A grande armadilha
Convido-os, mais uma vez, a um instante de
reflexão. Volto a abordar a previsão feita pelo historiador
britânico Arnold Toynbee, que eu trouxe à baila neste espaço há
algum tempo, e que é extremamente pessimista em relação ao futuro
da humanidade, o que nos enseja uma série de novas considerações.
O citado intelectual disse numa entrevista: “Se tivermos uma guerra
nuclear, sobreviverão tão poucos, que a civilização não se
poderá manter. Se não tivermos uma guerra nuclear, haverá tantos
habitantes sobre a Terra que a vida se fará intolerável”. Ou
seja, se correr, o bicho pega, se ficar, o bicho come.
Notaram a armadilha que se desenha para a humanidade? No caso de uma abrupta redução da população do Planeta, em decorrência de uma possível (talvez não provável) guerra com a utilização de armas atômicas, o atual sistema de relações entre classes sociais e países fatalmente ruiria (ou ruirá?). O número de sobreviventes será baixíssimo e sabe-se lá em que condições físicas e psicológicas eles viverão. A radioatividade contaminará a tudo e a todos e tal contaminação persistirá não por um ano ou dois, mas por, no mínimo, cinco séculos ou mais. Será um inferno!
A situação oposta, igualmente provável, todavia, trará consequências não menos ruins ou menos dramáticas. O Planeta que nos acolhe tem recursos limitados. E eles já estão próximos da exaustão. Até quando, por exemplo, será possível a produção de alimentos que, bem ou mal, atenda às necessidades de todas as pessoas? E a água potável, cada vez mais escassa, quando estará exaurida? Hoje, um bilhão de pessoas já pena por não contar com esse recurso. E as coisas, nesse aspecto, tendem apenas a piorar, e muito.
Não se trata de neomalthusianismo, mas a mais comezinha das lógicas indica que se a população mundial prosseguir neste vertiginoso crescimento, chegará um momento em que não será possível alimentar a todos os habitantes da Terra. Quando isso vai ocorrer? Está próximo de acontecer? O mundo comporta, ainda, outro bilhão (ou bilhões) de habitantes? É impossível de afirmar categoricamente. Mas chegará o momento em que o limite será atingido. E temo que isso esteja bem mais próximo de acontecer do que ousamos supor.
O crescimento desordenado dos habitantes de um país que não conte com recursos para absorver novos e crescentes contingentes de pessoas é mais grave ainda. Conduz à ocupação de todos seus espaços livres, com crescente desmatamento e progressiva degradação do solo. Esse é mais um fator complicador. Em vez de se multiplicar a produção de alimentos para atender a essa crescente demanda, a tendência é de sua brusca redução. Quando essa escassez abrupta irá acontecer? Talvez em dois ou mais séculos, talvez já no ano que vem. A única certeza é que, um dia, será uma fatalidade. Não há como deixar de ocorrer.
De
acordo com Programa de População da ONU, no início da década de
90 nasciam, em média, três bebês por segundo no Planeta (hoje,
possivelmente, nasçam seis ou perto disso) . Descontando os
indivíduos que morriam – por doenças, assassinatos, acidentes,
guerras, fome ou velhice – a espaçonave Terra ganhava, então,
diariamente, cerca de 250 mil passageiros. O acréscimo atual deve
chegar a 500 mil. E isso ocorria e ocorre, mais do que nunca,
notadamente em países paupérrimos, inviáveis, do ponto de vista
econômico, de tão pobres que são. Não precisa ser nenhum gênio
para concluir que um dia o limite de pessoas será atingido, se é
que já não foi. Afinal, o Planeta não é elástico, não estica,
não amplia automaticamente seu território.
O
trágico, reitero, é que 90% desse crescimento populacional ocorre
onde a prudência manda que se limite a natalidade. Ou seja, nas
regiões mais pobres do mundo, o que só multiplica a miséria, a
fome, as doenças, os conflitos sociais e a violência. A ONU informa
que dos 7,6 bilhões de habitantes da Terra, mais de um bilhão, ou
quase um quinto da humanidade, vive em estado de absoluta carência.
Há solução? Qual? Da minha parte, só vislumbro uma, que
considero, contudo, irreal: a limitação espontânea da natalidade,
fruto da conscientização generalizada dos habitantes da Terra. E
isso, nas condições atuais... raia o despautério, o disparate,
impossível.
Veja-se
o que ocorre nas aglomerações humanas, autênticas babéis
contemporâneas, em que 80% dos habitantes do Planeta vivem (a
maioria vegeta). O arquiteto Paulo Archias Mendes da Rocha, em seu
livro "Memórias", faz uma observação, que nós,
moradores dessas grandes cidades, deveríamos levar muito a sério:
"A cidade é uma ideia, ela não existe. É uma invenção do
homem. Se não gostamos dela, temos de fazer uma outra. A esperança
é essa. Saber que sabemos fazer desta uma outra".
Compete-nos,
portanto, fazer uma "outra" cidade, que de fato nos
pertença, e não aos violentos, aos bandidos, aos marginais, aos
ladrões e aos sequestradores. Mas como fazer isso? Projetá-la, até
mesmo em detalhes, é uma coisa. Viabilizá-la e torná-la concreta é
outra completamente diferente.
Deste
modelo de cidade que está aí (a perigosa e violenta), certamente
não gostamos! Mas não temos opção. E a cada dia que passa, a
situação tende a piorar. Em países miseráveis e superpovoados,
vilarejos até não muito minúsculos e que não passavam de meros
pontinhos, quase invisíveis, nos mapas, transformam-se, da noite
para o dia, em gigantescos depósitos de gente, sem nenhuma
estrutura: caóticos, desorganizados e... violentos. Mesmo em
sociedades nacionais com maiores recursos, este inchaço das cidades
se verifica e multiplica os problemas que, por terem as soluções
invariavelmente adiadas para um futuro que nunca chega, se tornam
insolúveis.
Como
seria bom, todavia, podermos voltar a caminhar tranquilos pelas ruas
da nossa cidade, a qualquer hora do dia ou da noite, como em passado
ainda relativamente recente, sem riscos de assaltos, sequestros,
agressões ou de atropelamentos (ou, pelo menos, de aborrecimentos)!
Como seria bom poder apreciar o céu, as nuvens, as árvores, os
monumentos, os tipos humanos... Enfim... Cada dia isso restringe-se,
mais e mais, a mero sonho. Em que baita armadilha a humanidade se
meteu!..
Boa
leitura!
O
Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Há 38 anos eu morava em Belo Horizonte, fazendo residência médica. Íamos a gafieira e depois íamos jantar a pé, pelo centro da cidade, lá pelas 2 h da manhã, sem nenhum temor. Não acontecia nada. E agora?
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