Encontro
com o duplo
* Por Pedro J.
Bondaczuk
A ciência
prova a total impossibilidade de haver no mundo duas pessoas absolutamente
iguais. Mesmo que alguém fosse clonado, o clone teria personalidade original e
única. Fisicamente, há gêmeos univitelinos extremamente parecidos. Isso, no
aspecto externo. Interiormente, sempre apresentarão diferenças, quer na
estrutura dos órgãos, quer no metabolismo, quer na sua vulnerabilidade.
Quanto ao
raciocínio e personalidade, as diferenças serão bem mais acentuadas, pois estes
dependem não da morfologia, mas do que a pessoa vê, ouve e sente, do tipo de
educação que recebe etc.etc.etc. ao longo da vida. Semelhança, portanto, é
muitíssimo distinta de igualdade (e os matemáticos sabem muito bem disso).
Suponhamos,
porém, que no mundo houvesse um nosso duplo, rigorosamente igual a nós. Aliás,
há uma teoria estrambótica, das tantas maluquices que pululam por aí, que
garante que existe um mundo paralelo a este em que vivemos, porém com “sinais
trocados”. Seria uma espécie de antimatéria, tema que Paul Dirac trouxe à
baila, na primeira metade do século passado e que, a princípio, lhe deu muita
dor de cabeça.
Todavia, o
notável físico inglês não se limitou a teorizar. Estabeleceu uma equação
matemática (que leva o seu nome) e demonstrou, pelo menos em teoria, que
existia essa possibilidade. Combatido, no início, acabou por se consagrar.
Tanto que recebeu, pelo conjunto de suas pesquisas, em 1933, junto com Erwin
Schrodinger, o Prêmio Nobel de Física.
Hoje, nos
círculos científicos, ninguém mais duvida da existência da antimatéria. E mais,
comprovou-se que o universo está repleto dela. Um átomo dela (para que o leitor
entenda o conceito) é constituído de elétrons (como qualquer outro), mas com
carga positiva e prótons, logicamente, com carga negativa. Parece loucura, mas
não é. E se for, não é do homem, mas da natureza.
Quando
matéria e antimatéria se encontram, se anulam e desaparecem, transformando-se em energia. E muita, por
sinal. Caso fosse possível ao homem utilizar essa fonte energética, alguns
microgramas dariam para iluminar o mundo todo. E há já um bom tempo, esse
conceito deixou o campo da mera teoria, para se transformar em certeza.
Por exemplo,
em outubro de 2002, o mundo científico foi sacudido com a notícia de que,
cientistas do Laboratório Europeu de Física de Partículas (CERN) conseguiram
detectar, e medir, amplo número de átomos de anti-hidrogênio frio. Agora,
portanto, já não resta mais nenhuma dúvida sobre o que Dirac garantia, com
tanta segurança, e era intensamente contestado, por volta de 1928.
Tudo bem, a
antimatéria existe. Isso quer dizer que o universo paralelo também é real? De
forma alguma! Por enquanto (e creio que para sempre, mas nunca se sabe), não
passa de teoria estrambótica e delirante que, se você, amigo leitor, defender,
periga de ser internado num hospício, como maluco. Eu é que não defenderei essa
maluquice!
Mas, apenas
para efeito de exercício da imaginação (que tudo pode e à qual nada é
interdito), fico pensando, aqui com meus botões, como seria o meu antípoda, meu
duplo com sinais trocados, meu anti-Pedro. Se existisse, deveria ser, no
mínimo, fascinante, mas muito amalucado para o meu gosto.
Para ser meu
oposto, não poderia, de cara, ser jornalista (nem poeta, contista etc.). Teria
que detestar as letras. Seria agressivo e desbocado (já que sou cordato e
acredito que sensato no que digo e a quem). Em vez de brasileiro e filho de
russos, seria, certamente, chinês e descendente de argentinos. Mas conservaria,
claro, minha aparência, sem os olhinhos puxados dos orientais.
Poderia
fazer, ainda, milhões de outras extrapolações, desse hipotético anti-Pedro, mas
não o farei, para não chatear ainda mais meu pacientíssimo leitor, que a esta
altura deve estar perdendo a paciência e clicando outro texto mais sensato da
internet. Até porque, prefiro meu duplo que, pelo menos em imagem, existe. Esse
é, em tudo, igualzinho a mim, sem tirar e nem pôr.
Refiro-me
àquele que o espelho, várias vezes ao dia, me mostra, que faz exatamente o que
faço, mas com “sinais trocados”. E que não pode nem ser acariciado e muito
menos agredido, por não passar de mera imagem. Esse não fala, não escreve e não
faz estas extrapolações malucas (posto que provocativas). Friedrich Durrenmat escreveu:
“Qualquer um de nós pode ser o homem que encontra seu duplo”. Pode? Não!
Felizmente isso só funciona no terreno da literatura, ou seja, da imaginação.
Ufa! Ainda bem!
* Jornalista, radialista e escritor.
Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981
e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras
funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no
Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e
“Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos), “Cronos &
Narciso” (crônicas), “Antologia” – maio de 1991 a maio de 1996. Publicações da
Academia Campinense de Letras nº 49 (edição comemorativa do 40º aniversário),
página 74 e “Antologia” – maio de 1996 a maio de 2001. Publicações da Academia
Campinense de Letras nº 53, página 54. Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com.
Twitter:@bondaczuk
Nunca havia pensado nisso. Uma maluquice e tanto.
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