terça-feira, 28 de novembro de 2017

De outro novembro


* Por Evelyne Furtado
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Quarta-feira. O despertador do celular tira-me de um sonho bom. Infelizmente não pude interpretá-lo como gosto, pois tive que correr para o dia que começava exigindo mais do que a minha natureza aérea pode oferecer. O mecânico viria pegar o carro.

Ligaram-me do trabalho, pois necessitavam de informações sobre um processo. Um banho e o café da manhã correndo. Seu Paulo, o motorista de táxi de minha confiança estava ocupado.

Troco de roupa lembrando que não dispunha de dinheiro em espécie para pagar o táxi. Teria que passar em um caixa eletrônico no caminho. Gente, isso é demais para mim. Não fui moldada para encarar questões práticas em horário matutino.

Sou sonhadora de carteirinha e fico nervosa quando tenho que resolver essas trivialidades que qualquer pessoa faz de olhos fechados. O celular toca mais uma vez. O motorista, agora disponível, encontra-se em baixo no edifício. Digo que já vou, enquanto desço para procurar a agenda no meu carro que ainda está na garagem. O carro sim; a agenda não. Enfim, não tenho mais tempo para procurar e entro no carro branco que me aguardava.

Bom dia, Dona Evelyne, vamos fazer um percurso diferente hoje?”. Indagou seu Paulo e não contestei, afinal estava sem saco para discutir e tenho plena confiança nele. Na esquina ele me aponta as dunas que contornam a cidade e o meu olhar é surpreendido pelo buquê de cor lilás entre o verde já conhecido daquela paisagem.

Vejo os ipês roxos florindo os morros e embriagando os desavisados Vou ficando cada vez mais encantada ao percorrer a longa avenida, hoje curta para o meu prazer.

Em frente ao Aeroclube, o triunfo da natureza uniu várias árvores tornando o espetáculo ainda mais vivo. Ali minha memória foi remetida a outro novembro tão sensorial quanto os ipês em flor.

Despertei. Graças à sensibilidade de seu Paulo, intuí que o céu estava enviando-me mensagens às quais a ansiedade ainda não me permite a leitura, porém estou certa do seu sentido especial, e se ainda não os alcancei, já me sinto grata diante do presente da natureza e de mais um
novembro.


* Poetisa, cronista e psiquiatra de Natal/RN.


Um comentário:

  1. O trivial elevado a condição de momento mágico. É preciso olhar com vontade de ver.

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