sábado, 1 de janeiro de 2011




Ah! O Maravilhoso Verão

* Por Urda Alice Klueger


Eu nasci no verão, numa madrugada de carnaval, e a minha mãe me contou que, quando estava indo para a maternidade, a música que ouviu foi “Sassaricando”. Dá para aquilatar o astral do meu nascimento; estou sassaricando até hoje, e sempre tenho a impressão de que o fato de ter nascido no verão e no carnaval foi que fez de mim uma pessoa que curte o verão mais que as outras.
Daí, hoje, perguntei ao meu amigo Júnior se ele tinha uma sugestão para a minha crônica, e ele me deu a felicidade de sugerir que eu escrevesse sobre o verão. Pôxa, como não tinha pensado nisso antes? O verão é o tempo mais maravilhoso do ano, dá para escrever trocentas crônicas sobre ele, e fico aqui, agora, pensando, o que mais agradaria ao leitor.
Podemos falar dos adoráveis incômodos do verão: os carros cheios nas sextas-feiras à noite, os congestionamentos a caminho da praia, a água que está faltando quando se chega lá, as queimaduras de sábado, que impedem o Sol de domingo, todas essas adoráveis coisas que seriam horríveis em outra estação, mas que dão um charme todo especial ao verão.
Podemos falar, também, das delícias e da suavidade das ondas nos dias de sol, do encanto das noites quentes, da lindíssima cor bronzeada que a população exibe em Fevereiro, das batidinhas de morango, do reagge ouvido no carro horas de congestionamento – tudo, tudo há para se falar quando é verão, mas acho que é melhor contar uma histórinha.
Desde menina que freqüentava a Praia de Armação do Itapocoroy (Penha/SC) e conhecia todos os seus segredos. Um deles é um costão lindíssimo que liga o canto da Praia de Armação à Praia de Paciência, que atravessei a pé pela primeira vez lá pelos 14 anos, e que nunca mais deixei de atravessar. Leva-se bem umas duas horas para se fazer o trajeto, subindo e descendo pedras de todos os tamanhos, mas a natureza, lá, é tão majestosa, que vale a pena qualquer sacrifício para atravessar-se aquele pedaço de mundo ainda desconhecido dos turistas. Fiz a travessia muitas vezes, em todos os verões da minha juventude, e fui fazê-lo de novo, já perto dos 40 anos.
Foi num Ano Novo, creio que na entrada de 1990. Fomos acampar em Armação, e na manhã de Primeiro de Janeiro, resolvemos inaugurar o ano fazendo aquela travessia pelo costão.
Minha turma ia muito animada, e já tínhamos vencido mais ou menos a metade do caminho, quando aconteceu o inesperado: depois de mais de 20 anos de prática naquelas pedras, eu escorreguei e cai de cara no costão. Dizer que me machuquei é pouco: fiquei foi lanhada pelo corpo todo, e corte de pedra sangra que é uma barbaridade. Que fazer? Voltar ou ir para a frente dava na mesma, estávamos na metade do caminho, e não havia, por ali, nada nem ninguém que nos pudesse acudir, além de minha irmã e meus amigos, que não podiam fazer nada. Decidi ser forte, e, brincando, pedi-lhes:
- Quem se perder, siga o rastro de sangue, que vai achar o resto da turma!
Capengando, sangrando no rosto, no corpo, na perna, continuei fazendo a farra, quando aconteceu o inesperado: lá em cima, um passarinho que parecia um galinha resolveu se aliviar e, para usar uma palavra polida, deu-me um banho de cocô, abundante cocô líquido que me atingiu nos cabelos, nos óculos, no rosto, no corpo todo. Não tinha chorado ao cair, mas ai me deu vontade de chorar, só não adiantava fazê-lo. A solução foi entrar no mar e tomar um banho, o que até ajudou a diminuir os muitos sangramentos que as pedras tinham feitos dois ou três minutos antes. Dentro do mar, via minha turma morrendo de dar risada, e acabei rindo junto. Que forma de começar um ano! Como seria ele?
Na verdade, aquele ano foi muito bom, E, como esse incidentes aconteceram no verão, ficaram com um gosto bom de verão. Os cortes sararam em uma semana, mas a história ficou para ser contada muitas e muitas vezes. Não é qualquer um que, no verão, consegue cair num costão e tomar um banho de cocô de passarinho quase ao mesmo tempo. Tem-se que ter-se nascido no verão, ao som da música “Sassaricando”.
Que pena que o verão não seja o não todo! Já estou com saudades antecipadas dele!

* Escritora de Blumenau/SC, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR

Um comentário:

  1. Depois que passa vemos que não foi tão ruim assim, nem a dor, nem o sangramento e nem mesmo o banho de cocô. Sorte nossa de que tudo isso tenha acontecido, Urda. Assim pudemos conhecer a existência do Costão e da sua coragem.

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