domingo, 14 de abril de 2013


Sobre o Amor

* Por Khalil Gibran

Então Almitra disse, fala-nos do Amor. E ele ergueu a cabeça e olhou para o povo e caiu uma grande imobilidade sobre eles. E em voz poderosa ele disse: Quando o amor vier ter convosco, seguros embora os seus caminhos sejam árduos e sinuosos. E quando as suas asas vos envolverem, abraçai-o, embora a espada oculta sob as asas vos possa ferir.

E quando ele falar convosco, acreditai, embora a sua voz possa abalar os vossos sonhos como o vento do norte devasta o jardim. Pois o amor, coroando-vos, também vos sacrificará. Assim como é para o vosso crescimento também é para a vossa decadência.

Mesmo que ele suba até vós e acaricie os mais ternos ramos que tremem ao sol, também até às raízes ele descerá e abaná-las-à enquanto elas se agarram à terra. Como molhos de trigo ele vos junta a si. Vos amanha para vos pôr a nu. Vos peneira para vos libertar das impurezas. Vos mói até à alvura. Vos amassa até vos tomardes moldáveis; e depois entrega-vos ao seu fogo sagrado, para que vos tomeis pão sagrado para a sagrada festa de Deus.

Todas estas coisas vos fará o amor até que conheçais os segredos do vosso coração, e, com esse conhecimento, vos tomeis um fragmento do coração da Vida. Mas se, receosos, procurardes só a paz do amor e o prazer do amor, então é melhor que oculteis a vossa nudez e saiais do amor, para o mundo sem sentido onde rireis, mas não com todo o vosso riso, e chorareis mas não com todas as vossas lágrimas.

O amor só se dá a si e não tira nada senão de si. O amor não possui nem é possuído; pois o amor basta-se a si próprio. Quando amardes não deveis dizer "Deus está no meu coração", mas antes "Eu estou no coração de Deus". E não penseis que podeis alterar o rumo do amor, pois o amor, se vos achar dignos, dirigirá o seu curso.

O amor não tem outro desejo que o de se preencher a si próprio. Mas se amardes e tiverdes desejos, que sejam esses os vossos desejos: fundir-se e ser como um regato que corre e canta a sua melodia para a noite, para conhecer a dor de tanta ternura, ser ferido pela vossa própria compreensão do amor; e sangrar com vontade e alegremente. Despertar de madrugada com um coração alado e dar graças por mais um dia de amor; repousar ao fim da tarde e meditar sobre o êxtase do amor; regressar a casa à noite com gratidão; e depois adormecer com uma prece para os amados do vosso coração e um cântico de louvor nos vossos lábios.

(Trecho do livro “O Profeta”)

* Poeta libanês 

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