Cheiro de café*
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Por Abílio Pacheco
Não há nada que mais me
pareça com a crônica que o cheiro do café.
É uma metáfora
olfativa, sinestésica; não deveria explicá-la. Fico tentado a encerrar o texto
por aqui. Continuo. Afinal posso até escrever contos curtos, mas ainda não
optei por treinar as crônicas curtas, embora elas pareçam correr no meu dia a
dia. Quem sabe eu tente ainda escrevê-las.
O cheiro do café:
matutino, fresco, suave, de leve amargor… Caminhando pelo condomínio pela
manhã, fazendo academia, assistindo ao noticiário matutino ou tentando se
fechar do mundo num escritório/gabinete é sempre esse gostinho que chega às
narinas trazendo um novo dia, as novidades do dia. Mesmo os barulhos da cidade
chegam com o café e, antes dele, o seu cheiro.
A crônica seria esse
agradável sabor de fragrância noviça e breve. Relativamente pontual e tão
ligada ao presente. Logo surgindo e logo esvaecendo, mas sempre retomada.
A crônica, a despeito
de ser chamada gênero menor, tem seu mistério. Mesmo quem não gosta de café,
gosta de seu cheiro, mesmo quem não aprecia literatura ou não tenha hábito de
ler, curte uma crônica. Se bem usada, a crônica traz para literatura o leitor
iniciante, como o cheiro do café chama para a mesa, convida para uma boa
conversa e, mesmo não o bebericando, a mesa fica rodeada e o diálogo flui.
A crônica, atrativa…
logo o leitor prova de toda literatura: haicais, sonetos, poemas mais longos,
contos, romances…
* Extraído de Contos de
Hoje – narrativas. Organizadores: Abilio Pacheco, Deurilene Souza. Belém:
LiteraCidade, 2012.
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Abilio Pacheco é professor, contista,
romancista e editor.
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