quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Erros de português na imprensa: tão assumidos que dispensam trabalhos de faculdade para encontrá-los

* Por Gustavo do Carmo

Um dos primeiros trabalhos de avaliação que eu tive de fazer na faculdade de jornalismo foi procurar erros de português nos textos dos jornais cariocas. O professor de Língua Portuguesa da FACHA, André Valente, fez um sorteio para determinar qual jornal cada grupo se encarregaria de analisar.

Na hora da listagem dos jornais, alguns gaiatos da sala sugeriram analisar O Palavrão, jornal de baixo nível, repleto de violência e pornografia. Outro jornal do tipo sugerido foi O Povo, mais light em pornografia e, na época, mais violento. Jornais hoje muito populares como Extra, Meia Hora e Expresso ainda não existiam em 1996.

“Sortudo” do jeito que eu sou, para o meu grupo, composto por duas moças além de mim, foi sorteado qual? O Palavrão, é claro! Depois de uma semana, no entanto, fomos reclamar com o professor e pedimos para mudar o jornal, que tinha mais baixaria do que texto. Não lembro se não conseguimos fazer por causa do excesso de pornografia ou de erros de português mesmo. Conseguimos mudar para analisar O Dia, que era um jornal popular, mas aparentemente bem escrito.

Achamos muitos erros de ortografia e gramática (como concordância, regência, uso do verbo, vírgulas, etc) em nosso “novo” jornal. Ok. As minhas companheiras encontraram mais, tenho que dar crédito a elas. Erros de digitação e impressão não valiam, pois eram normais. Já não lembro quais erros encontramos exatamente. Só lembro que o grupo que analisou O Globo também achou muitos crimes contra a gramática.

Dezoito anos depois, a frequência de tropeços gramaticais e, principalmente de ortografia, aumentou demais. O Globo - que já faz um bom tempo, abriu espaço para corrigir publicamente as falhas de redação no próprio jornal – na semana passada publicou quase meia página só de “Nós Erramos”. Sem contar os que eu mesmo já reparei. E foram vários.

Será culpa dos cortes de pessoal nos jornais, especialmente os revisores? Os jornais dispensaram o uso deles nos últimos quase vinte anos? O vocabulário dos jovens jornalistas ficou tão pobre como a nossa cultura? A internet desvia a atenção dos jornalistas? Os repórteres se influenciaram pela má escrita nas salas de bate-papo e nas redes sociais?

A resposta pode ser sim para praticamente todas estas perguntas, mas a grande certeza é que o professor André Valente jamais passaria um trabalho desses nos dias de hoje. Não teria necessidade. Os erros de português na imprensa brasileira, principalmente nos grandes jornais, estão tão banais que eles próprios já fazem isso.  

Ou então, o saudoso professor (que eu nem sei se ainda está vivo) deve mandar procurar nos portais da internet, como o Terra, que, além dos textos confusos e mal redigidos, soltou um “Se DERIGIU” em vez de “Se dirigiu”. Aí o relatório teria mais de quinhentas páginas.

* Jornalista e publicitário de formação e escritor de coração. Publicou o romance “Notícias que Marcam” pela Giz Editorial (de São Paulo-SP) e a coletânea “Indecisos - Entre outros contos”.
Seu  blog, “Tudo cultural” - www.tudocultural.blogspot.com é bastante freqüentado por leitores



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