As
cidades mais altas do Brasil e do mundo
* Por
Mouzar Benedito
Li há tempos um texto
escrito por viajantes europeus que passavam pelo Planalto Central do Brasil, há
alguns séculos. Nesse texto, não me lembro o(s) autor(es), achavam que aquela
região era o “topo do mundo”. Ali o céu parece “baixo”, perto da terra, e essa
impressão se justifica. Morando em Brasília uma época, eu tinha essa sensação,
quando olhava o horizonte.
Mas, além de não se
comparar ao Himalaia, por exemplo, nem mesmo em termos de Brasil a região está
entre as mais altas. Tem sim cidades altas, pelos padrões brasileiros.
Um parêntese aqui… Na
década de 1960, houve um concurso não sei para que cargo, no Ceará, acho que
para polícia, e uma das exigências era que o candidato tivesse no mínimo 1,65m
de altura. Das centenas de candidatos inscritos, nenhum preenchia esse
requisito. Um deputado cearense reivindicou a exclusão dessa exigência,
dizendo: “No Ceará, um metro e sessenta e cinco não é altura, é altitude”. Bem,
há algumas décadas a população de todo o Brasil cresceu em altura, e hoje tem
muito cearense mais alto, mas não tem nada a ver com o assunto do texto. Fecho
o parêntese.
Por que estou me
lembrando disso? Gosto de ler abobrinhas, e escrever também. Uma vez, há muito
tempo, li em algum lugar que as pessoas de regiões montanhosas são mais
propensas a esquisitices, maluquices, devido a questões relacionadas à visão do
horizonte, e acho que pode ser verdade. Minha cidade, Nova Resende (MG) é uma
cidade no alto de uma montanha e o que nunca faltou lá é maluco. Um tipo de
maluco legal. Se não “maluco beleza” como Raul Seixas, pelo menos gente
divertida. Por sinal, uma esquisitice minha é gostar de gente com certas
maluquices.
Bom, outra das minhas
esquisitices está relacionada às montanhas e a cidades altas: sempre gostei de
conhecer lugares extremos, e um desses é El Alto, na Bolívia, cidade que
aparece em algumas listas como a mais alta do mundo. Foi o único lugar em que
vi neve. É lá que fica o aeroporto de La Paz. Mas El Alto é muito mais que um
subúrbio da capital boliviana (que também é uma das cidades mais altas do
mundo): é inclusive maior do que a capital. Enquanto La Paz tinha 845 mil
habitantes em 2010, El Alto tinha 1,184 milhão.
Mais uma esquisitice
minha: falar com orgulho que nasci numa das cidades mais altas do Brasil. Até
os anos 1970, dizíamos que Nova Resende era a terceira cidade do país em
altitude, abaixo apenas de Campos do Jordão, no estado de São Paulo, com 1.620
metros de altitude média, e Maria da Fé, no sul de Minas, com 1.258 metros,
apenas 8 metros mais que Nova Resende.
Não é uma esquisitice
exclusivamente minha: um conterrâneo meu (meio maluco, claro), sonhava com um
novo dilúvio. Dizia que subiria ao Alto do Cruzeiro, ponto mais alto do
perímetro urbano, com 1.280 metros e, quando a água chegasse ao seu pescoço ele
diria feliz: “Só Campos do Jordão ainda não foi coberta pelas águas, no Brasil,
pois Maria da Fé não tem nenhum lugar com 1.280 metros dentro da cidade”. E
morreria feliz.
Mas essa terceira posição
em altitude não era real. Algumas cidades mais altas não tinham sido
“contabilizadas” nessa história. E também não se contava (assim como não se
conta até hoje) lugares que ainda não tinham status de cidade, eram sedes de
distritos.
Então não éramos os
terceiros em altitude. E com o tempo a coisa foi para piorando: alguns lugares
mais altos foram se tornando cidades, e assim fomos sendo “rebaixados”. Lá por
meados da década de 1980, vi uma lista de cidades mais altas em que Nova
Resende aparecia em 10º ou 11º lugar. Abalou o meu orgulho! Foi algo parecido
com a derrota de 7 a 1 da seleção brasileira para a Alemanha na Copa de 2014.
Na minha vagabundagem
atual, resolvi procurar uma lista atualizada das cidades mais altas do Brasil,
com 1.200 m de altitude média ou mais, segundo dados atuais. Achei essa lista
que está abaixo, de 28 cidades, incluindo Monte Verde (que não é sede de
município, é um distrito de Camanducaia, mas merece o status de cidade) e
Ceilândia (que é uma cidade satélite de Brasília).
Então, meus
conterrâneos e não conterrâneos, vejam a que nível fomos rebaixados:
1. Campos do Jordão
(SP) – 1.620m
2. Monte Verde
(distrito de Camanducaia – MG) – 1.554m
3. Senador Amaral (MG)
– 1.505m
4. Bom Repouso (MG) –
1.360m
5. Gonçalves (MG) – 1.350m
São Joaquim (SC) –
1.350m
7. Urupema (SC) –
1.335m
8. Campestre (MG) –
1.300m
9. São Thomé das
Letras (MG) – 1.291m
10. Marmelópolis (MG)
– 1.277m
11. Alto Paraíso de
Goiás (GO) – 1.272m
12. Santana do
Gambaréu (MG) 1.270m
Celilândia (cidade
satélite do DF) – 1.270m
14. Piatã (BA) –
1.268m
15. Campos Gerais (MG)
1.266m
16. Maria da Fé (MG)
1.258m
17. Nova Resende (MG)
– 1.250m
Bom Jardim de Minas
(MG) – 1.250m
18. Bom Jardim da
Serra (SC) – 1.245m
19. Munhoz (MG) –
1.235m
20. Datas (MG) –
1.231m
21. Matos Costa (SC) –
1.220m
Serra do Salitre (MG)
1.220m
23. Bocaina de Minas
(MG) 1.210m
24. Inácio Martins
(PR) – 1.209m
25. Bueno Brandão (MG)
– 1.204m
26. Delfim Moreira
(MG) – 1.200m
São José dos Ausentes
(RS) – 1.200m
Calmon (SC) – 1.200m
Enfim, estamos
dividindo a 17ª posição, ao lado de Bom Jardim de Minas. Não é tão ruim. Certo
que tem até cidade baiana (Piatã) mais alta, mas é uma só em todo o Nordeste.
Eu me gabava de conhecer a cidade mais alta da Bahia, Morro do Chapéu, na
Chapada Diamantina, mas ela foi desbancada por Piatã, que não conheço, e há
mais algumas cidades baianas mais altas que Morro do Chapéu. E na região Norte
toda, nenhuma chega “aos nossos pés”: sua cidade mais alta é Pacaraima, que
fica no norte de Roraima, divisa com a Venezuela, e tem 920 m de altitude. Essa
cidade eu conheço: parei nela um dia, antes de ir para Santa Elena de Uairén,
na Venezuela.
Em Mato Grosso,
Chapada dos Guimarães é considerada uma cidade altíssima, tem até um clima bem
mais ameno. Mas é mais pela localização dela que dá essa impressão. No meio de
uma região plana e baixa se levanta aquela chapada (com a respectiva cidade) um
pouco ao norte de Cuiabá. Mas ela tem “só” 800 m de altitude.
Bom, como citei El
Alto (como já disse, estive lá também! Eeeebbbaaa!), resolvi procurar a lista
das cidades mais altas do mundo. Na relação que achei, além da mais alta de
todas, a própria El Alto, e a segundona, Potosí, também na Bolívia, a grande
maioria fica na América do Sul: Bolívia, Peru, Equador e Colômbia. Estranhei um
pouco essa lista. Achei que consideraram apenas cidades grandes, pois a menor
tem 100 mil habitantes, é Shigatse (China), mas em princípio, deixei barato.
Então, aí vai a lista
de cidades com 2.800 m de altitude ou mais, dessa lista: El Alto (Bolívia), com
4.150 m; Potosí (Bolívia), com 4.090 m; Shigatse (China), com 3.836 m.
Seguem-se Juliaca e Puna (Peru), Oruro (Bolívia), Lhasa (capital do Tibet –
país incorporado à China – com 3.638 m), La Paz (Bolívia), Cuzco, Hancayo e
Huaraz (Peru), Ipiales e Tunja (Colômbia), Golmud (China), Quito (Equador) e
Bamiyan (Afeganistão – esta última, com exatos 2.800 m).
Depois, continuei
ruminando, pensando naqueles povoados perdidos no Himalaia e nos Andes. “Tem
que ter cidades pequenas mais altas”, pensei. Aí me lembrei de quando estive na
cidade de Copacabana, na beira do lago Titicaca, que é o principal centro
religioso católico da Bolívia. É como Aparecida do Norte no Brasil. Tem um
santuário de Nossa Senhora de Copacabana, a padroeira do país, que atrai
romeiros do país inteiro. Fica a 3.841m de altitude. Portanto, é mais alta do
que muitas dessas campeãs de altitude. Outro parêntese: a praia de Copacabana,
no Rio, recebeu esse nome porque um boliviano construiu lá, há muitos e muitos
anos, um capela em homenagem à santa da devoção dele.
Então tive certeza de
que a lista que encontrei não era correta. Procurei outras. E achei uma lista
das “dez mais” que realmente só tem cidades pequenas, e são bem mais altas do
que todas as listadas antes. No topo da lista, aparece La Rinconada, no Peru,
com 5.100 m. Seguem-se Wenquan (China, 5014 m), El Aguilar (Argentina, 4.895
m), Colquechaca (Bolívia, 4.692 m), Ukdungle (Índia, 4.659 m), Tanggulashan
(China, 4587 m), Pagri (China, 4.600 m), Kurgiakh (Índia, 4.568 m), Takh (Índia
4.568 m) e Yelchang (Índia, 4556m).
Aqui, abro mais um
parêntese. Quem vai às cidades do alto da Cordilheira dos Andes, costuma se
sentir mal, ficar meio tonto, e tem até quem desmaie. Vimos várias vezes que
quando algum time de futebol daqui vai jogar em La Paz ou Oruro, por exemplo,
em poucos minutos os jogadores já estão pregados, cansados. Parece frescura,
mas não é. Nós destas terras em que mil e duzentos metros é grande altitude,
andamos quase nos arrastando ali. Os moradores da região, de origem indígena na
maioria, resistem não só porque estão habituados: seu organismo é adaptado por
séculos de vida nas alturas, eles têm dois litros de sangue a mais do que nós,
e o sangue deles é mais escuro, para absorver melhor o oxigênio raro daquelas
altitudes.
Para quem vai de fora
(e os moradores de lá também fazem isso), a saída é tomar chá de coca, que
diminui o efeito da altitude no organismo. Pode-se também mascar as folhas de
coca, mas é preciso saber que elas não podem ser engolidas. Não tem nada a ver
com cocaína.
Bem, como estou
listando curiosidades sobre altitudes, tentei localizar as cidades mais altas
da Europa. Juf, na Suíça, com 2.126m, encabeça a lista. Outras cidades altas do
continente são Sestriere (Itália), com 2.035m; Obergugl (Áustria), com 1.930m;
El Serrat (Andorra), com 1.540m, e Chepelare (Bulgária), com 1.232m.
No continente africano
as campeãs de altitude são capitais de seus países: Adis Abeba (Etiópia,
2.408m) e Asmará (Eritreia, 2.374m).
Na América do Norte,
imaginei que havia alguma cidadezinha bem alta perdida nas Montanhas Rochosas,
e achei Leadville, no Colorado, com 3.180m. Entre as cidades grandes dos
Estados Unidos, há Salt Lake City e Denver, ambas com 1.500m. No Canadá não há
cidades que cheguem a essas alturas. No México existem muitas cidades altas,
inclusive a própria capital, com 2.240m, mas as mais altas (que “descobri”) são
Toluca, 2.663m e Metepec, com 2.610m.
E na Oceania? Não
achei nenhuma informação sobre cidades altas!
Até aqui, deve estar
se perguntando: como é que alguém perde tempo pensando em coisas como estas,
procurando e registrando informações que não vão influenciar a vida de ninguém?
É maluco? Bem, como eu já disse, sou de Nova Resende e me incluo no diagnóstico
psicológico que atribui a moradores de montanhas uma tendência à maluquice. Do
quintal da minha casa, na minha infância, eu passava um tempão olhando e
admirando o extenso mar de morros que vai até a serra de Poços de Caldas, a
mais de cem quilômetros de distância. Eram morros e montanhas “enfeitados” por
cafezais, pastagens e matas. E eu ficava imaginando como seria atrás desses
morros e dessas serras. Não viajava fisicamente, mas mentalmente… Como viajava!
E continuo viajando na maionese até hoje. Coisa de louco manso gerado nas alturas!
*
Jornalista
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