quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Homem do povo não usa terno


* Por Fernando Yanmar Narciso

Mesmo eu, que me considero um escritor esclarecido, politizado e razoavelmente culto, às vezes me pego com aquela dúvida que talvez 11 em cada 10 eleitores tenham: Pra que diabos servem os deputados? O que eles fazem lá em Brasília além de farrear com nosso dinheiro? Não é impressionante que, mesmo após 30 anos do re-estabelecimento da democracia no país, ainda trazemos essas perguntas na cabeça?

Já que vim ao mundo para confundir ou explicar, dependendo da ocasião, prestarei agora tais esclarecimentos: Além de desviar dinheiro, ajudarem a falir órgãos públicos e rir da nossa cara diariamente, elegemos deputados federais e estaduais para que sejam nossos porta-vozes aos ouvidos do presidente.

A função deles é criar leis, elaborar seu regimento interno, fiscalizar o Poder Executivo, manter a austeridade das contas do Governo, dentre outras. Aproveitando que estamos aqui, é também meu dever cívico esclarecer que a função de nossos também estimados vereadores é praticamente a mesma dos deputados, mas a nível municipal.

É aquele bando de pobres coitados que se reúnem às sete da manhã toda terça-feira na Câmara Municipal para bater boca, cometendo erros de português que fariam Camões se erguer do túmulo só para comer um saco de pregos e morrer de novo. Eu e meu pai ouvimos essas discussões toda semana pela rádio AM e são de fazer uma bomba de gás lacrimogêneo romper em prantos.

Que bom seria para nossa sociedade se mais pessoas soubessem de tudo isso, inclusive os próprios candidatos! Já que eles vão à Brasília propor novas leis, o mínimo que se devia esperar deles é que sejam formados em Direito. Mas com cinco minutos de propaganda eleitoral, você fica sem saber se nossa política é um hospício, o Cirque Du Soleil ou o Bataclan.

Eu sei que a imagem que o povo brasileiro tem da política nacional é a pior possível, sempre foi. Mas eleger ou reeleger pessoas que nunca tiveram envolvimento com política como Tiririca, o ceguinho Geraldo Magela, a Mulher-Pêra ou ex-BBBs a granel só pela piada não é a melhor forma de protestar contra os desmandos dos poderosos. É certo que algumas vezes essa gente tem, sim, algo de bom a apresentar, como Romário, Jean Wyllys e Clodovil, mas o achincalhe em excesso só faz despolitizar ainda mais a população.

Vocês devem estar pensando, mas e o Dr. Enéas Carneiro? Ele não era necessariamente a figura mais amigável das campanhas antigas, com aquela persona neofascista e frases de efeito incompreensíveis, e mesmo assim conseguiu se eleger a deputado federal com mais de um milhão de votos em 2002. Apenas Tiririca conseguiu superá-lo nas urnas anos mais tarde.

Enéas foi o voto de protesto seminal, figura inesquecível de nossa política mesmo sem ter conseguido cumprir nenhuma promessa quando chegou ao poder. O problema é que não surgiu mais ninguém à altura dele em termos de retórica, inteligência e autoironia no cenário político nacional após sua morte. Depois do caso do mensalão (no qual não acredito mais), o ódio e a revolta contra os políticos descambou de vez pra baixaria.

Agora temos de aturar Brasil afora candidatos bizarros como um cuja mascote é um chimpanzé que mostra a língua e dá uma banana pros corruptos, um sósia de Raul Seixas que provavelmente cheirou todas antes de gravar a propaganda, ex-funkeiras com espartilhos tão apertados que as tripas quase saem pelas orelhas e coisa pior. Também há as opções do movimento LGBT, que fazem questão de adicionar o número 24 em suas campanhas e costumeiramente usam a frase de efeito “É gay, mas não é ladrão!”.

Sem falar nos candidatos folclóricos que volta e meia “retornam triunfalmente” às disputas eleitorais, como o escalafobético Cururu de Pelotas-RS, que só se tornou deputado estadual por causa do slogan “Já te falei que não sou ladrão e nem mentiroso!”, ou o Cornelson de Natal- RN com o bordão “Chega de traição!” e o sensacional Zé Muniz de Alagoas, que manda eleitor “que elege político ladrão e assassino” literalmente tomar naquele lugar nas propagandas.

E há aqueles que prometem que quando eleitos vão arrombar os políticos em Brasília com símbolos fálicos de todas as espécies e tamanhos, que por um acaso fazem parte de seus apelidos eleitorais. Garanto que para esses não faltam votos! O que é que gente assim poderia fazer na Câmara de Deputados? Deputado é um cargo tão importante que quem devia escolhê-los era o próprio presidente, como garantia de que só entrarão na câmara pessoas de sua confiança. Se os próprios candidatos avacalhados não são capazes de levar a sério o processo eleitoral, o que dizer do eleitor? Vai faltar cômodo na Casa da Mãe Joana!

* Escritor e designer gráfico. Contatos:
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Conheçam meu livro! http://www.facebook.com/umdiacomooutroqualquer

Um comentário:

  1. Fez revisão de quase 30 anos. Misturou tudo, fez piada, desprezou toda uma classe. Conclusão? Nenhuma. Estamos de mal a pior, porém, sem eleições seria ainda mais danoso.

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