Divagando entre palmeiras
* Por
Adair Dittrich
Um dia eu me deparei a
rabiscar palmeiras em qualquer papel a meu alcance. Toscas palmeiras que minha
mão nada hábil na arte do desenho tentava fazer com que alcançassem o mar ali
ao lado à tênue luz de um imaginário luar.
E assim passei por
longo, longo tempo, em minha vida. E ainda passo. Rabiscando palmeiras. E nas
poucas tentativas de aprender pintura também lá estavam elas, as minhas amadas
palmeiras. E sempre a me perguntar por que esta obsessão por palmeiras. Eu não
nasci “à sombra de uma palmeira que igual não há”.
Essa busca minha por
palmeiras debruçadas sobre o mar é contínua. Inúmeras praias vislumbradas e
elas lá estavam. Mas sempre longe do mar. Porque as que deveriam estar sendo
beijadas pelas prateadas espumas já haviam sido banidas dali e em seu lugar só
encontrei o que a civilização considera confortável.
Mas, no verão passado,
verão dos trópicos do lado de cima da linha do Equador eu encontrei o meu
paraíso repleto de palmeiras à beira-mar. Que não era um mero paraíso
imaginário.
Lá estavam as lindas e
verdejantes ramagens debruçando seus enormes e majestosos cílios sobre um mar
de infinitas cores, sobre um cristalino e cálido mar que carrega em seu bojo
todas as tonalidades do mais claro verde até o azul mais escuro que se delineia
lá longe nas fímbrias do horizonte.
Cores que, se
mesclando às cores do crepúsculo, impregnadas ficam com todos os tons que se
emaranham desde o pálido amarelo até o mais rubro vermelho, entrelaçados ainda
nos lilases, em cada amanhecer, em cada entardecer...
Vagando pelas areias
da linha d’água, com todo aquele verde se embalando a minha frente eu ouvia um
sussurrar baixinho entre as ondas do mar e o farfalhar das palmeiras. Só poemas
dos deuses e das musas soavam em meus ouvidos e o cântico dos cânticos ali
estava sendo entoado.
E entre as esguias e
altaneiras árvores de beira-mar nos deixávamos ficar deitados e refestelados
nas areias sombreadas. Nos espaços entre as palmeiras erguiam-se abrigos,
pequenos quiosques hexagonais cobertos com estas verdes ramagens para um
sombrear mais abrangente.
E ali se passavam as
horas, dia após dia, saboreando puros sucos de fresquíssimas frutas tropicais
com pura espuma de cristais de gelo.
E ali se passavam as
horas, dia após dia, deslumbrando-se com as cores daquele mar, daquele céu vestido
de azul-esplendor, debruçados em longas cadeiras, lendo, escrevendo, cantando e
contando das coisas todas das vidas nossas.
E ali se passavam as
horas, dia após dia imergindo e flutuando, nadando e boiando naquelas tépidas,
límpidas e cristalinas águas de ondas amigas de um mar sem fim.
Saborear lagostas
recém retiradas do fundo do mar, ali, à sombra dos palmeirais com as
“Bucaneros” mais polares do mundo, vocês podem ter certeza de que igual não há.
Fomos conhecer este
paraíso à beira-mar, estas brisas do mar, depois de passarmos alguns dias em
Havana, a capital daquela ilha-país rodeada de praias.
Em Havana foram
inúmeras as emoções. Conhecer a imensa e centenária Catedral repleta de antigas
e monumentais obras de arte. Conhecer os mais variados sons das mais variadas
melodias em cada canto, em cada esquina, em cada praça, em cada parque.
E num passeio matinal
por Habana Vieja, repentinamente, me deparo com outra antiga Igreja, a Igreja de
São Francisco. Na praça que a rodeia vejo a estátua de um monge, de um frei.
Aproximo-me. E leio a inscrição nela gravada: Frai Junipero Serra. Nascido na
Ilha de Majorca, Espanha. Morto em San Diego, Califórnia, Estados Unidos.
Então ele era real.
Frei Junipero Serra era real. Não apenas um personagem das ficções do escritor
J. Mallorqui inserido nas aventuras de “O Coiote”.
“O Coiote”, uma série
que deveria ser interminável. Uma série em livros de bolso que contava as
histórias de um defensor que procuramos em todos os dias para nos defender de
todas as injustiças.
E eu lá o imaginava,
montado em seu corcel negro, com sua vestimenta negra, com a negra máscara
cobrindo-lhe os olhos e com o também negro chapéu de abas largas, em galope
acelerado nas ardentes areias ou em meio às palmeiras da beira d’água indo
atender a mais um pedido de Frei Junípero, enquanto as ondas do mar e os
verdejantes ramos continuavam sussurrando suas juras de amor.
* Médica e escritora.
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