Gil e Ariano
* Por
José Calvino de Andrade Lima
Em conversa com o
artista plástico Laerte Estevão, mais conhecido como “Profeta 2000”, que depôs
no velório do escritor Ariano Suassuna, no Palácio do Campo das Princesas:
“Cala-se a voz, permanece a pessoa, seu espírito", relembramos quando o
escritor paraibano (que era membro da Academia Brasileira de Letras), foi um
dos concorrentes ao Prêmio Nobel de Literatura 2012, promovido pela Academia
Sueca. Ele merecia, pois há traduções de algumas de suas obras em francês,
italiano, alemão, holandês, polonês e inglês. Mas, mesmo após 110 anos de
existência do Prêmio Nobel, um escritor brasileiro nunca foi ganhador. Mo Yan é
o segundo chinês a receber o referido Prêmio; o primeiro, no ano 2000, foi
atribuído a Gao Xingjian, um escritor chinês exilado na França e naturalizado
francês em 1997. Pesquisando, descobri que Mo Yan, na verdade, se chama Guan
Moye. "Escolhi esse pseudônimo, que significa não fale, em homenagem aos
anos em que não podíamos dirigir a palavra a ninguém", contou, em
entrevista ao jornal El País.
Bem, caros leitores,
vamos falar, em resumo, nos dramaturgos que são o título desta crônica.
Ariano Suassuna era uma
personalidade importante no País no campo da literatura, e isso não podemos
negar, mas como secretário de Estado, nunca se manifestou em prol das
realizações locais, baseadas nos livros dos autores nordestinos. Ele
preocupava-se apenas com os seriados da TV Globo e com as encenações de suas
peças teatrais (Armorial/Aula-espetáculo). Já foi vaiado e fortemente criticado
(1998) pelos especialistas locais e do Sul do País, durante abertura do 1º
Festival Recife do Teatro Nacional. Na minha opinião, como escritor ele foi
nota "10", porém como secretário minha nota é "0"! De formação
calvinista e posteriormente agnóstico, Ariano converteu-se ao catolicismo e,
desde então, subia todos os anos (8 de dezembro) o Morro da Conceição para
homenagear a Santa. Sobre o Auto da Compadecida, ele dizia que a obra se
baseava nos romances e histórias populares das feiras livres do Nordeste,
sobretudo a de Taperoá, onde morou nos anos 30. Trago à tona aqui o que se
comentava, que em “A Compadecida” se notava um parentesco com as tradicionais
peças da Alta Idade Média, geralmente estabelecidas como “Os Milagres de Nossa
Senhora”, no mais das vezes muito profanas, quando o herói em situação árdua
apela para Nossa Senhora, que aparece e o salva. Muitos leitores acham que
Ariano plagiou a obra dos autos de Gil Vicente e que se relaciona como teatro
espanhol do século XVII, como também algo em comum com os personagens da
comédia dell’arte, destacando-se na figura de João Grilo, que lembra as
características do “arlequim”. Do meu ponto de vista, não houve cópia, até
porque quando João Grilo fica admirado ao ver o Cristo negro, este responde que
veio assim para mostrar que para ele tanto faz ser branco ou negro, uma vez que
não é “americano para ter preconceito de cor”. Lembrei-me do personagem do meu
livro “O Cristo Mulato”, nazareno porque nasceu em Nazaré da Mata, interior de
Pernambuco. Em Gil Vicente, na peça “Auto da Barca do Inferno”, encontramos a
intenção do autor em expor de forma satírica os grandes vícios humanos nos seus
personagens, que se apresentam no porto em busca do transporte para o outro
lado, dentro da visão católica e platônica de céu e inferno. Gil Vicente foi
considerado um autor de transição entre a Idade Média e o Renascimento. A
estrutura das suas peças e muitos dos temas tratados foram desenvolvidos a
partir do teatro medieval, defendendo, por exemplo, valores religiosos. No
entanto, alguns apontam já para uma concepção humanista, assumindo posições
críticas.
Gil Vicente e Ariano
Suassuna eram católicos fervorosos.
*Escritor, poeta e teatrólogo pernambucano. Blog Fiteiro Cultural –
http://josecalvino.blogspot.com/
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