Os sete mistérios do universo
*Por Deonísio da Silva
Dizem os esotéricos e outros espíritos dados à pesquisa das ciências ocultas que jamais alguém viu uma cabeça de bacalhau. Ele deve ser o único peixe do mundo que já nasce sem cabeça, pronto para o consumo, e fica nadando lá no Mar do Norte, aguardando a semana santa. Os pescadores o recolhem das águas e só têm o trabalho de salgá-lo e expô-lo ao comércio. Está duvidando? Então, responda: você já viu uma cabeça de bacalhau? Pois é!
Outro mistério do universo é o anão. Alguém já viu anão no berço? Já foi a enterro de anão? Suponho que os anões não nasçam. Eles vêm a furo em algum terreno estufado. Ou quem sabe brotem das florestas. Talvez anão dê em árvore, como aquelas barbas de bode. Um dia o anão se cansa de viver entre tantos galhos e vem dar um tempo entre nós. Passados alguns anos, ele se cansa também da cidade onde está e vai viver em outra. Ou então, depois de muitas migrações, não sendo feliz em nenhuma delas, devido aos nossos preconceitos, o anão volta para a floresta de onde veio. Mas morrer, é certo que não morre. O leitor já foi a enterro de anão? Então!
O terceiro mistério do universo são os gêmeos. Jamais conheci gêmeos negros. Parece que existem, mas jamais foram vistos. Ou foram menos vistos do que o monstro do Lago Ness.
O quarto, o quinto e o sexto mistérios do universo vêm em cascata. Jamais alguém viu um mendigo careca, um filho da – como direi? – outra, que tivesse júnior no sobrenome, ou algum genro que carregasse a foto da sogra na carteira para de vez em quando dar uns beijinhos nela. Ou então, afixada no painel do automóvel com o lembrete: “não corra, genrinho!”
O sétimo e último mistério do universo é o ex-veado. Os dicionários mais pudicos preferem registrá-lo como aquele bichinho – já começam errando o gênero da entidade - tímido e veloz, cuja carne é muito apreciada. Mas não registram o ex-veado, personagem que freqüentava os pecados da carne com muito mais gana quando na antiga condição.
Há certa luxúria em todas as alusões à carne, dado que padres e doutores da Igreja vituperaram a pobre carne, que deveria ser humilhada pelo espírito até a vitória final. Penso que aí está mais uma prova evidente de machismo que as feministas se esqueceram de condenar, pois o dito a carne é fraca não passa de uma dissimulação da superioridade masculina do espírito.
A pobre carne passa a vida espezinhada pelo espírito e pelo tempo. Quando chega a hora de partir, já está acabadona, mas o espírito emerge todo fagueiro, triunfante. À semelhança de um mocinho do velho oeste, ele sempre vence no fim. Também em nosso corpo quem manda é a velha estrutura da casa grande & senzala. A carne é a nossa mucama. Trabalha e dá prazer ao espírito. Um dia fica bem velhinha e morre, se não perecer antes em algum trabalho ou prazer perigoso.
Nossa vida é cheia de sutis complexidades e raramente nos damos conta de como são insondáveis os pequenos mistérios do universo. É fácil a ciência fazer uma breve história do tempo e tratar de bilhões de anos-luz em menos de 300 páginas. Eu quero ler é uma lauda explicando esses sete mistérios. Nenhum sábio tornou inteligíveis sequer os três principais: onde estão as cabeças dos bacalhaus, para onde vão os anões depois desta vida e em que se transformam os ex-veados ao abandonarem tal condição.
* Escritor, Doutor em Letras pela USP, autor de 30 livros, alguns transpostos para teatro e TV. Assina colunas semanais no Jornal do Brasil, na Caras e no Observatório da Imprensa. Dirige o Curso de Comunicação Social da Universidade Estácio de Sá, no Rio.
*Por Deonísio da Silva
Dizem os esotéricos e outros espíritos dados à pesquisa das ciências ocultas que jamais alguém viu uma cabeça de bacalhau. Ele deve ser o único peixe do mundo que já nasce sem cabeça, pronto para o consumo, e fica nadando lá no Mar do Norte, aguardando a semana santa. Os pescadores o recolhem das águas e só têm o trabalho de salgá-lo e expô-lo ao comércio. Está duvidando? Então, responda: você já viu uma cabeça de bacalhau? Pois é!
Outro mistério do universo é o anão. Alguém já viu anão no berço? Já foi a enterro de anão? Suponho que os anões não nasçam. Eles vêm a furo em algum terreno estufado. Ou quem sabe brotem das florestas. Talvez anão dê em árvore, como aquelas barbas de bode. Um dia o anão se cansa de viver entre tantos galhos e vem dar um tempo entre nós. Passados alguns anos, ele se cansa também da cidade onde está e vai viver em outra. Ou então, depois de muitas migrações, não sendo feliz em nenhuma delas, devido aos nossos preconceitos, o anão volta para a floresta de onde veio. Mas morrer, é certo que não morre. O leitor já foi a enterro de anão? Então!
O terceiro mistério do universo são os gêmeos. Jamais conheci gêmeos negros. Parece que existem, mas jamais foram vistos. Ou foram menos vistos do que o monstro do Lago Ness.
O quarto, o quinto e o sexto mistérios do universo vêm em cascata. Jamais alguém viu um mendigo careca, um filho da – como direi? – outra, que tivesse júnior no sobrenome, ou algum genro que carregasse a foto da sogra na carteira para de vez em quando dar uns beijinhos nela. Ou então, afixada no painel do automóvel com o lembrete: “não corra, genrinho!”
O sétimo e último mistério do universo é o ex-veado. Os dicionários mais pudicos preferem registrá-lo como aquele bichinho – já começam errando o gênero da entidade - tímido e veloz, cuja carne é muito apreciada. Mas não registram o ex-veado, personagem que freqüentava os pecados da carne com muito mais gana quando na antiga condição.
Há certa luxúria em todas as alusões à carne, dado que padres e doutores da Igreja vituperaram a pobre carne, que deveria ser humilhada pelo espírito até a vitória final. Penso que aí está mais uma prova evidente de machismo que as feministas se esqueceram de condenar, pois o dito a carne é fraca não passa de uma dissimulação da superioridade masculina do espírito.
A pobre carne passa a vida espezinhada pelo espírito e pelo tempo. Quando chega a hora de partir, já está acabadona, mas o espírito emerge todo fagueiro, triunfante. À semelhança de um mocinho do velho oeste, ele sempre vence no fim. Também em nosso corpo quem manda é a velha estrutura da casa grande & senzala. A carne é a nossa mucama. Trabalha e dá prazer ao espírito. Um dia fica bem velhinha e morre, se não perecer antes em algum trabalho ou prazer perigoso.
Nossa vida é cheia de sutis complexidades e raramente nos damos conta de como são insondáveis os pequenos mistérios do universo. É fácil a ciência fazer uma breve história do tempo e tratar de bilhões de anos-luz em menos de 300 páginas. Eu quero ler é uma lauda explicando esses sete mistérios. Nenhum sábio tornou inteligíveis sequer os três principais: onde estão as cabeças dos bacalhaus, para onde vão os anões depois desta vida e em que se transformam os ex-veados ao abandonarem tal condição.
* Escritor, Doutor em Letras pela USP, autor de 30 livros, alguns transpostos para teatro e TV. Assina colunas semanais no Jornal do Brasil, na Caras e no Observatório da Imprensa. Dirige o Curso de Comunicação Social da Universidade Estácio de Sá, no Rio.
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