até se fixar, em 2003, na ESPN. Trabalha, além da ESPN, na Reuters, na “Flash”, no portal Ig e na “Viva São Paulo” e é sócio da filha e do genro na Lancellotti Pizza Delivery – site de Internet www.lancellotti.com.br.

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