Pedra de raio
* Por
Jair Lopes
Quando eu era criança no interior do Paraná, algumas vezes ouvi minha
mãe contar que quando caía um raio este conduzia uma pedra no seu interior e
que, às vezes, era possível encontrar alguma pedra dessas. Corroborando essa
história, minha mãe afirmava que certa ocasião quando ela se encontrava na roça
colhendo milho, viu e ouviu um desses raios em pleno céu límpido sem chuva.
Dias depois em outro trecho do roçado ela deparou-se com a pedra que teria
caído com aquele raio. Guardou a pedra – negra, ligeiramente assemelhada com um
machado sem cabo, com arestas arredondadas - por muitos anos, mas esta se
extraviou por ocasião de alguma mudança ainda no seu tempo de solteira e nunca
mais a encontrou. Obviamente eu acreditava na minha mãe, mas tinha acentuada
dúvida quanto à origem daquela “pedra de raio” que ela guardou como uma
relíquia por muito tempo
Pois bem, hoje lendo um despretensioso livro “Ontem, o Universo” que
trata das origens do universo, do sistema solar e da terra, me deparei com um
trecho sobre meteoritos bem interessante, do qual transcrevo parte:
“Em todos os tempos, os homens se impressionaram com a queda dos
meteoritos. De fato, o espetáculo é grandioso: um rastro de luz atravessa a uma
velocidade de dez a vinte quilômetros por segundo, acompanhado de um barulho de
trovão prodigioso. Esse fenômenos, visíveis numa extensão de vários milhares de
quilômetros quadrados, aterrorizavam as populações. Um acontecimento desses,
evidentemente, não podia passar despercebido.
Na antiguidade, os homens conheciam a origem dessas pedras. Foram
encontrados hieróglifos que uma delas era designada “pedra caída do céu”. Os
egípcios, aliás, utilizavam alguns desses meteoritos que, as vezes, contém
ferro em estado de metal quase puro. Encontraram-se armas e ferramentas
forjadas com ferro proveniente desses meteoritos. Os gregos e os romanos também
conheciam a origem extraterrena dessas pedras e, durante muito tempo, atribuíam
um poder mágico a esses objetos. Em diversas civilizações alguns meteoritos
eram até divinizados. É possível que famosa Pedra Negra de Meca, santuário do
islamismo, seja um meteorito. Curiosamente, a atitude mudou na Idade Média,
pois, se o mundo greco-romano nos deixou numerosos testemunhos de seu elevado
nível cultural, a humanidade iria entrar, em seguida, em um longo período de
obscurantismo.
Foi, então, preciso esperar até o século XIX para se verificar uma
mudança de mentalidade: no dia 26 de abril de 1803, uma verdadeira chuva de
pedras caiu nas cercanias de Aigle, França. Cerca de 3000 pedaços do meteorito
foram encontrados sobre uma superfície de aproximadamente 50 quilômetros
quadrados. E, desta vez, a Academia de Ciências enviou observadores que tiveram
que se render às evidências: de fato, tudo aquilo tinha mesmo caído do céu!
A tradição popular ainda atribui um poder mágico a esses objetos. Em
lugarejos do interior (Aqui
lembro de minha mãe que vivia numa pequena localidade chamada Pinheiral de
Baixo), são chamados “pedras de raio”. O que mostra simplesmente que sua
queda se faz acompanhar de um clarão e um troar de trovão. Às vezes, são encontrados
sobre esse nome objetos talhados pelo homem pré-histórico, e sua origem também
era atribuída ao raio. “Seja como for, o camponês (minha mãe, novamente)
que achasse tais objetos guardava-os como preciosidades, fixando-os na parte de
cima da porta de entrada de sua habitação: a casa ficava, assim, protegida
contra incêndios...”
À minha mãe, já falecida, peço perdão se em algum momento possa ter
deixado de acreditar plenamente na origem da sua “pedra de raio” tão estimada e
venerada. A crença dela estava em sintonia exata com o que a tradição popular
de seu tempo entendia como verdade verdadeira.
*
Escritor, autor dos livros “O Tuaregue” e “A fonte e as galinhas”.
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